Daniel Machado

Daniel Lopes Machado, 46 anos, é empresário e consultor em sistemas de informação. Considera os versos da sexta estrofe do hino atleticano, escritos por um ex-jogador, imortalizado em uma espontânea demonstração de amor ao clube, a mais bela poesia de todos os tempos: "A tradição, vigor sem jaça... Nos legou o sangue forte... Rubro-negro é quem tem raça... E não teme a própria morte!" Foi colunista da Furacao.com entre 2008 e 2010.

 

 

Uns e outros

04/06/2010


Tirei a barba e deixei só o bigode, para provar que ele é afiado.

Fui à Baixada. Saí de lá como quem sai do motel. A vitória sobre o Botafogo, de virada, diante das circunstâncias, foi quase melhor que uma noite tórrida, seguida de um banho de hidromassagem. Dormi sorrindo.

Quem diria? Achei que Valencia fosse um guerreiro honrado, mas me equivoquei. Foi expulso de propósito em Porto Alegre. Se dependesse de mim, nunca mais vestiria a camisa do Atlético.

Quem diria? Pensei que Chico fosse um brucutu descomprometido, mas me enganei. Como volante, esteve irreparável.

Fransérgio, como homem de sobra, também. Depois que entrou, deu o equilíbrio necessário. O time fluiu. Este caso, entretanto, não me surpreende.

Há quase um ano, dia 12 de junho de 2009, Dia dos Namorados, cá estava Daniel Machado, um colunista nada romântico, a criticar a forma como os talentos atleticanos eram - e ainda são - tratados.

Abre aspas

Na meia-cancha do Internacional joga um menino chamado Sandro. 20 anos, volante que erra poucos passes, daqueles que desarmam e saem para o jogo. Sabem qual é a diferença entre ele e o Fransérgio?

Nenhuma. Se Fransérgio fosse para o Inter, e Sandro viesse para o Atlético, sabem o que mudaria? Nada. Fransérgio arrebentaria. Atuando ao lado de Guiñazu, amadureceria. Complementaria sua formação técnica, aprenderia que boleiro de sucesso deve suar a camisa, com persistência, coragem e respeito ao clube. Enquanto isso, aqui no Atlético, no meio de tantos desconhecidos e desmotivados, mais cedo ou mais tarde Sandro ganharia uma oportunidade, e então, depois de entrar no meio de tanta fogueira, acabaria queimado, esquecido, treinando em separado, em um convite ao bar e à destruição de seus sonhos.

Está claro que educação, pistas de propriocepção e centro médico de última tecnologia não bastam. É preciso escalar os garotos como peças importantes, porém não fundamentais, em posições que não comprometam a engrenagem, em um time do qual se orgulhem. Não ao lado de seus amigos, mas de ídolos.

Fecha aspas

Em outras palavras, já que o problema é dinheiro, se quisermos lucrar com os guris, precisamos antes investir em atletas consagrados.

Pois, conforme dito, um ano se passou. Sandro foi convocado algumas vezes para a Seleção Brasileira, quase foi à Copa do Mundo. Agora, vai mostrar seu futebol em terras inglesas. Rendeu uma boa grana ao clube gaúcho, uma grana que pagou a vinda do Guiñazu e ainda sobrou.

Por outro lado, Fransérgio ganhou algumas oportunidades, mas não ritmo de jogo. Não se destacou, mas também nunca complicou.

Durante todo este tempo, o Atlético procurou. Dizia não encontrar bons nomes no mercado. Tivemos que engolir este tal de Leandro.

Enfim, mais uma vez, depois de um primeiro tempo horroroso, o menino Fransérgio entrou e jogou simples. Foi preciso. Não quis aparecer, e também não se isentou da responsabilidade. Sem firulas, e também sem afobação, deu segurança à defesa.

Bastou uma larga dose de paciência. Seguiu trabalhando duro, à espera de uma nova chance.

E, por falar em paciência, depois da relaxante vitória, vale ressaltar o papel do torcedor atleticano, pela paciência à espera de promessas - sem fio no bigode -, pelo apoio incondicional. Muitas outras torcidas do Brasil já teriam abandonado o barco. Algumas já teriam pixado os muros do CT e, outras, ameaçado os atletas de morte.

Carpeggiani, seja bem-vindo. Tudo indica que, em pouco tempo, você já encontrou a melhor escalação. Por favor, não invente moda - o Jorjão ficou mais famoso pelas oportunidades no ataque do que como zagueiro. Por favor, não se acovarde ao jogar fora de casa, como uns e outros por aí.


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