Fernanda Romagnoli

Fernanda Romagnoli, 51 anos, é atleticana de coração, casada com um atleticano e mãe de dois atleticanos. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2009.

 

 

Alegria e fé

26/09/2005


Quando era adolescente li o famoso clássico infanto-juvenil Pollyana, na qual uma menina ensina as pessoas o Jogo do Contente. Basicamente este jogo consiste em "ver" dentro das coisas e pessoas algo que possa nos fazer contentes, mesmo diante das adversidades. A menina seguia saltitante e radiante, não deixando que as coisas a abalassem. Na época, como toda adolescente, achei a menina uma chata, mas hoje... ai, ai, quase invejo a Pollyanna!

Tirei meus óculos cor-de-rosa, já nas rodadas em que empatamos na Arena... E se fiquei assim na minha casa, como me sinto fora? Eu digo: fico me perguntando cadê o meu time? Cadê os meus Super-Amigos?

Não vejo o goleiro a quem eu cheguei a chamar de Super-Homem. Não vejo zagueiros consistentes. Vejo volantes com apenas alguns minutos de inspiração. Vejo o camisa 10, quem já chamei de Batman... que vexame aqueles chutes a gol... Não vejo laterais servindo seus companheiros com passes decentes, cruzadas de bola para os "nossos" jogadores. E os atacantes?

E nós, assim como na política, nos acomodamos a uma posição humilhante de achar que está tudo normal, que a coisa vai melhorar "ao natural", que sempre tem dessas coisas. Só que agora me bateu uma "queredeira" de torcedora...

Quero bronca, chega de conversa mole. Também quero apoio, papo amigo quando precisar. Quero todas as lendas da velha cartolagem, com presidente no vestiário e tudo o mais, se preciso for. Quero que o futebol burocrático se dane! Quero a nossa pequena área fechada, lacrada. Quero um contra-ataque tão rápido que o goleiro adversário não saiba de onde veio a bola do gol. Quero o meu Furacão, classe 5, com muita classe, destruindo o time adversário.

Eu quero ver a alegria de volta no meu time. Aquela coisa que só campeão tem. Quero vibração quando se faz um gol. Quero mãos dadas. Quero o grupo comemorando junto. Quero sinergia, energia, trabalho em equipe, companheirismo, resiliência e todos os jargões e clichês de qualquer estratégia motivacional. Eu não cogito a mediocridade. E pra quem diz que não temos time pra isso, tenho algo a dizer...

Um conceito muito procurado por gestores é a tal motivação. Me dá arrepio quando ouço alguém dizendo que vai motivar alguém. É bem acadêmico, mas eu vou explicar: motivação não se acha.... se tem. Então o que nos resta é contribuir com os chamados fatores motivacionais. Sendo assim, lembro alguns fatos da história do nosso futebol.

Das seleções que vi jogar, na minha opinião a melhor era a de 82. Valdir Peres, Leandro, Luisinho, Oscar e Junior, Cerezo, Falcão, Sócrates e o rei Zico, Eder e Serginho (ok, meu marido ajudou porque eu não lembrava de todo mundo). Nessa época o mercado internacional estava começando a se abrir. Os olhos dos nossos jogadores tilintavam pensando nos dólares. Ver aquelas jogadas, mesmo não gostando de futebol, eu achava tudo lindo.... mas não veio nada para o Brasil. E por quê? Porque faltou equipe. Não excelentes jogadores, faltou "espírito corporativo" - o objetivo de trazer a taça foi trocado pelos objetivos individuais de ótimos negócios, mesmo que tenha sido sem querer. Aconteceu de novo em 1998.

Já nas duas Copas que vi o Brasil ganhar, as coisas foram diferentes. Em 2002 havia um comando forte e paternalista. Um time desacreditado depois do vexame de 1998 precisava de um Felipão. Mexer com os brios pode ser uma espécie de tortura, mas convenhamos que dá certo. Já a de 1994, pra mim, foi a mais emocionante porque era a história de um título depois de 20 e tantos anos. Uma história cheia de histórias, onde um cara recém saído de uma contusão, já em final de carreira, bateu no peito e chamou uma cobrança de falta. Foi um míssil que fez suco do que sobrou da laranja mecânica. Todos estavam em busca da taça e de suas conseqüências - não havia inversão de objetivos. Deu no que deu.

Eu sinto muito que o nosso objetivo agora tenha que ser a fuga do rebaixamento, mas pelo menos temos um. Temos um time que pode ir bem além da mediocridade de fugir dos quatro últimos lugares da tabela. Esse é o jogo do contente: acreditar e fazer. Podem ir e vir, jogadores e treinadores, todos sabem o que deve ser feito.

Pra finalizar, mais uma citação, dessa vez do Livro dos Livros: "Eu sei o que vocês têm feito. Sei que não são nem frios nem quentes. Como gostaria que fossem um coisa ou outra! Mas porque são apenas mornos, nem frios, nem quentes, vou logo vomitá-los da minha boca" (Apocalipse 3:15-16)

Apropriado? Então, oremos!


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