Jean Claude Lima

Jean Claude Lima, 57 anos, é publicitário e jornalista, sócio-proprietário da W3OL Comunicação Ltda. Compreende o fato de ser atleticano como uma complementação da sua própria existência e professa essa fé por todos os lugares do mundo onde já esteve ou estará. É pai de uma menininha, Mariana, que antes mesmo de nascer, já esteve no gramado da Arena, e agora de um menino, Rodolfo, batizado com uma camisa onde se lia "nasci atleticano".

 

 

Cada um no seu quadrado

15/08/2009


Em agosto de 2019, estávamos num sábado de sol eu e minha filha Mariana, que havia acabado de completar dez anos, andando pela Baixada visitando o museu do clube, onde todas as imagens, troféus, camisas e tudo mais pertinente à história do Atlético estava cuidadosamente apresentado aos visitantes, atleticanos vindo de todo Brasil. Ela parou diante de uma foto e me perguntou:

- Pai, quem é Mário Celso Petraglia?

Pensei em como responder essa pergunta da melhor maneira possível. Numa fração de segundo, fiz imediata relação com mudança que Petraglia e seu grupo implantaram no Atlético. Títulos e uma final de Libertadores, a Arena que tinha recebido a Copa de 2014, o Centro de Treinamentos e a transformação do Atlético de sapo em príncipe. Mas lembrei que na semana em que ela havia nascido, Petraglia havia proposto a criação da Arena Atletiba. Respondi, então:

- Esse foi o homem que transformou nosso clube filha. Nós sempre fomos uma grande torcida, exatamente como hoje, com história, raça e vibração, mas vivíamos tristes como o Spitz ou a Pitica quando não tem um ossinho depois do almoço.

Spitz e Pitica são os cãezinhos dela. Achei que ficou fácil para entender a analogia. Podia ter dito que Petraglia é um sujeito polêmico mas que todos tinham obrigação de conhecer. Era como um daqueles filósofos ou economistas que estudei nas aulas de Sociologia da UFPR. Gostando ou não das ideias dos caras, tinha que conhecê-los já que era fundamental não só para as provas mas para o futuro. Para a história do Atlético, o cara era mais ou menos isso. Falou em Arena quando nossos estádios eram verdadeiros mocós. Pensou na Copa do Mundo como business bem antes de todo mundo na cidade. Brigou com seus amigos, imprensa e quem mais o desafiou. E meteu o dedo no vespeiro bem grande, quando quis juntar Atlético e Coritiba na gestão de um mesmo estádio de futebol.

Lembro que na época eu pensei como seria essa história. Imaginei um final de semana decisivo para os dois clubes, com as torcidas fervendo como abelhas, se organizando para as partidas decisivas. Como dividiam a mesma área, os confrontos eram inevitáveis. Pensei na inauguração e em como ela seria. Seria um jogo só para as duas torcidas? Ou cada uma faria sua própria inauguração? E se fosse assim, quem ia inaugurar primeiro? E o policiamento? E a divisão das torcidas? E os interesses conflitantes? E a arrecadação com merchandising? Minha filha me puxou pelo braço:

- Pai?

- Diga, filha!

- O Sr. ficou quieto. Parecia quem nem estava aqui.

- É, filha, o pai voltou dez anos no tempo... lembrei da semana em que você chegou e fez de mim o pai mais feliz do mundo.

- Compra uma pipoca?

- Filha... sua mãe não quer que você coma fora de hora!

- Mas pai... você não fala que toda hora é hora de vir na Baixada?

- Falo!

- Então? Faz de conta que também é hora de comer pipoca! Deixa, pai...

Argumentação simples e bestinha, somada a um pedido direto e irrefutável e pronto. Eu tinha ido a nocaute técnico. Danada! Sempre fazia isso comigo.

A história da gestão comum do estádio tinha ido por terra. Aquilo sempre fez parte dos meus pensamentos e mesmo passados dez anos, não tenho a certeza exata se o homem da foto estava certo ou errado. Acho que morrerei sem saber. A única certeza que eu tinha estava diante dos meus olhos, fazendo de mim a cada dia um homem melhor, tolerante com as diferenças, e aprendendo com a minha filha a ser um sujeito melhor. Naquela semana eu lembro que os presidentes dos clubes tiveram que debater a ideia de Petraglia. Na verdade todos tivemos. E cada um ficou no seu quadrado.

Nós ainda demos um circulada aqui e ali, com um pacotão de pipoca na mão. E depois fomos para casa, prontos para explicar para a mãe dela que pipoca na Baixada é tudo de bom.

* Mariana nasceu terça-feira, com 3.7kg e 48 cm. Já entrou na Baixada no Dia Internacional da Mulher ainda na barriga da mãe. Em breve entrará em campo com o nosso time.


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