Ricardo Campelo

Ricardo de Oliveira Campelo, 45 anos, é advogado e atleticano desde o parto. Tem uma família inteira apaixonada pelo Atlético. Considera o dia 23/12/2001 o mais feliz de sua vida. Foi colunista da Furacao.com entre 2001 e 2011.

 

 

A caverna

27/01/2005


Platão criou a metáfora do “mito da caverna” para relacionar a filosofia e a realidade em que vivemos. A idéia, em síntese, consiste em uma caverna, dentro da qual estão pessoas inteiramente acorrentadas e com o rosto voltado exclusivamente para a parede do fundo. O pouco de luz que alcança o interior é responsável pela projeção, no fundo da caverna, de sombras daquilo que se passa do lado de fora. E é assim, tão somente, que estas pessoas vêem o mundo exterior.

O Atlético de hoje é como esta caverna. E nós, torcedores, somos os prisioneiros. Tudo que podemos ver são as sombras no fundo da caverna. Não temos conhecimento preciso ou profundo sobre os atos de administração do Clube. Qual o objetivo do Clube Atlético Paranaense hoje? Com que meios pretende alcançá-lo? Tudo o que vemos são sombras, e as perguntas vão ficando sem repostas.

É difícil falar sobre o atual Atlético. Avaliar os atos de sua diretoria é complicado, pois não se sabe o que está do lado de fora da caverna. De dentro da caverna, não nos é dado conhecer sobre a administração das finanças do Clube. Os valores das negociações de jogadores nunca são divulgados. Quando sabemos algo, é por especulações da mídia. Ainda assim, nunca sabemos o destino desta receita dentro do Clube. Fala-se em obras no Centro de Treinamentos, mas não existe uma demonstração convincente do que é feito. Outra coisa que não sabemos é: quando teremos e quando não teremos times fortes. O fato é que, daqui onde estamos, as sombras que vemos são preocupantes.

O que explicaria a venda de Jádson neste momento? Com o Clube às vésperas de disputar a competição mais importante que lhe é possível? Por quê se desfazer de um de seus principais jogadores agora, ao invés de aguardar, pelo menos, até a metade do ano, quando também há movimento no mercado europeu? São perguntas que o acorrentado torcedor não consegue responder.

Será que o Atlético estaria se assumindo como um Clube meramente mercantilista? Para o qual o único interesse é o lucro? Nunca duvidamos da capacidade de nossa diretoria em fazer negócios rentáveis, mas o rumo das coisas indica que se está escrevendo certo por linhas completamente tortas. O Atlético aufere receitas e mais receitas, mas não o vemos aplicá-las na direção daquilo que é o objetivo de todo Clube de futebol da face da terra: montar times para disputar títulos. O dinheiro deve ser o meio, e não o fim.

Não queremos loucuras, como pagar salários de R$ 200.000 para medalhões, ou incompetência, como contratar jogadores de renome lesionados, que mal entram em campo. Mas queremos ter alguma esperança. Pois, quando olho as sombras na parede, vejo que, às vésperas no início da Taça Libertadores da América, nosso elenco é visivelmente mais fraco do que o que finalizou a participação no Campeonato Brasileiro do ano passado. Não faz sentido.

Voltando a Platão: no “mito da caverna”, quando um dos prisioneiros consegue quebrar os grilhões que o mantinham acorrentado, e sai da caverna, fica completamente cego em razão do contato com a forte luminosidade, em contraste com a escuridão a que seus olhos se acostumaram. O que será que aconteceria se nós, torcedores, nos libertássemos e conseguíssemos visualizar o que se passa do lado de fora da caverna atleticana?


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