Jones Rossi

Jones Rossi, 46 anos, é repórter do Jornal da Tarde, em São Paulo, e um dos fundadores do blog De Primeira. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2008.

 

 

Vira-latas rubro-negros

12/02/2005


O cineasta João Moreira Salles, em uma de suas crônicas, escreveu que o torcedor do Botafogo é um pessimista crônico, incurável. Do tipo que, quando seu time está ganhando por 4 a 0 e toma um gol aos 44 minutos do segundo tempo, exclama: "Agora fodeu". Pois a torcida atleticana é o completo oposto. Quem não lembra daquele 5 a 1 em 95 que mudou nossa história? Terminou o primeiro tempo com 3 a 0 para o Coritiba. Mas quem cantava o hino éramos nós. E quando saiu um gol, um mísero golzinho, o Couto Pereira tremeu como nunca. No final perdemos, e perdemos feio, mas já estive em Maracanãs e Morumbis lotados em jogos decisivos e jamais vi algo igual. Esta é a principal característica da torcida atleticana. Uma fé cega no próprio futuro, um otimismo inabalável de quem sabe que a grandeza nos é inata.

Quer dizer, aparentemente o verbo atualmente fica melhor conjugado no passado: a torcida ERA assim. Porque de uns tempos para cá a massa rubro-negra deu de andar soturna por aí, maldizendo os destinos do Furacão nos becos de Curitiba. De um hora para outra fomos acometidos por um perverso complexo de vira-latas. De carruagem, o poderoso time do Campeonato Brasileiro virou, da noite para o dia, abóbora. A se levarem em conta as previsões de alguns Nostradamus de plantão, a esta hora o Atlético estaria ocupando a lanterna do Paranaense. Estranhamente - e alguns devem se roer por dentro em razão disso - é o líder, mesmo desentrosado e utilizando o time b em alguns jogos.

Quando se fala em Libertadores a coisa degringola de vez. "Com esse time não dá", bradam os neo-derrotistas. E cada conta do rosário de lamentações tem um nome: Washington, Jadson, Marinho, Rogério Corrêa, Fabiano, Levir. Já vi gente chorando até a saída do Raulen. Claro que todos são grandes profissionais e seria melhor tê-los no Atlético do que longe do Atlético. O pior, no entanto, é colocar a culpa da saída dos jogadores na diretoria. Uma coisa coisa tem que ficar clara: nosso dinheiro é fraquinho, fraquinho, um Apollo Creed perto do Ivan Drago. Qualquer saco cheio de euros leva um Jadson, um Dagoberto. É só eles quererem. Um pouco de honestidade intelectual é preciso. A evasão não é culpa da diretoria. Isto não acontece só no Atlético. O Santos acabou de perder o Elano para o mesmo Shakhtar Donetsk que levou o Jadson e o São Paulo vendeu o zagueiro Rodrigo a preço de gasosa Cini de Framboesa. São dois craques, no melhor sentido da palavra. Sem exageros, Elano é uma espécie de Zidane brasileiro. E com Rodrigo chefiando a zaga tricolor o São Paulo foi o time que menos tomou gols no Brasileiro. Valem o dobro do valor pelo qual foram vendidos.

São Paulo e Santos estão na Libertadores, como nós. Mas observem a qualidade dos nossos reforços e o deles. Temos Fernandinho e Evandro voltando da Sub-20, e Dagoberto, em breve, da contusão. O Santos trouxe o Tcheco meio gordo para o lugar do Elano. Logo o Robinho também vai embora. O São Paulo, coitado, vai improvisar na defesa. E quem aí vai dizer que Denis Marques não é pelo menos dez vezes melhor que o Grafite?

Estou sendo otimista demais? Pode ser, me desculpem, mas ser atleticano me fez assim. E aviso que, pelo menos desde a década de 60, ser botafoguense não faz bem a ninguém.


Este artigo reflete as opiniões do autor, e não dos integrantes do site Furacao.com. O site não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações.