Eduardo Aguiar

Eduardo Aguiar, 51 anos, é jornalista e filho de um coxa-branca (ainda bem que existe a Teoria de Darwin, sobre a Evolução das Espécies!). Foi colunista da Furacao.com entre 2002 e 2006.

 

 

Acorda, Insan atleticano

26/05/2006


Diferentes obras clássicas da história – de textos sagrados do cristianismo e do islamismo até a mitologia grega – revelam por vezes as mesmas características do ser humano. Uma delas é que o homem é “um ser que esquece”. A própria palavra homem em árabe, insan, significa “aquele que esquece”. Não estamos falando de banalidades, como deixar de devolver um filme na locadora, mas sim de ignorar as dimensões mais profundas do seu ser, esquecer de sua verdadeira missão.

Pois assim são, também, os atleticanos. Uma nação que por vezes esquece qual é o verdadeiro sentido de torcer pelo Furacão, principalmente quando o time vai mal das pernas.

Desde que inaugurou a Arena, o Atlético tem vivido de ciclos. Sempre que há uma renovação no elenco, mesmo após campanhas vitoriosas como a do Brasileirão-2001 ou a da Libertadores-2005, há uma compreensível queda de rendimento. O importante é que, em todas essas ocasiões, após o período de maré baixa o time voltou a engrenar nos campeonatos posteriores. E assim fomos indo: três classificações para a Libertadores, um título nacional, um tricampeonato estadual inédito, um vice-campeonato brasileiro e finalmente vice das Américas.

Bom, onde raios quero chegar? Num ponto que muitos atleticanos não vão gostar, porque quando a opinião se torna unânime, já dizia Nélson Rodrigues, ela é burra. Nossa torcida reclama hoje assim como reclamava no ano passado, antes do time engrenar e chegar à final da Libertadores. Assim como, há exatamente um ano, xingava o Lima e o Aloísio. Pois isso é, sem dúvida, esquecer de sua missão como atleticano e se negar a reconhecer o óbvio: é infinitamente melhor passar por estes altos e baixos de hoje em dia do que viver sempre em baixa como acontecia nos velhos tempos, quando o time sofria para voltar à primeira divisão e no ano seguinte caía novamente. Vejam, não estou dizendo aqui que somos obrigados a idolatrar Danilos ou Ivans da vida, mas podemos ao menos ter a consciência de que logo eles se vão e outros melhores virão. Pedir a saída de jogadores que não estão merecendo vestir a camisa rubro-negra é legítimo, um direito inconteste do torcedor; exigir uma “revolução cubana” num clube que acabou de disputar uma final de Libertadores, não.

Tenho lido e ouvido que dói lembrar da Baixada de antes, comparada com a frieza de agora. Posso até concordar em parte. Mas querem achar um culpado para isso? A resposta é simples: basta olhar para nós mesmos, pois os responsáveis estão na própria torcida. Sempre esteve no DNA do atleticano apoiar o time, mesmo que fosse formado por cabeças-de-bagre. Atualmente, qualquer campanha meia-boca serve como estopim para rebeliões e revoltas, para reclamar que “o Atlético não é mais nosso”. Mas que tremenda bobagem. Qual Atlético “era nosso”? Aquele que disputava torneios da morte no Pinheirão? Talvez alguns queiram reviver isso; eu não. Eu não me esqueço.

É preciso lembrar, mas alguns insistem em esquecer, como é da natureza humana, que tudo o que está acontecendo no clube, principalmente no aspecto patrimonial, servirá para garantir um futuro auto-sustentável. Não digo um futuro de curtíssimo prazo, como mais um título nacional neste ano ou no próximo. Mas o futuro de um grande clube de futebol que poderá formar grandes times e do qual os meus** – e os seus – netos se orgulhem.

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A quem interessar possa, gostaria de lembrar que também discordo de várias atitudes da diretoria do Atlético. Exemplos? 1) Acho absurda a “lei da mordaça” adotada, pois os torcedores têm o direito de ver e ouvir seus ídolos saber o que se passa no clube; 2) sou contra as “cotas” para meio-ingresso, pois dia desses minha filha de seis anos teve que pagar entrada inteira para entrar no estádio, o que é uma verdadeira aberração; 3) sou contra a contratação de técnicos inexpressivos que, via de regra, não têm a competência necessária para dirigir um time do porte do Furacão.

Mas sei, também, me colocar no lugar de quem está lá e imaginar o que eles pensam: 1) “a imprensa só me sacaneia”; 2) “há uma enxurrada de carteiras de estudante falsas na praça que nos prejudica e as autoridades são coniventes com isso”; 3) “já estamos cheios desses treinadores que se acham os reis da cocada e querem ganhar cem mil paus por mês”.

Cada qual com a sua razão, OK, mas realmente falta um pouco de habilidade e sensibilidade aos dirigentes para tratar destas questões sem radicalizar, principalmente no que diz respeito à torcida.

Agora, temos de admitir: essa diretoria segue a mesma linha de raciocínio e administra o clube da mesma maneira desde que assumiu, sem se importar com as pressões, sem gastar dinheiro que não tem e sem tomar medidas demagógicas apenas para evitar críticas. Age de acordo com um objetivo final a ser alcançado, sua verdadeira missão à frente do clube, e não muda este rumo por nada.

Gostem ou não, isso é admirável. Até porque foi sob o comando desta administração que o Atlético conquistou seus títulos mais importantes. Mais do que em qualquer outro período de sua história.

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Desculpem-me, escrevi demais. Se alguém chegou até aqui, já estou no lucro.



(**) todo dia rezo para que minha filha, atleticana e companheira de jogos na Baixada, nunca se case com algum coxa que tente desencaminhar meus netos...


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