Daniel Machado

Daniel Lopes Machado, 46 anos, é empresário e consultor em sistemas de informação. Considera os versos da sexta estrofe do hino atleticano, escritos por um ex-jogador, imortalizado em uma espontânea demonstração de amor ao clube, a mais bela poesia de todos os tempos: "A tradição, vigor sem jaça... Nos legou o sangue forte... Rubro-negro é quem tem raça... E não teme a própria morte!" Foi colunista da Furacao.com entre 2008 e 2010.

 

 

O outro lado da moeda

11/09/2009


Deu pano pra manga o tal anúncio do aumento das mensalidades. Semana passada, procurei justificar a decisão da cúpula atleticana. Posicionei-me a favor, em virtude da decrescente relação entre receitas e despesas, causada pelo desserviço da Lei Pelé.

Aliás, antes que me encham de bolachas novamente, é preciso esclarecer que a Lei Pelé se mostrou positiva para atletas e procuradores. Surgiram também as figuras orbitantes dos empresários do mundo do futebol, que encontraram um grande bonde para embarcar. Foi entendida por aí como a Lei Áurea dos boleiros, de fato.

E o mercado inflacionou desproporcionalmente, até o ponto em que qualquer atacante de meia tigela, oriundo do Vila Xurupita, leva mais de 50 mil por mês, só de salário, fora bicho. Bem que eu gostaria, mas não sou atleta, treinador, procurador ou empresário. Sou torcedor; e enquanto torcedor, defendo os interesses do meu time; e a verdade é que o meu time, assim como os demais, foram impiedosamente maltratados pela dita lei.

Pode até funcionar lá fora, mas aqui não, em um país onde dagobertos e jancarlos da vida desonram acordos impunemente, seja por vias ilícitas ou pelo desconhecimento da ética.

Nos dias de hoje, alguns clubes brasileiros (mais precisamente os renegados da cota de televisão - entre eles o nosso Atlético) buscam desesperadamente formas alternativas de arrecadação.

Enfim, por tudo isso, postei aqui minha opinião a favor do aumento. Pra quem não leu, está dito novamente: sou a favor! Pois não me sinto um consumidor do Atlético, e não aceito tratá-lo como um produto. O dia que eu não puder mais contribuir, porque não cabe mais no meu orçamento, ficarei triste, em casa. Talvez eu me zangue com o Édson Arantes, mas definitivamente não irei ao Procon reclamar meus direitos.

De qualquer forma, minha intenção esteve longe de questionar o outro lado da moeda, para não causar ainda mais alvoroço. Recebi muitas mensagens de atleticanos que criticaram duramente a forma como foi apresentada a majoração nos valores dos planos associativos. Não pude discordar. O que chateou, até aos mais sensatos, foi a falta de tato da diretoria.

A galera foi pega de surpresa. Divulgaram de qualquer jeito, sem muito jeito, de sopetão mesmo, com pouquíssimo tempo de antecedência. E até os que estavam dispostos a colaborar colocaram um pé atrás.

Cenário 1

Astolfo, o taxista, foi chamado na sede de uma grande corporação, ali na Dr. Pedrosa. Lá o aguardava um advogado, sujeito elegante, bonachão, dono de um bigode maior que o do Gopal, só que grisalho.

- Ubaldino do Amaral, 2052, por favor.

Logo que passaram a 24, Astolfo e o advogado encararam um trânsito desgraçado na André de Barros. Mais de uma hora. Tristemente, logo souberam pelo rádio, um ônibus havia atropelado uma agente do Diretran perto da Reitoria. Para fugir do caos, Astolfo preferiu descer a João Negrão, mas na ponte do trem, esquina com a 7, havia caído um paraquedista, e a ambulância do Samu bloqueava a pista. Mais uma hora parados. Quando por fim chegaram, Astolfo fez questão de pedir desculpas.

- 30 reais, senhor.
- Aqui está.
- Sinto muito pelo atraso, senhor.
- Não se preocupe, você não teve culpa. Imprevistos acontecem.

Cenário 2

Astolfo, o taxista, foi chamado na sede de uma grande corporação, ali na Dr. Pedrosa. Lá o aguardava um advogado, sujeito elegante, bonachão, dono de um bigode maior que o do Gopal, só que grisalho.

- Leve esta encomenda até a Ubaldino do Amaral, 2052, por favor. Chegando lá, ligue para mim.

Logo que passou a 24, Astolfo encarou um trânsito desgraçado na André de Barros. Mais de uma hora. Tristemente, logo soube pelo rádio, um ônibus havia atropelado uma agente do Diretran perto da Reitoria. Para fugir do caos, Astolfo preferiu descer a João Negrão, mas na ponte do trem, esquina com a 7, havia caído um paraquedista, e a ambulância do Samu bloqueava a pista. Mais uma hora parado. Quando por fim chegou, Astolfo entregou a encomenda e ligou para o advogado. Fez questão de pedir desculpas.

- 30 reais, senhor.
- 30 reais? Você está louco?
- É que peguei um baita trânsito, dois acidentes. Em um deles, o ligeirinho passou por cima de uma periquita. No outro, um sujeito caiu do céu no meio da rua. Sinto muito pelo atraso, senhor.
- Taxista mentiroso, pilantra!

Moral da história

Quando não vivenciamos algumas verdades, parecem mentiras.

Muito esforço tem sido feito para tornar mais participativa a gestão do nosso Atlético, mas a verdade é que não está dando muito certo. Definitivamente, estamos fora do táxi rubro-negro. Mas por que é tão difícil compartilhar os acontecimentos e a atual condição organizacional e financeira do clube? Com mais transparência, e uma aproximação mais efetiva com a imprensa, organizadas, conselheiros e sócios, a diretoria poderia facilmente evitar tanto bafafá.


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