José Henrique de Faria

José Henrique de Faria, 74 anos, é economista, com Doutorado em Administração e Pós-Doutorado em Labor Relations nos EUA. Compareceu ao primeiro jogo do Clube Atlético Paranaense em 1950, no colo de seu pai. Seu orgulho é pertencer a uma família de atleticanos e ter mantido a tradição. Foi colunista da Furacao.com entre 2007 e 2009.

 

 

Pingos nos is

29/12/2009


O que ocorreu com o Clube Atlético Paranaense em 2009 estava praticamente previsto na campanha ocorrida ao final de 2008. Apesar da irritação demonstrada pelo postulante ao cargo pela situação, por seu patrocinador maior e seus acólitos, as questões colocadas nos debates pela oposição se revelaram corretas e muitas delas continuam não devidamente esclarecidas.

Exceto para os muito ingênuos, era por demais evidente que aquele que saiu não desejava sair de fato. Cuidar de negócios interessantes, incluindo a negociação de jogadores para o exterior e a realização da Copa de 2014, é o sonho de consumo de muitos businessmen do mundo do futebol. Não havia dúvidas que os conflitos de interesses seriam expostos tão logo a autoridade de quem assumia fosse colocada em questão. A chapa de oposição, a única e verdadeira, anunciou explicitamente que em caso de vitória o antigo dirigente seria imediatamente afastado de seus quadros. A chapa da situação só percebeu o significado disto algum tempo depois. Percebeu que não se pode trabalhar cooperativa e solidariamente em um ambiente em que prevalece o centralismo individualista. O rompimento inevitável ocorreu com menos de 60 dias de gestão.

Na campanha foi apontada, pela oposição, a existência de uma dívida de R$ 15 milhões em novembro de 2008. Este dado foi enfaticamente negado pela chapa da situação. No entanto, logo após assumirem, os novos dirigentes admitiram a existência de uma dívida de R$ 17 milhões. Sendo membros de uma mesma equipe, era esta dívida desconhecida antes da campanha? Quando reconheceram a dívida, por que também não reconheceram que a oposição, a única e verdadeira, tinha razão?

Durante a campanha foi dito pela oposição que era preciso explicar como um clube com a estrutura do Clube Atlético Paranaense não revelava jogadores das divisões de base. Era voz corrente que jovens atletas saíam do clube para outras agremiações sem passarem pelo time profissional e eram negociados com outros clubes através de empresas e empresários com ligações não transparentes com a direção do clube. A oposição, única e verdadeira, anunciou o fim desta prática perniciosa caso viesse a vencer e o então candidato da situação, vociferou, tomando o fato como se fosse uma questão pessoal. Hoje se sabe, pelo noticiário, que há caso de jogador da divisão de base que tem contrato com empresário/empresa ligado à direção anterior do Clube Atlético Paranaense. O que isto quer dizer não se sabe ao certo, mas quer dizer alguma coisa e esta coisa está mal esclarecida.

A oposição, a única e verdadeira, tinha como projeto um Atlético Mais Futebol. A situação, após amealhar três anos de fracassos no Campeonato Brasileiro, na Copa do Brasil e sem título no Campeonato Paranaense, anunciava menos tijolos e mais chuteiras. Este mote de campanha não se transformou, lamentavelmente, para os torcedores, em uma política do Clube Atlético Paranaense. Após vencer o Campeonato Paranaense da maneira que todos sabem, um novo fracasso na Copa do Brasil e um ano de constante ameaça de rebaixamento marcaram a política de futebol profissional do Clube. Nada diferente do que se via nos últimos anos da gestão anterior.

Contratações equivocadas acontecem. Mas quando se tornam regra elas denunciam um problema de planejamento e de gestão. O velho hábito de afirmar que bons jogadores são caros e que o Clube não tem patrocínio também constitui argumento recorrente. Jogadores bons são caros há muito tempo e o próprio Clube Atlético Paranaense teve boas receitas baseado nesta evidência. Então, isto não pode ser uma desculpa. Mais caro é o rebaixamento; mais cara é a vergonha e a humilhação; mais oneroso é cumprir o papel de mero coadjuvante. Quem deseja ser grande precisa pensar e agir como um Clube grande. Há algum tempo não se tem um patrocínio adequado. Por quê? Seria pelos resultados do futebol do Clube? Seria por suas exigências incompatíveis com seu desempenho? O que se sabe é que um Clube que deseja ter um patrocínio de clube grande precisa agir como um clube grande em sua área finalística, o futebol. Ao Clube Atlético Paranaense tem faltado atitude.

Passei um ano inteiro sem me manifestar acerca do Clube Atlético Paranaense, de sua gestão, de seu desempenho no campo do jogo. Entretanto, como atleticano há quase 60 anos, penso que devo fazer esta análise crítica, porque quando se ama é que se pode e se deve criticar. Não se critica o que é indiferente. Se não me manifestei antes foi por que não quis fazê-lo, porque não me senti motivado a fazê-lo, porque não percebi em quê minhas avaliações poderiam fazer eco diante de uma postura que continua valorizando a mesmice e a prepotência.

A análise que ora faço não deve ser confundida com qualquer concordância com as mágoas de quem saiu e quer voltar. Também não se confunde com a dos que postulam a volta do que era porque se decepcionaram com o que é, especialmente daqueles que votaram no que é achando que votavam no que era. A estes, alerto para as reais possibilidades de ainda mais um ano de desavenças intestinas pouco construtivas, particularmente quando se aproximarem as eleições ao final do ano. A cisão interna do grupo no poder pode ampliar ou pode ser resolvida exatamente na partilha pelo poder.

Nós, os atleticanos que não fazemos parte desta massa e que não comungamos com este projeto de futuro, apesar de todas as dúvidas acerca das condições reais dos que estão e dos que estavam e querem voltar a estar, não vamos torcer pelo fracasso do Clube Atlético Paranaense. Ao contrário. Vamos torcer para que em 2010 possamos resgatar nosso lugar nos cenários local, nacional e, quem sabe, internacional.

De minha parte, fica a certeza refletida e amadurecida de que não participarei de nenhuma disputa política no Clube Atlético Paranaense. Assim, espero passar mais um bom período em silêncio, pois os fatos têm falado por si mesmos, ao mesmo tempo em que continuarei torcendo, apaixonada e incondicionalmente, como sempre fiz e sempre farei, pelo meu Clube Atlético Paranaense.


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