Daniel Machado

Daniel Lopes Machado, 46 anos, é empresário e consultor em sistemas de informação. Considera os versos da sexta estrofe do hino atleticano, escritos por um ex-jogador, imortalizado em uma espontânea demonstração de amor ao clube, a mais bela poesia de todos os tempos: "A tradição, vigor sem jaça... Nos legou o sangue forte... Rubro-negro é quem tem raça... E não teme a própria morte!" Foi colunista da Furacao.com entre 2008 e 2010.

 

 

Talentos

12/06/2009


Em 2002, o Internacional escapou do rebaixamento na última rodada do Brasileirão, enquanto o Grêmio se classificava para a Libertadores da América. Então ocorreu uma revolução no Beira-Rio, que se fez em silêncio, aos poucos. De lá para cá, o colorado garantiu títulos importantes e 90 mil sócios, formou grandes times, investiu em jogadores renomados, caros e raçudos.

Os argentinos Guiñazu e D'Alessandro jogam muito. Some a eles os zagueiros Índio, que não deu a menor chance a Marcão, e Álvaro, que veio direto da primeira divisão espanhola; Magrão, que é ruim de bola, mas impõe respeito e se aplica com eficiência; o lateral Kléber, símbolo da inversão de sentido no êxodo de atletas de ponta a São Paulo; e o selecionável Nilmar. É um timaço.

Mas existem apenas três clubes no mundo que vivem de marketing e não precisam vender jogadores para fechar o balancete. E o Inter de Porto Alegre certamente não é um deles. Para sustentar o grande elenco atual, foi preciso negociar Alex. E para sustentar o grande elenco que formarão na próxima temporada, será preciso negociar Taison.

Então se faz necessário formar nas categorias de base uma joia rara por ano? A resposta é sim e não. Sim porque esta é a infeliz realidade do futebol brasileiro. E não porque não precisa necessariamente ser uma joia rara.

A questão é: se Taison jogasse em uma porcaria de um time, seria considerado o maior destaque da atualidade? Valeria o que vale? Assim como Taison, existem milhares de meninos tão craques de bola quanto ele, espalhados pelo Brasil, alguns ainda nem sequer descobertos. Mas apenas ele ganhou oportunidade em um time pronto, de qualidade e bem treinado.

Mais um exemplo. Na meia-cancha deste Internacional joga um menino chamado Sandro. 20 anos, volante que erra poucos passes, daqueles que desarmam e sabem sair para o jogo. Pois então. Sabem qual é a diferença entre ele e o Fransérgio?

Nenhuma. Se as duas diretorias, a nossa e a deles, fizessem um acordo, se trocássemos os dois contratos, se Fransérgio fosse para o Inter e o Sandro viesse para o Atlético, sabem o que mudaria? Nada. Fransérgio arrebentaria. Atuando ao lado de Guiñazu e Magrão, amadureceria. Complementaria sua formação técnica, aprenderia que boleiro de sucesso deve suar a camisa, com persistência, coragem e respeito ao clube. Enquanto isso, aqui no Atlético, no meio de tantos desconhecidos e desmotivados, mais cedo ou mais tarde Sandro ganharia uma oportunidade, e então, depois de entrar no meio de tanta fogueira, acabaria queimado, esquecido, treinando em separado, em um convite ao bar e à destruição de seus sonhos.

Assim, jovens promessas evaporaram do nosso Atlético. Até mesmo os atletas que vieram quase prontos aqui não renderam, casos de Morais, Jorge Henrique e Edno. Entregamos todos eles de graça, inclusive a dupla de zaga que nos enfrentará amanhã, Igor e Durval. Hoje, todos representam dinheiro em caixa para os clubes onde atuam. Dinheiro que nos faz muita falta, aliás, considerando que fechamos o ano passado no vermelho.

Pois era óbvio que fecharíamos no vermelho. Não promovemos ninguém. Não vendemos ninguém. Não oferecemos aos nossos jovens talentos sequer as mínimas condições para que desabrochassem.

Fomos enganados pela propaganda da estrutura rubro-negra. Acreditamos na ilusão de que o nosso maravilhoso CT do Caju e a nossa moderníssima Arena da Baixada produziriam e negociariam jogadores profissionais por si sós.

Se quisermos tornar o Atlético um clube saudável financeiramente, e que, ademais, tenha condições de brigar por títulos, precisamos antes rever os nossos conceitos sobre a formação de pratas-da-casa. Para mim, está claro que educação, pistas de propriocepção e centro médico de última tecnologia não bastam. É preciso escalar os garotos como peças importantes, porém não fundamentais, em posições que não comprometam a engrenagem, em um time do qual se orgulhem. Não ao lado de seus amigos, mas de ídolos.


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