Fabiano e o filho João no jogo em Florianópolis [foto: arquivo pessoal]
Festa em Florianópolis
Todo texto de torcedor acaba sendo, em algum momento, piegas. Prometo não fugir à regra. Pieguice é sentimentalismo e não tem nada mais romântico do que a relação de ontem da torcida rubro-negra com o Furacão.
Um verdadeiro ato de amor infernal. Só pode ser essa a definição. Do primeiro ao último minuto, um pedaço vermelho e preto coloria as arquibancadas repugnantemente verdes do Orlando Scarpelli. Amarrando e sufocando os gritos adversários, as cordas vocais atleticanas faziam ecoar naquele espaço arredondado, em forma de alto falante, nossas canções de guerra.
Há quatro anos morando em Florianópolis, dia de Atlético x Figueirense, para mim e para meu filho João, é como o Reveillón. A gente espera, se prepara, enfim, tudo gira em torno da data. Nós dois ainda tínhamos na cabeça a última vitória por 6 x 3 em 2007. Naquela partida, saímos do estádio sem voz, mas, não tem jeito, o jogo de ontem superou a emoção daquele chocolate.
O motivo foi a torcida que compareceu e lutou com os jogadores. Quem esteve no campo vai saber bem o que estou dizendo. Parecia que a turma do Geninho estava ligada à torcida, tamanha a energia que ia da arquibancada para o gramado. Um casal de amigos, que foi pela primeira vez a um jogo de futebol, disse: “O que é essa torcida?” Respondi: “Bem-vindos ao espetáculo”!
A maré subiu no Estreito. A Baía Norte, que banha aquele bairro da capital catarinense, ficou pequena perto do mar de atleticanos que invadiu o Scarpelli.
E sobre isso tenho dois relatos. Vejam.
Relato 1: Pela manhã, fazendo uma reportagem para o jogo, fui à bilheteria e perguntei ao funcionário, um senhor calvo de uns 50 anos, se havia ingresso para os visitantes. Ele afirmou que sim, que a torcida do Atlético Paranaense não era tão grande na região e que nunca lotaria o espaço reservado. Pensei comigo: "Velho Bocó. Deveria estar careca de saber que somos a maior do sul do Brasil". Não deu outra, o setor E ficou atleticano depois das 6 da tarde.
Relato 2: Consegui ingresso apenas para a promoção de uma indústria de alimentos. Esses tickets levariam a mim, e ao meu filho, ao setor D, destinado aos alvinegros. Por telefone, avisei a um coronel da PM que parte da torcida atleticana iria naquele lugar e, óbvio, não ficaria calada. Era melhor a polícia se preparar ou liberar a passagem para a arquibancada dos visitantes. Eu queria apenas unir mais ainda nossa torcida.
O brigadiano, como dizem os gaúchos, disse que nada poderia fazer. Segundo ele, era melhor que as pessoas tivessem consciência e ficassem caladas para evitar problemas. Retruquei com um argumento prático: "A torcida vai e não deve ficar acuada. O Senhor vai ter trabalho". Desliguei.
Na hora do jogo, dito e feito. Pelo menos uma centena de atleticanos dominaram o local cantando e incentivando o time. Eu que, para dar segurança ao meu herdeiro, deixei as camisas do CAP no carro, tive uma mistura de arrependimento com satisfação. Deveria ter ido com a roupa de gala. Afinal, era réveillon.
P.S.: Vi um dos personagens desses relatos, a quem prefiro não identificar, com cara de nádegas andando pelo estádio e olhando boquiaberto para a nossa grande torcida.
Fabiano Marques é Repórter da RBS/Florianópolis, afiliada da Rede Globo em Santa Catarina. Clique aqui para entrar em contato com o autor.
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