Jones Rossi

Jones Rossi, 46 anos, é repórter do Jornal da Tarde, em São Paulo, e um dos fundadores do blog De Primeira. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2008.

 

 

O fim do futebol

23/09/2006


A foto do técnico Tite saindo do aeroporto escoltado pela polícia, publicada hoje no Jornal da Tarde, é a melhor síntese do que se tornou o futebol brasileiro nos últimos tempos. Migrou das páginas de esporte para as de polícia. A roubalheira generalizada, a má administração nos clubes, o êxodo dos jogadores, a queda do espetáculo, os preços exorbitantes dos ingressos, a intolerância das torcidas, a radicalização da violência. Tudo junto formou uma cadeia de eventos que acabou com a foto citada: o técnico de um clube saindo escoltado para não apanhar da torcida.

Começou com a decadência financeira dos clubes. Aos poucos as torcidas se viram sem ídolos, obrigadas a torcer por jogadores sem nenhuma identificação com o clube e muitas vezes sem a mínima qualidade. Junte-se a isso salários exorbitantes dados a cabeças-de-bagre e a frustração dos torcedores só fez aumentar. Tudo piorou quando vemos ingressos majorados para sustentar um esquema falido na base.

O governo, que deveria no mínimo cobrar a dívida milionária que os clubes devem, vai lá e inventa um super-mensalão chamado Timemania, garantia de que tudo vai ficar exatamente como está. A melhor resposta seria um tremendo boicote da população a mais um modo de tirar dinheiro de quem já não tem mais nada a oferecer.

O resultado de tanto desmando é o que vemos em campo no Campeonato Brasileiro. Todos os times são ruins: do líder ao lanterna a diferença técnica é mínima. Mas os ingressos custam, em alguns casos, 10% de um salário mínimo. O povo não tem como ver seu time do coração, mas se os times cobrarem menos não têm como sobreviver, pois os empresários instauraram uma nova ordem de salários absurdos a jogadores do nível de Neto Baiano, William e similares. Hoje estão no Coritiba, amanhã no Atlético, semana que vem na Coréia ou na Arábia Saudita. Em 2004, o volante Ramalho jogou contra o São Paulo pelo Atlético no primeiro turno e pelo São Paulo contra o Atlético no segundo. Há outros casos, é só puxar pela memória.

Mas existe uma parcela de torcedores que não deixa de ir ao estádio. Boa parte delas subsidiadas pelos próprios dirigentes, as torcidas organizadas se tornaram organizações paramilitares, violentas, sem freios, sustentadas pelo sistema que ingenuamente (ou falsamente) dizem combater levando aquelas bandeiras idiotas de Che Guevara ou Bob Marley. Balançam ao vento atrás dos cifrões, apóiam quem tiver mais dinheiro, sejam políticos ou dirigentes. Agora se acham no direito de ameaçar jogadores, técnicos e os mesmos dirigentes que apoiavam tempos atrás.

O torcedor comum, não-subsidiado, frustrado e com medo se afasta dos estádios. Afinal, sem dinheiro ele não é desejado pelos novos-ricos no comando dos clubes. Na internet, burgueses com internet a banda larga se ameaçam no Orkut. A falta de inteligência não faz distinção de classe.

O futebol está acabando no Brasil. Ninguém mais agüenta times pobres tecnicamente, ingressos a preços abusivos, violência nos estádios. E nada está mudando, a não ser para pior.


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