Rogério Andrade

Rogério Andrade, 52 anos, é administrador. Atleticano de "berço", considera a inauguração da Arena da Baixada como o momento mais marcante do Atlético, ao ver um sonho acalentado por tantos anos tornar-se realidade.

 

 

Desabafo

04/07/2005


Inacreditável! A decisão da Copa Libertadores da América não será na Baixada, para desespero de milhares de atleticanos que esperavam assistir, dentro de casa, um jogo histórico, recheado de emoções.

Depois de um dia cansativo, de uma segunda-feira tensa e dolorida, depois de tanta expectativa, tanta esperança e tanto sofrimento, finalmente posso dar uma pausa, analisar os fatos e chegar a algumas conclusões. Conclusões de que somos temidos e temos uma força que nem nós mesmos imaginamos. Conclusões de que o povo atleticano é o povo mais apaixonado do mundo.

Percorrendo a fila nos arredores da Baixada, desde o final de semana até hoje pela manhã, ainda não consigo me conformar com a Arena vazia na quarta-feira à noite. Tudo estará em silêncio, as luzes apagadas e o Atlético em campo, a setecentos quilômetros de sua casa, em uma terra que será de ninguém. Campo neutro, jogo normal, final de Libertadores empolgante, mas sem o brilho da força da nação atleticana.

De nada adianta descermos a lenha na Conmebol, pois deveríamos saber que estávamos sujeitos, caso fossemos para a final do campeonato, a não jogar na Baixada. Algumas cláusulas estão bem claras no regulamento, inclusive esta que determina a capacidade mínima para uma final.

Logicamente também concordo que deveria existir um mínimo de bom senso por parte da mesma Conmebol, pelo menos uma brecha para uma negociação mais efetiva a nosso favor e uma sensibilidade mais aguçada, mas diante do seu direito e de uma lei pré-estabelecida, lacrou o Joaquim Américo e nos deixou aos prantos. Quanto ao São Paulo, como qualquer outro clube, fez de tudo para não cair na desgraça de jogar na Arena e não sair de Curitiba praticamente vice-campeão.

A empolgação é ainda imensa, a euforia não foi desfeita, mas sejamos realistas. Faltou aos diretores e presidentes do Atlético acreditar um pouco mais no time, ter um planejamento avançado já que o clube estaria participando de uma competição tão importante. Não participar apenas por participar, não acreditando inclusive que o Atlético chegaria próximo de conquistar o título. O muro caiu nos três últimos dias, no momento em que estamos com a corda no pescoço. Centenas de pessoas se mobilizaram em prol do Atlético, rapidamente nada menos que 16 mil lugares foram levantados, mas nada de real se conhece sobre o fechamento da negociação com o terreno do Colégio Expoente e o povo rubro-negro foi incondicionalmente movido apenas pela emoção e pela ilusão. E por que tudo isso só agora?

Quem pagará pelos estragos realizados no sentimento atleticano? Quem garante a nossa segurança em Porto Alegre? Quem garante que aqui, mesmo com uma capacidade menor, não estaríamos preservando vidas? Quem garante que capacidade maior significa maior segurança?

Sei que, apesar de tudo, precisamos acreditar sempre no Atlético e vencer apenas dentro de campo, seja onde for. Mas eu temo. Temo pela viagem, temo pela ira da torcida que viajará incendiada pelo desrespeito e temo pela invocação da guerra, enquanto poderíamos estar lutando ainda pela paz.

Talvez tudo isto, ou pelo menos a primeira parte desta história termine com uma bela vitória do Atlético nas terras gaúchas, mas só ficarei tranqüilo e só terei um sentimento de recompensa ao esforço de milhares de torcedores atleticanos, quando na noite do dia 14 de julho de 2005 estivermos em praça pública, comemorando o titulo da Copa Libertadores da América.

Escrevo este texto em forma de desabafo, pois só quem presenciou as cenas da fila na Baixada e quem percebeu o sofrimento de inúmeros torcedores, sabe exatamente a dor e a angústia que batem dentro do peito atleticano. Que venha a vitória, e com ela o sentimento de alívio e de paz.


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