Silvio Rauth Filho

Silvio Rauth Filho, 50 anos, descobriu sua paixão pelo Atlético em um dia de 1983, quando assistiu, com mais 65 mil pessoas ao seu lado, ao massacre de um certo time que tinha um tal de Zico. Deste então, seu amor vem crescendo. Exerce a profissão de jornalista desde 1995 e, desde 1996, trabalha no Jornal do Estado. Foi colunista da Furacao.com entre 2004 e 2009.

 

 

Cartão vermelho para o amadorismo

02/10/2005


Quem tem mais poder de decidir a partida de hoje? Cléber Wellington Abade e seus assistentes ou Ferreira, Evandro e companhia? Creio que não há dúvida: o apito é mais poderoso que a chuteira. E, obviamente, não se trata apenas do jogo desta tarde, na Arena. Desde que o futebol foi organizado em torno de regras, o árbitro passou a ter o controle total sobre a partida. Se quiser que um time vença, só um milagre poderá impedi-lo. Com um simples sopro, pode expulsar quantos jogadores desejar, marcar pênaltis, validar gols inexistentes e anular os tentos legítimos.

Além desse poder incomensurável, os árbitros têm também uma responsabilidade tremenda. Em muitas ocasiões, decidir se foi pênalti é mais complicado que converter a penalidade. E todas essas decisões cruciais precisam ser tomadas em rápidos segundos, sem tempo para pedir ajuda aos universitários, às câmeras ou ao Arnaldo César Coelho. Enquanto os jogadores podem dividir a responsabilidade com os 10 companheiros, com o técnico, com o preparador físico, com a torcida, com o vento, com a chuva e com o gramado, os árbitros estão totalmente solitários nesse campo de batalha.

O mais estranho disso tudo é que, mesmo com todo esse peso nas costas, o árbitro continua sendo o único amador do espetáculo. Durante a semana, precisa trabalhar em sua vida pessoal e profissional. Se é um professor, por exemplo, tem a necessidade ler, corrigir provas e dar aulas de segunda a sexta-feira. Somente no sábado é que voltará a ser um árbitro. Para complicar ainda mais, é remunerado como amador. Recebe um cachê de valor ridículo se comparado a sua responsabilidade e ao que ganham os jogadores.

No jogo de hoje, por exemplo, estarão em campo dois times que têm folha salarial em torno de R$ 1 milhão por mês. A média por atleta é de R$ 30 mil mensais, mais ou menos. Enquanto isso, um árbitro recebe R$ 2,5 mil por jogo (se for do quadro da FIFA) e R$ 1,5 mil (quadro da CBF). É uma quantia razoável para um amador, mas totalmente incompatível com sua responsabilidade em um ambiente mais do que profissional. Afinal, cada resultado envolve milhões na Loteria Esportiva, no investimento dos clubes, no ingresso pago pelos torcedores e na grana aplicada pelos patrocinadores.

Além de receberem um salário compatível com o poder do apito, os árbitros deveriam ser 100% profissionais. Ou seja, passariam a semana treinando fisicamente e tecnicamente. Estudariam pela Internet e pela televisão lances polêmicos ocorridos em jogos pelo mundo inteiro, mantendo assim atualizada a base de conhecimento.

Não resta a menor dúvida que a profissionalização da arbitragem é o melhor caminho. Mas, se é tão óbvio assim, por que ainda não ocorreu? Simples: por desejo de confederações e federações. Para esses dirigentes arcaicos, é essencial continuar manipulando o árbitro, que é obrigado a se sujeitar a esse esquema se quiser continuar no quadro e sempre dentro da escala. Essa triste realidade está aí e piorando a cada dia. É só abrir os olhos e ver.


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