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Juliano Ribas
Juliano Ribas de Oliveira, 51 anos, é publicitário e Sócio Furacão. Foi colunista da Furacao.com entre 2004 e 2007 e depois entre março e junho de 2009.
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Gosto muito de bateria. Para falar a verdade, sou tão interessado em instrumentos de percussão que gosto de tocá-los. Bateria é o meu instrumento. Bateria dita a toada da música, é o que chacoalha. Quando ela é tocada, é difÃcil não acompanhar nem que seja dando tapinhas ordenados em algum lugar, na perna, na mesa, na parede, qualquer superfÃcie vira tamborim. Bateria é pulsação, marca e dita o ritmo, que seja qual for, sempre fica mais atraente. Em religiões de origem africana, acreditam que ela serve até para invocar espÃritos e deuses. Não duvido.
A bateria tem lá seus poderes. Mas no Atlético, surdo, bumbo e companhia ganharam uma importância além do som que emitem. Dizem que a bateria faz o Caldeirão ferver. Por mais que eu goste de uma batera, não posso dar a ela tamanha importância. O que faz o Caldeirão ferver é gente. E a temperatura de ebulição é diretamente proporcional ao número de gente que está no estádio. Festa na Baixada tem quando ela está cheia de torcedores. A Arena fica bonita com grande lotação e aÃ, com milhares de vozes e corações, a fervura levanta, chagando a deixar em brasa os alicerces sólidos do nosso templo. Tudo o mais, bateria, adereços, bandeiras, foguetório é coadjuvante da protagonista, a massa.
Cerca de um ano é o tempo da proibição dos instrumentos de percussão na Arena, banida de vez após o jogo Flamengo 1, Atlético 2, pelo Campeonato Brasileiro do ano passado, quando uma das facções organizadas, Os Fanáticos, atiraram as ditas ferramentas segundo pavimento abaixo, para bater em seus couros em um lugar não permitido. Desde então, a bateria é o desejo subversivo de muitos, que torcem para a mudança dessas regras proibitivas. Na semana passada, começaram rumores de que a batucada pode voltar à Baixada e não tem um atleticano que não tenha gostado da idéia. Parece que enfim há movimentações para adequá-la aos novos tempos da Baixada e também do futebol mundial, uma confluência de interesses a fim de deixar as reuniões de atleticanos em sua sede magna mais interessantes e animadas.
Uma das torcidas organizadas do Atlético, a Ultras, a segunda em importância, história e volume de integrantes das torcidas em atividade, conversa com a diretoria do Atlético para fazer adaptações de modo a contribuir mais com o clube, mas sem se tornar um tentáculo independente, transformando-se em uma aliada do clube e seguidora de sua filosofia modernizante. A diretoria por sua vez, parece ter assimilado, após um ano sem os instrumentos, que eles têm um papel importante na festa e que o povo atleticano sente falta deles. No Campeonato Paranaense, então, pôde-se sentir mais a ausência desses instrumentos. Começaram a dizer que a Arena virou uma geladeira. Uma afirmação distorcida da realidade. Desde que me conheço por gente freqüento os domÃnios Rubro-negros e sei que num Campeonato Paranaense o Atlético dificilmente ultrapassa três mil pagantes na maioria dos jogos. Na época do Pinheirão, então, jogos contra Platinenses da vida não davam muito mais que dois mil, tinha até jogo com uns novecentos gatos pingados. É o rentável Campeonato Paranaense. Pouca gente assim não faz ferver. É essa a causa da "geladeira". Pois então que este ano passamos por esse campeonato sem a bateria rufando na platéia. Aà sim vimos a sua importância. Ela tem grande serventia para abafar os corneteiros, raça que sempre existiu na massa atleticana, mas que eram abafados pela freqüência constante da percussão. Sem percussão, o xingamento de um corneta ecoa no estádio se ele estiver vazio. Com batuque só dá para entender aquilo que for dito em coro. Sem bateria, a sensação de frieza de um estádio vazio aumenta.
Por isso, o que o Atlético precisa é de um conjunto de bateria e que seja bem tocado e anime os torcedores. Convenhamos, isso qualquer grupo pode fazer. Não é preciso esta ou aquela torcida organizada. De todos aqueles que gostam da bateria no estádio, poucos têm preferência em quem a toque, contanto que toque. Pode ser os Ultras, os Fanáticos, ou qualquer fã-clube que aparecer. O trabalho desses grupos é só fazer uma trilha sonora boa para se ver um jogo do Atlético. Nada mais. O papel do torcida organizada é superestimado por elas próprias. Na verdade, são apenas uma turma de gente com interesse em torcer pelo clube de forma ritmada, criando músicas. São animadores. E só. A torcida Os Fanáticos achou que é mais. Achou que é força polÃtica. Achou que tinha poderes para dominar território dentro de um lugar que é de todos, que podia enfrentar aqueles que são responsáveis pelo dia-a-dia do clube. Achou que é maior do que realmente é.
Fiquei muito feliz em saber que outros grupos de torcedores começaram a se organizar para buscar uma solução. Pararam finalmente de esperar que isso viesse da Os Fanáticos, que de concreto não pensou em nada, a não ser em palavrões cabeludos para xingar o Petraglia. Não quis fazer jus a alcunha de "organizada". Não quis mostrar que pode realmente se organizar. Por exemplo: é óbvio que quem compra seu espaço na Arena tem mais poder de negociação, pois se torna um sócio contribuinte. A Fanáticos deveria ter primeiro comprado umas cem cadeiras do pacote, pelo menos, no lugar onde desejassem. Para uma organizada que se diz a maior do sul do Brasil, isso não seria problema. Resta saber quantos dos mais de doze mil sócios que dizem ter pagam mensalidades em dia. Se tivesse um bom número de fiéis pagantes de suas mensalidades, a Fanáticos poderia subsidiar parte dos ingressos de seus integrantes, aumentando o número de gente contribuindo no estádio e dando algo de concreto ao clube.
Mas os organizados dessa facção não fazem nada, não pensam em soluções, usam seus coros para xingar diretoria, que é a única coisa que parece que sabem fazer. Praguejam contra o homem que mudou o destino do clube, que muito fez pelo Atlético, com realizações concretas e soluções modernizantes em dez anos. E o que fez Os Fanáticos nesse tempo todo? Permaneceu rigorosamente igual, não fez nada de novo, a não ser uma ou outra musiquinha de rimas pobres. A torcida Os Fanáticos deveria ter pensado em coisas menos juvenis do que ficar falando palavrão para resolver sua situação. Eles tinham que transformar a sua torcida organizada em uma verdadeira empresa, para se associar, como numa joint venture, à empresa mãe, que é o Atlético. São os novos tempos do mercantilismo, palavra que causa arrepios em muitos, mas que é a inexorável realidade do mundo.
A verdade é que torcida organizada não ganha jogo, não entra em campo para jogar. O que ganha é time bom em campo e administração competente, e o que faz um clube grande é toda a sua nação, não uma pequena parte dela. Eles são só parte da massa, não é dona massa. Esse monopólio de serviços de alegorias já tinha mesmo que acabar. Espero que a negociação com os Ultras dê certo. Que aceitem a associação com o clube e seus patrocinadores, que tenham material do mesmo fornecedor, que usem a marca do clube da forma que o clube determinar. Que usem a força das músicas e da bateria apenas para animar o estádio, para unir as vozes de todos que fazem a festa, não para xingar, vaiar, pedir jogador. Que sejam realmente fãs-clubes, não exércitos, milÃcias pretensamente revolucionárias. Espero que os Fanáticos também façam parte da mudança e evoluam. Que parem de dizer que dão porrada pra valer e digam que torcem pra valer. Chega de criancice. E que venha a bateria de volta. Todos os milhares que torcem sem se uniformizar vão agradecer se os organizados fizerem sua parte nesta mudança para melhor que ocorre no Atlético. Pois o mais importante nessa história toda, não são grupos organizados, faixas, reco-reco, surdo ou tamborim. É o Atlético.
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