Juarez Villela Filho

Juarez Lorena Villela Filho, 46 anos, é advogado, funcionário público estadual, dirigente de rugby e arruma tempo para acompanhar jogos do Atlético, isso desde 1987. Conhece 49 estádios Brasil afora onde foi ver de perto o Furacão. Sócio desde os tempos do Atlético Total em 1998 e na nova modalidade Sócio Furacão desde 2007.

 

 

Vale a pena ver de novo?

15/03/2010


Janeiro. Praticamente 70% do elenco que sofreu todo o ano anterior, escapou do rebaixamento nas rodadas derradeiras sempre implorando o apoio da torcida já que somente dentro de casa o time fazia alguma diferença, permanece. O discurso é de que a base é boa ou que o elenco nos momentos de pressão mostrou capacidade de reverter o quadro e estranhamente a reformulação atende ao seguinte critério: os bons são negociados, os meia boca e ruins ficam para uma nova tentativa.

Fevereiro. Depois de empatar algumas e perder para um time desses de verão que disputam o regional, haja vista serem montados no começo de dezembro e durarem até abril, quando termina o Estadual, a comissão técnica passa a ser questionada. A imprensa embarca no discurso da direção de que puxar uma dúzia de garotos da base é investir em chuteiras e que o treinador é que não está trazendo os resultados esperados e começa a criar um ambiente desfavorável a este no clube, que passa de fase na Copa do Brasil contra um time de alguma cidade que nunca ouvíamos falar, mas sem ter conseguido eliminar o jogo de volta.

Março. Vencemos um time da capital que passa por uma situação paupérrima no sufoco e empatamos ou perdemos do único rival nos dois únicos jogos do Estadual com alguma emoção. Mudança de treinador, métodos e todo o “planejamento” de então vão para o espaço. Nenhuma contratação, já que segundo a direção a base é boa, e precisamos ter paciência porque o que importa é o Brasileiro. Muda-se o comando técnico.

Abril. Ganhamos o Estadual, ou o rival. Se vencemos, a direção mete bronca nos críticos, dizendo que o sempre sabiam do potencial, que o time respondeu às críticas dentro de campo e que o que importa é o resultado. Se perdemos, a culpa é dos deuses do futebol, do acaso, mas o Estadual não vale nada e estamos nos preparando para o Brasileiro. Somos eliminados sem grande dificuldade por qualquer time de 1ª divisão na Copa do Brasil depois de fazermos uma partida histórica de reação contra um time de divisões inferiores, logicamente com todo o apoio da torcida para reverter o placar.

Maio. Ter saído da Copa do Brasil precocemente não é mau negócio para a direção, já que o time fica com a cabeça somente no Brasileiro. Vemos alguns jogadores “baratos”, daqueles em que deveríamos ter investido em janeiro, vestindo camisas dos grandes, beijando escudo e prometendo títulos. Vendemos alguma das raras pratas da casa que dão certo para fazer caixa e apostamos na dupla de ataque do Sapotiguá de Passa Quatro, pois nosso olheiro Stevie Wonder chancelou a contratação. Não sabemos nem nunca saberemos a quem pertencem esses jogadores, mas eles começam titulares no nacional, no qual invariavelmente fazemos 3 ou 4 dos primeiros 12 pontos disputados.

Junho. Excetuando-se ano de Copa do Mundo como este, é em junho que a coisa esquenta, ainda que o inverno já esteja aí. Mudamos mais uma vez o treinador, trazendo possivelmente um ex do Náutico. Alguns times que nem sabíamos que estavam na 1ª divisão, como Barueris, Avaís e xará goianienses da vida, estão à nossa frente e nem sequer conseguimos vencê-los em casa.

Julho. Passado mais do que o primeiro terço do Brasileirão, o time joga menos pior fora do que em casa, já que além de fraco tecnicamente o time é meio bunda mole e não aguenta a pressão em casa, pressão de uma torcida já impaciente mas que comparece com no mínimo 10 mil pessoas por jogo. Nos são oferecidos alguns reforços, mas a diretoria diz que não vai fazer loucuras e que o clube não entrará em leilão.

Agosto. No mês do cachorro louco misteriosamente a grana aparece! Depois de duas rodadas com um treinador interino, já que no final de julho caiu mais um, o clube traz um treinador reconhecidamente bom (e que não custa barato) e trazemos de dois a três reforços, jogadores repatriados do exterior e loucos para voltar ou eternos reservas de times grandes e que já decorridos cinco meses de Brasileirão não fizeram ainda a meia dúzia de partidas regulamentares e podem se transferir. Se dispensam ou se colocam treinando em separado alguns ex-craques que pareciam desinteressados e emplacamos uma sequência de três vitórias e um empate.

Setembro. Direção anuncia que em breve um grande patrocinador deve emplacar pelos nossos lados e a nossa torcida, sempre fanática e fiel, acredita. Em casa nos tornamos imbatíveis e até mesmo fora conseguimos, depois de mais de 20 rodadas, nossas primeiras vitórias.

Outubro. Elenco já fala em Sul-Americana. Cidade em polvorosa, tiramos pontos dos três primeiros colocados e mais uma vez vencemos o poderoso Cruzeiro em Belo Horizonte. Direção segue dizendo que tudo segue o planejado. Sobe num índice inexplicável o plano de sócio, há gritaria, mas a majoração se mantém firme.

Novembro. Uma leve descontraída, uma relaxadinha, os adversários da metade de baixo da tabela também reagem e a luz amarela se acende. Dois tropeços em casa e a volta do jejum fora ameaçam o trabalho do treinador, alguns antes afastados são reintegrados e é implorada a ajuda da torcida para que se fuja do fantasma da 2ª divisão. Mês tenso!

Dezembro. Contando com as partidas em casa e com o apoio dos mais de 20 mil sócios, o clube escapa do rebaixamento e fica pela boa (e não dependendo de si) para pegar uma Sul-Americana no ano seguinte. Direção promete mudanças, mas somente pontuais e não estruturais, haja vista a base ser boa e principalmente terem respondido em campo quando pressionados mantendo-se assim grande parte do mesmo elenco e do mesmo treinador, ainda que contestado, para o ano seguinte.

Vale a pena ver tudo isso de novo?

Quaisquer semelhanças com o Clube Atlético Paranaense de 2006 pra cá, quando os negócios deram lugar ao futebol como prioridade, não são meras coincidências.

ARREMATE

“O povo foge da ignorância/
Apesar de viver tão perto dela/
E sonham com melhores tempos idos/
Contemplam essa vida numa cela...”
. Admirável gado novo – ZÉ RAMALHO


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