Rogério Andrade

Rogério Andrade, 52 anos, é administrador. Atleticano de "berço", considera a inauguração da Arena da Baixada como o momento mais marcante do Atlético, ao ver um sonho acalentado por tantos anos tornar-se realidade.

 

 

Inocência de um menino

19/08/2006


Meu filho tem 4 anos. Seu nome? Luccas. Um loirinho que puxou a mãe, aliás, dos três moleques da casa (quatro comigo), este eu dei uma colher de chá e nasceu com os cabelos dourados da mamãe. Luccas é atleticano. Com 2 anos foi ao seu primeiro jogo na Baixada e de lá já saiu com a primeira camisa rubro-negra. Depois disso aprendeu que poderia ter tudo do Atlético, e tem. Camisa, bandeira, tênis, meia, calça, jaqueta e cueca. Tem até um chapéu muito louco do Furacão. É uma graça de atleticaninho, daqueles que encanta o estádio.

Um dia Luccas foi comigo assistir o Atlético, que tinha como uma das suas atrações o retorno do atacante Dagoberto, depois de algum tempo afastado dos gramados. Meu filho é pequeno, não entende quase nada de futebol, então nos resta comer muita pipoca, cachorro quente e beber um refrigerante na Arena. É sempre assim. Sempre que ele vai e sempre que posso levá-lo, voltamos de barriga cheia e, independente do resultado do jogo, ele sempre volta contente.

Naquele dia foi diferente. Algo chamou a atenção do Luccas, e sem nenhum incentivo da minha parte, espontaneamente ele entrou no ritmo da galera e começou a gritar um nome que ele sequer sabia falar direito. Mas a torcida sabia bem: “Dago...Dago, Dago, Dago, Dago....é Dagoberto!” Achei engraçado, ou melhor, ele deve ter se encantado com a gritaria da torcida e entrou no embalo. Ficou por um bom tempo tentando encontrar as letras do nome do jogador e depois de alguns dias ainda lembrava, pelo menos do início. Depois daquele dia, Luccas não gritou mais o nome do atleta. Acho que nem lembra mais.

Depois de passar alguns dias no litoral, na casa da avó, Luccas voltou e está em casa de novo. Matamos as saudades, brincamos de dinossauro, de carrinho, jogamos bola e voltamos a enlouquecer a mamãe. Durante o nosso jogo, em que as traves eram duas cadeiras, ele fez um gol. E saiu gritando: gooooolll, do Rafael Sobis! Juro pra vocês, meu coração acelerou. Por um momento gelei, de verdade. Meu filho perdera o encanto atleticano, mesmo vestindo a camisa do Atlético? Pensei. Você viu o Rafael Sobis na Tv? - perguntei ansioso. “Aham, ele é bom né, pai?” Pegou sua bandeira, mesmo sendo vermelha e preta, e começou a correr em volta da casa, como um doido. Desde ontem, quando chegou, quando tocamos no assunto futebol ou rolamos uma bolinha por aqui, o nome da vez é Rafael Sobis.

Isso não chega a me tirar o sono, mas fico a pensar sobre a situação. O atacante do Inter cativou meu filho, disso não tenho nenhuma dúvida. E talvez não tenha cativado somente o Luccas. Sobis, com sua pinta de moleque, sua energia e seu excelente futebol, cativou muita gente. Encantou a América. E ganhou a América. Foi campeão, e isso marca a vida de qualquer criança. Rafael é um cara, ou melhor, é também um menino, que brinca com a bola, que brinca com o futebol, que brinca de ser feliz, mas não brinca com algo muito sério: o sentimento do torcedor. Na sua mais pura inteligência e esperteza de piá, trocou alguns euros pela paixão e pelo tesão de vencer e ser campeão. É craque, tem futebol pra isso, e se doou para um clube que o projetou, vendo-se na obrigação de retribuir um carinho e um amor impagável. Este é Rafael Augusto Sobis, o jogador que tive a oportunidade de conhecer um pouco melhor nessa semana e que se tornou ídolo do Luccas.

Não sei se meu filho vai me pedir uma camisa do Internacional, e talvez ele nem comente mais nos próximos dias nem o nome do atacante colorado. Não sei mesmo, mas tenho absoluta certeza que o nome “Rafael Sobis” ficará gravado por muito tempo na sua cabecinha de menino. Sim, pois crianças custam a apagar imagens marcantes de suas memórias. Quem é pai sabe disso! Espero, sinceramente, que o Luccas encontre outros ídolos, e que sejam eles do Atlético, o time da nossa família, o time do nosso coração, o time da nossa casa. Talvez isso pra mim seja muito mais confortável e muito mais gostoso de assimilar.

Enquanto isso estou preparado para que um dia ele volte a falar no ídolo que encantou a América, e um dia, daqui a alguns anos, vou fazer questão de lembrá-lo, não somente de Rafael Sobis, mas também de Dagoberto. Aí sim, vamos poder falar abertamente de sentimentos, gratidão, valorização, reconhecimento, e quero ter essa brilhante oportunidade de explicar ao Luccas sobre o verdadeiro significado da palavra “amor” no mundo do futebol. Sim, ainda existe amor à camisa no fantástico mundo da bola.


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