Jones Rossi

Jones Rossi, 46 anos, é repórter do Jornal da Tarde, em São Paulo, e um dos fundadores do blog De Primeira. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2008.

 

 

O Paraná é um paraíso

18/04/2005


Na segunda-feira passada, minha irmã me ligou querendo saber se eu iria para Curitiba no final de semana. A ligação trazia um desejo secreto: se eu fosse ela poderia ir ver a final do Campeonato Paranaense, já que sozinha ela não iria de jeito nenhum. Cheguei no sábado e domingão - depois da macarronada e de ver Milan e Siena na TV - fomos ao estádio. Antes de chegar ainda encontramos Caranguejo, amigo das antigas, próximo ao estádio. Fui ao Prajá tentar encontrar outros colunistas do Furacão.com, mas não achei ninguém e voltei para entrar pela Getúlio. Tudo na maior tranqüilidade.

O jogo foi aquela festa, Atlético campeão, a torcida comemorando no estádio. Saí com minha irmã para telefonar para minha namorada, ali do lado das bilheterias, na Buenos Aires. Quando fui voltar para a frente do Prajá, uma lanchonete que fica embaixo da Arena, um soldado da PM me impediu de voltar. Proibiu que eu, um guri de sandálias e 1,74m, e minha irmã, a pessoa mais simpática e alegre deste planeta, (pode-se ver como somos perigosos...) circulássemos por aí como a Constituição nos permite. Antes de levar uma cacetada por nada, dei a volta na praça do Atlético e consegui encontrar o Fabiano Camargo, outro velho amigo, ali no Prajá.

Finalmente decidi ir embora, pensando que a tradicional balbúrdia que os idiotas organizados costumam promover nos terminais de ônibus já tivesse acabado. Peguei o bi-articulado e desci no terminal sem maiores problemas, afinal o jogo já havia terminada há duas horas. Quando entro no ônibus encontro minha mãe, que estava voltando da missa, batendo boa com um coxa branca mais bêbado que um gambá. O cara estava xingando todo mundo no ônibus e minha mãe não costuma levar desaforo pra casa. Minha mãe já estava nervosa porque um guarda municipal (olha, a sociedade moderna não existiria sem a importantíssima e imprescindível GUARDA MUNICIPAL) quis revistá-la, enquanto do outro lado do terminal os coxas se pegava de porrada. Como entendem de segurança os guardas municipais. Eu já ia colocar o bebum pra fora do ônibus, mas sentei do lado dele e falei pra ele parar de ofender o pessoal. Surpreendentemente, ele parou e ainda pediu desculpas pra minha mãe. Coisa de bêbado com um pouco de juízo.

Pois o ônibus deixou o terminal e, já no primeiro ponto, aqueles coxas que estavam no terminal o arrebentaram de pedrada com minha irmã e minha mãe dentro, tentando pegar os outros coxas. Registre-se que ninguém estava com camisa do Atlético. O motorista, muito esperto, em vez de arrancar com o lata-velha ficou esperando nos massacrarem. Eu cortei minha perna de leve quando pulei no vidro para proteger minha mãe. Quando os neurônios do motorista (outra profissão repleta de gênios) começaram a funcionar, ele colocou o pé no acelerador e arrancou. Acho que ele finalmente entendeu nossas complexas instruções: "Anda, FDP".

A idiotice das organizadas ficou mais evidente quando os coxas dentro do ônibus começaram a brigar entre eles (e que aqui fique claro, atleticanos e coxas são irracionais em igual medida. Duvido que as coisas fossem diferentes se os marginais em questão fossem atleticanos ou paranistas). Um forçudinho ficou bravo com o bêbado que discutia com minha mãe e pregou a mão na testa do sujeito. O galo cantou na hora. O forçudinho daí se sentiu macho e começou a ameaçar uma menina que ligava pra polícia. Minha mãe, que tem pouco juízo, começou a dar uns beliscões no mini-Tyson para ele parar. Ele se virou e perguntou quem estava o chutando (os beliscões estavam fortes, pelo jeito). Eu disse que era minha mãe e, ainda com menos siso, perguntei qual era o problema. Ele sossegou e voltou a provocar o bêbado, que, àquela altura, já estava quieto no seu canto.

Graças a Deus, chegamos em casa com segurança (na medida do possível). Fui arrumar minha mala para voltar pra São Paulo e ver os gols da final. Liguei na TV Educativa, do governo do Estado. Ali passava uma bela peça de ficção destinada a enganar os trouxas. Marcelo Fachinello mostrava uma matéria em que um desses coronéis da PM dizia que tudo transcorrera bem. Uma hora após o jogo, bastaria que alguém da produção do programa, realizado ao vivo, telefonasse de volta para a PM ou para as companhias de ônibus para averiguar o pós-clássico. Mas não, na Educativa tudo era lindo e maravilhoso. E assim os curitibanos puderam dormir felizes com o título e satisfeitos com sua polícia, que revista velhas senhoras que voltam da igreja, impedem cidadãos comuns de encontrarem os amigos, mas deixam os marginais das organizadas transformarem um ônibus alimentador num bonde do terror. Longe dos centros, as periferias são de quem pode mais.


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