Juliano Ribas

Juliano Ribas de Oliveira, 51 anos, é publicitário e Sócio Furacão. Foi colunista da Furacao.com entre 2004 e 2007 e depois entre março e junho de 2009.

 

 

Sem medo de sonhar

28/08/2006


Tirador de sarro. Irônico, fanfarrão. Maluco, adora pregar peças. Imprevisível e surpreendente. Ninguém o entende direito, embora todos tentem. E quando a gente acha que está entendendo, vem ele, cheio de bazófia e confunde todo mundo. Sacana, cruel e justo ao mesmo tempo. Clemente e impiedoso. Enigmático, fascinante, apaixonante. Este é o futebol.

A certeza, no futebol, se apóia em palafitas, fincadas no lodo de um mangue. O óbvio ulula, se escancara e, de repente, este óbvio ululante e escancarado vira uma verdade nova, cedem as vigas de tudo o que era certo e tudo muda de hora para outra. Por isso eu não brinco com o futebol. Por isso prefiro tentar entender suas nuanças a ter a pretensão de cravar prognósticos, fazer afirmações taxativas, querer bancar o guru, o sabe-tudo.

Neste dia, hoje, é difícil achar alguém que não acredite que o nosso grande Atlético tem tudo para não ser rebaixado e ainda possa ter chance de beliscar alguma coisa no campeonato. Duas semanas atrás, estes vaticínios eram diametralmente inversos. O time é o mesmo, o treinador é o mesmo, mas a confiança aumentou e a fé num futuro melhor apareceu. Três jogos, sete pontos, apresentações cheias de garra e força, principalmente a última, no Rio, contra o odioso time das Laranjeiras, freguesaço nosso. A gente hoje vê um novo campeonato, não só pela situação atleticana, mas pelo novo cenário que vai se desenhando a cada rodada.

Intelectuais da bola em mesas redondas da mídia central já haviam cravado a nossa descida à segundona. Já escolheram campeão, vice e os três ou quatro times que vão brigar até o final pela Libertadores. Nesta semana, o segundo turno começou e tudo está diferente. Grêmio e Vasco em terceiro e quarto respectivamente, quem diria. Times considerados "sensações", mostram que a sensação está passando, como o prosaico Paranazinho, o time que causava poluções em alguns cronistas da terra dos Pinhais, tropeça em casa com time considerados sem aspirações. Times taxados de fracos e fracassados, como o nosso Atlético, dão fortes sinais de vida. E numa hora emblemática, da metade para o fim, crescem, enquanto outros, fraquejam na hora decisiva.

A verdade é que o campeonato é muito equilibrado, isso é inegável. Não é como em outros campeonatos pela Europa, onde dois ou três times revezam-se nas conquistas a cada ano. Aqui no Brasil, vários times têm possibilidade de chegar nas primeiras posições do campeonato. Aqui o campeonato não é tão previsível. Embora surpresas aconteçam por lá, os resultados recorrem. Veja o nosso caso. Temos dois jogos seguidos para fazer em casa, e se vencermos poderemos chegar a uma ótima posição na tabela. Depois tem ainda Santa Cruz, Paranazinho e São Paulo em casa. Com a Baixada recuperando a sua força. Temos tudo para vencer os jogos. Mas temos que ter a humildade de continuar a mostrar essa garra que temos demonstrado. Mas dá até pra começar a sonhar.

Um time para vencer não depende apenas de quem se contratou. Isso é importante, mas ambiente de grupo, um bom treinador, sorte para que as coisas boas aconteçam no momento exato, estrutura, motivação, camisa, salário em dia, tranqüilidade e muitos outros fatores fazem um time de futebol vencer. As coisas estão se ajeitando no Atlético, já estamos quase livres da laranja podre de cabelo espetado, o ambiente, coincidência ou não, melhorou depois disso. Não existe ninguém privilegiado no Atlético, a diretoria tomou uma posição para acabar com esta história. Dentro dessa nova e recente realidade, apareceu o Michel com seu bom futebol, o pequenino Marcos Aurélio faz um gol por jogo, o Denis voltou a jogar bem e marcar, o Marcelo Silva mostrou-se um grande líder. E o Cléber se afirma, jogo a jogo, como um herói Rubro-negro. Toda a rapaziada está mostrando que a gente pode ter orgulho deles. É nas horas de dificuldades que se forjam os fortes.

Este time pode sonhar e todos nós agora poderemos acreditar. Se trouxermos mais uns reforços dá para acreditar fortemente numa classificação para a Libertadores. O Atlético não precisa muito para acertar, infelizmente este ano a quantidade de erros superaram os poucos acertos. Mas os acertos começam a aparecer, mostrando que o Atlético é um clube poderoso, diferente de outros da cidade que estão no limbo atualmente. Construímos muitas coisas nos últimos anos e nada disso foi em vão, isso nos fez fortes para buscar sempre o melhor e evitar o pior. É cedo ainda para falar, como eu disse, não brinco com o futebol, mas podemos, sim, manter esse ritmo e surpreender o Brasil e os sabichões da mídia-eixo.

Há pouco tempo, poucos acreditavam na recuperação e eram praticamente ridicularizados por pensar assim. Hoje sabe-se que há motivos para pensar no melhor para o Atlético. O ano de 2006 finalmente começou para nós, parece que eu estou em janeiro. O sacana do futebol reservou sofrimento pra gente, mas também reservou a emoção da recuperação da fé e a perspectiva da redenção. Vamos ser menos descrentes, vamos acreditar no imponderável. Vale a pena acreditar, sempre. Principalmente se na hora de fechar os olhos e rezar pelo melhor, a gente vê um manto em vermelho e preto, pulsando vivo e imortal. Por mais louco que o futebol seja, não podemos ter medo de sonhar.


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