Juliano Ribas

Juliano Ribas de Oliveira, 51 anos, é publicitário e Sócio Furacão. Foi colunista da Furacao.com entre 2004 e 2007 e depois entre março e junho de 2009.

 

 

Crime e castigo

16/11/2005


Em 1996, tentaram matar nosso goleiro. Foi um golpe seco, com força, covardia e ódio suficientes para matar. Mas Ricardo Pinto sobreviveu àquela tarde nas Laranjeiras. Mas desfalcou o time que estava para ser campeão brasileiro daquele ano, que, com o reserva Ivan e abalado pelo acontecido, acabou ficando em oitavo lugar.

Iniciou-se naquela tarde um sentimento de ojeriza em relação ao time carioca querido da CBF e da Rede Globo. A torcida atleticana queria que o destino punisse o crime de tentativa de homicídio de alguma forma, pois esperar por uma atitude das "autoridades" do futebol daquela época nada mais era do que uma quimera, uma utopia em meio à anarquia de um futebol corrupto e desorganizado. Eis que a mão invisível do destino coloca o futuro do Fluminense nas mãos do Atlético Paranaense na última rodada. O Criciúma, que receberíamos em casa, precisaria vencer o Furacão, já classificado para as quartas-de final, que escaparia do rebaixamento. O Fluminense, caso o triunfo do Tigre catarinense fosse confirmado, cairia. Ou melhor, cairia em tese, pois aí começaram as viradas de mesa, mais uma contribuição do futebol carioca para a galeria de vergonhas do futebol brasileiro.

O Atlético perdeu em casa para o Criciúma, 2 a 1. Paulo Rink marcou primeiro, de cabeça, e tomamos a virada. O time até jogou bola. Não jogou para perder. Mas a torcida, sim. Foi uma das cenas mais insólitas que vi em minha vida, todos, rigorosamente todos os atleticanos no estádio Joaquim Américo, das sociais, dos fundos, do ginásio, curva da laranja, das arquibancadas metálicas, arquibancadas da reta, todos mesmo, torceram para aquela virada. Uma vingança saborosa na boca dos atleticanos que gritavam em festejo pela queda do Fluminense. O sofrimento de Ricardo Pinto e de todo o escrete rubro-negro naquele fatídico dia não ficara impune.

Até hoje não sei se os jogadores atleticanos quiseram perder. Não acredito que algum atleta profissional jogue para perder. Mas podem ter diminuído o ritmo, pois uma vitória não faria muita diferença, estava muito calor e os catarinenses jogavam a vida. E acho que os clamores da torcida atleticana, que pedia que os jogadores não atacassem, influenciaram alguns deles.

Quem pode responder com propriedade sobre o que se passou com o time do Atlético é Evaristo de Macedo. Ele dirigia o time naquele campeonato e naquele dia. Ele certamente dirá que ninguém entregou. Mas os jogadores estavam intensamente envolvidos com o episódio do massacre. Para vingar o colega e a eles mesmos, podem ter facilitado as coisas para o Criciúma, por que não? Nada seria mais humano.

Lembro essa passagem da bonita história atleticana de sangue, suor, lágrimas e glórias, para falar sobre o assunto do momento: o provável descenso do Coritiba "Foot Ball Club" e o desejo de alguns desavisados por uma "entrega" por parte do Atlético nos jogos contra São Caetano e Paysandu. Já de prima, cravo: o Atlético não entregará jogo algum. Os jogadores nem pensam nisso. Primeiro: o Atlético joga em casa com times piores que ele. Segundo: não há nenhuma mágoa, seja dos jogadores, seja da comissão técnica em relação ao Coritiba. Muito pelo contrário, a contribuição ao rebaixamento coxa já foi dada no primeiro e no segundo turno, com duas vitórias fáceis. Isso tudo é papo de torcedor, que na empolgação deste momento de grande frenesi pela iminente queda verde, passa do ponto na rivalidade. Uns falam na "entrega" apenas jocosamente, outros, acreditam que isso é o que deve ser feito.

Assim como acredito que a maioria da torcida atleticana está em contagem regressiva esperando o naufrágio do Titanic do Gionédis, acredito também que a grande maioria dos rubro-negros refuta qualquer iniciativa de se promover uma corrente pelo insucesso do Atlético frente aos adversários que lutam contra a segunda divisão junto dos coxas. É pobreza de espírito demais para uma torcida que se acostumou a vibrar com grandes realizações. Além de ser um desperdício de energia, tendo em vista que o Coritiba irá com suas próprias pernas bambas para a segundona. Quem já viu ao menos um jogo do Coxa nesta reta final sabe do que estou falando. Já era.

Vamos nessa corrente pra frente (ou seria corrente pra baixo?) pela queda do Coxa só em nossos sentimentos e vontades. Mas rivalidade burra, não! Nada de ficar esperando uma derrota proposital ridícula que não vai acontecer. Vá à Kyocera Arena para torcer pela vitória, que é a vocação atleticana. Que o jogo termine e você saia feliz por um triunfo que garantirá uma boa posição ao Atlético no final deste campeonato que já foi tão sofrido para nós. Nenhum jogador ou torcedor do coxa quase matou um atleta nosso no auge da carreira. Não há nenhum sentimento de vingança. Só a mão do destino se encarregando de fazer justiça. E para isso, deu aos verdes um dirigente patético, que presenteou sua decadente torcida com um elenco medíocre e técnicos fracos. Não precisará usar o Atlético para encaminhar as coisas.


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