Juarez Villela Filho

Juarez Lorena Villela Filho, 46 anos, é advogado, funcionário público estadual, dirigente de rugby e arruma tempo para acompanhar jogos do Atlético, isso desde 1987. Conhece 49 estádios Brasil afora onde foi ver de perto o Furacão. Sócio desde os tempos do Atlético Total em 1998 e na nova modalidade Sócio Furacão desde 2007.

 

 

Responsabilidades

14/12/2009


Pau que nasce torto nunca se endireita. Se o adágio popular serve para designar pessoas que são da pá virada desde pequenas (e discordo), pode-se aplicar em relação a coisas, acontecimentos, onde invariavelmente um início errado nos levará a uma conclusão equivocada. É um sofisma, um raciocínio que em tese parece perfeito, bem embasado inclusive mas que chega a uma conclusão ilusória, errada pois parte de um pressuposto errado.

Extinguir as torcidas organizadas é mais uma conclusão equivocada, porque atinge mais uma vez uma conseqüência e não a causa do problema. Mais uma vez o poder público age como o corno que vê a mulher no sofá com outro, fica bravo, rubro de raiva, tira-os da sala e ......vende o sofá!

Há marginais nas torcidas organizadas? Sem dúvidas! Assim como nos belos prédios do Centro Cívico, nos caros bares da Batel e também nas faculdades particulares da cidade. Assim como a maioria das pessoas destes lugares são honestas, trabalhadoras e cientes dos limites que suas paixões pelos clubes pelos quais torcem, podem atingir.

De que adiantou a demagógica, inócua e inoportuna proibição de venda de bebidas alcoólicas durante os jogos de futebol? Cessou a violência, ônibus não são mais depredados e nem houve morte depois de clássico desde então? Vamos fazer de conta que com a ausência da venda de bebida (que foi tentada na Inglaterra e com resultados que mostraram sua inutilidade) não houve a maior batalha campal num estádio de futebol em dezembro deste ano, aqui mesmo na cidade?

Tem-se que atacar a causa e não a conseqüência. É incrível que os jornais estampam nas segundas pós clássico que 150 baderneiros brigaram no Terminal da Fazendinha, que houve arrastão na 7 de Setembro nas imediações da Praça Osvaldo Cruz e não foi preso sequer um meliante! Pensem, toda a repercussão que houve no tumulto do Couto Pereira, se não houvesse uma comoção tão grande, a polícia não teria feito uma única prisão, pois só fê-la a partir de terça. Domingo, no dia da confusão não prenderam um único vândalo! E a culpa é da organizada?

Em qualquer loja nos shopping populares da Rua XV ou barracas de camelô da Rui Barbosa é possível se comprar uma camisa de torcida organizada, tanto as daqui como as de fora. Daí eu saio de lá com mais três amigos, vestindo artigos da Torcida Máfia Azul do Cruzeiro por exemplo e começo e fazer bagunça pelas ruas, o Ministério Público vai processar a torcida celeste lá em Belo Horizonte? Que lógica existe nisso? Os dirigentes da torcida organizada sequer sabem que eu existo e terão que responder pelos meus atos de imbecilidade?

Pedem para que as torcidas tenham cadastro. Ok, elas tem e inclusive mandam para a polícia. Adiantou algo? Pedem para os torcedores irem e voltarem juntos de suas sedes nos clássicos, obedecemos e depois, o que acontece? A violência é sempre nos mesmos lugares e o poder público parece não perceber isso! Brigas são marcadas via Orkut ou outras redes de relacionamento na internet e todo mundo fica sabendo, menos a polícia?

Não quero excluir daqui a responsabilidade que cabe aos torcedores. Muito vão com espírito de briga mesmo, querem mais é ver o bicho pegar e não medem as conseqüências de seus atos. Eu mesmo já conversei pessoalmente, tanto com o Presidente Julião como o vice Suke a respeito dos “comandos” que ou se tem controle total deles ou devem ser extintos, sob pena de prejudicarem todo o trabalho feito pela direção. Vários “torcedores” sequer entram nos jogos, ficam nos arredores tomando seu “tubão” e causando confusão, enquanto o sócio que contribui com o clube, é sabedor de seus direitos e obrigações se vê privado de beber uma inocente cerveja vendo seu time em campo. Sem sentido!

O que não se pode é jogar a responsabilidade para o outro lado, como se em alguma das partes interessadas só tivesse gente do bem e o mal sempre fosse o oposto. Há erros claros das autoridades que, com a conivência da imprensa, maquiavam a situação decadente das estruturas do Couto Pereira por exemplo. Se houve ameaça de morte na semana do jogo, por que o esquema de segurança foi tão falho? Era nítido que haviam pouquíssimos policiais em campo e que se mostraram despreparados para lidar com situações de conflito e tumulto.

Vários amigos meus coxas simplesmente saíram do estádio e pronto, sequer viram a confusão. E por que tanta gente fica ali de bobeira, parece que esperando levar uma borrachada da polícia? Me perdoem por focalizar tudo nos incidentes do último dia 06 de dezembro, mas ali foi um pout-pourri de erros, de ambas as partes e creio que fique mais fácil para exemplificar.

A falta de condições decentes na imensa maioria dos estádios brasileiros contribui para isso. As autoridades nos tratam como bichos sendo levados para o abatedouro, logo parte das pessoas se comporta como um bicho de verdade. Falta de segurança de higiene, de lugares decentemente demarcados para se assistir um jogo de futebol são parte dessa “cultura brasileira” de nosso esporte mais popular. Ou seja, enquanto o futebol profissional não profissionalizar, inclusive na questão da segurança seus mais diversos segmentos, não adianta querer que somente uma parte é que faça sua parte.

Extinguir as organizadas é tapar o sol com a peneira. Elas, mesmo informalmente continuarão a existir e dentro delas continuarão a ser feitas coisas boas, mas também continuarão a servir de escudo para “machões briguentos” extravasarem sua ira. Assim como fazem nas brigas de gangues nos bairros todo final de semana, assim como ricaços fazem com suas possantes caminhonetes importadas atropelando e ceifando vidas no violento trânsito de Curitiba, assim como nas brigas nas saídas das escolas públicas dos bairros mais pobres e assim como nas homéricas batalhas nas saídas dos sofisticados barzinhos da Avenida Batel.

Por que marginal não tem somente numa classe social, não veste somente a camisa de um time ou necessariamente freqüenta torcida organizada. Marginal existe em todo lugar e deve ser identificado e punido na exata medida do que manda a lei. Não podemos é todos termos que pagar por uma minoria, pois aí estaríamos perdendo o foco, indo na conseqüência do problema e não na sua causa. Estaríamos partindo de uma premissa errada, estaríamos sofismando.

Chegaríamos num resultado falso porque partimos de um início equivocado. Está mais do que na hora de enfrentarmos o real problema de frente, menos esquiva e mais dinâmica, antes que mais vidas sejam jogadas no ralo ou antes de mais uma vez prejudicar muitos em detrimento de poucos.

ARREMATE

“Estado Violência/
Estado Hipocrisia/
A lei não é minha/
A lei que eu não queria”
. Estado violência – TITÃS


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