Juliano Ribas

Juliano Ribas de Oliveira, 51 anos, é publicitário e Sócio Furacão. Foi colunista da Furacao.com entre 2004 e 2007 e depois entre março e junho de 2009.

 

 

Muleta

18/05/2009


Foi publicado o balanço anual do Clube Atlético Paranaense e, como sempre, rendeu assunto. Mas este ano, em especial, está rendendo mais falatório, em virtude da postura assumidamente coitadinha do cartola-mor do Atlético, Marcos Malucelli. O déficit que o balanço mostra é mais uma muleta para o presidente atleticano se escorar. Pode chamar muleta também de desculpa peremptória.

Antes que o torcedor atleticano se assuste, imaginando que o clube deva em cash essa bolada toda, vamos analisar em breves linhas o que significa realmente parte desse déficit. Por exemplo: foi lançado como gasto, portanto, compondo esse número negativo, a depreciação do patrimônio físico. São quase 4 milhões de reais de depreciação dos imóveis. É norma prever a depreciação imobiliária. São 4% ao ano que se deve aplicar sobre o valor contábil dos imóveis.

Também colocado como despesas, está o valor de 6 milhões de reais, que refere-se a aquisição de atletas, como o Rafael Moura, Julio dos Santos, Wallyson e outros. Poderia ter sido contabilizado como realizável, ou seja, para o término dos contratos, para aí sim, caso o jogador fosse ou não transferido, colocar-se em lucros e perdas. Jogador, no futebol mercantil de hoje, é estoque, é mercadoria. Ninguém considera estoque como um gasto, mas algo passível de lucro. É assim que a maioria dos clubes faz esta contabilidade.

Não sou contador, nem manjo de finanças, mas ao ver esse número do balanço tratei de me informar para saber o tamanho do bicho. E ele não é assim, um monstro. Mas pode ficar. Pode se tornar o Godzilla. Basta a postura “pobre de muletas” continuar a ser explorada pelo nosso mandatário. Ele gosta tanto das muletas que deu até um mimoso nome a elas: “herança maldita”.

Déficit não é falta de caixa. Por exemplo: um empreendedor que abre um negócio, leva em média de 2 a 3 anos para começar a recuperar o investimento. Há dívidas, há credores, compromissos para honrar e pouca coisa entrando. Mas o negócio continua sendo tocado, o dinheiro continua entrando e saindo do caixa. Investe-se no potencial do negócio e procura-se aproveitar as oportunidades.

Quando Mário Celso Petraglia assumiu o clube não tínhamos um par de muletas, mas uma UTI móvel. Mas o que fez Eme-Cê-Pê? Arregaçou as mangas. Algo difícil de fazer para alguém que segura muletas. Naquela época, não havia nem telefone no clube para se ter uma idéia. Nem estádio, nem time, nem auto-estima, só o surrado orgulho de ser atleticano. Não faltavam motivos para dizer que não daria. Mas Petraglia buscou saídas, alternativas. Não foi às cabines de imprensa se justificar. Aliás, Malucelli poderia perder menos tempo dando entrevistas. Mas entendo que queira abrilhantar os veículos de seus amigos, dando-lhes ibope com a presença do presidente do maior clube do Paraná.

Olhemos para o cenário atual. Um clube que tem uma espetacular estrutura, na série A do Brasileiro, com uma competição internacional para disputar no ano e ainda com uma marca forte e credibilidade. Deveria se observar o potencial do clube e trilhar caminhos que busquem o crescimento. Mas não, está se encolhendo o clube, desprofissionalizando as áreas administrativas, reduzindo departamentos importantes como o de marketing, acabando com as parcerias com clubes e centros de formação de atletas, vendendo nossa marca para qualquer merreca que assine o nome nos traseiros de nossos calções, diminuindo tudo com a falsa expectativa de se enxugar custos, sendo que esses custos em comparação às montas que se trabalha no mundo da bola são insignificantes.

A verdade é que ficou muito mais caro se fazer futebol nos últimos anos. Desde a Lei Pelé, ficou muito mais difícil fazer times e obter lucratividade em negociações de jogadores, com o aparecimento de novos players no cenário do futebol, os empresários, os procuradores e representantes de atletas, além de clubes amadores que descobrem e negociam seus próprios atletas para o exterior sem uso de vitrines. Vendas como a do Lucas por estratosféricos 21 milhões de dólares nunca mais faremos. Não por acaso, pouco tempo depois da negociação do Lucas, fomos Campeões Brasileiros.

Todos os custos no futebol subiram, um bom preparador físico, como o Moraci Sant'Anna custa 45 mil reais. No Atlético Paranaense se paga a um técnico mediano a bagatela de 200 mil reais! Tudo isso sem se vender atletas como antigamente.

A maioria dos clubes do mundo está em retração. Prova disso é que caiu o número de atletas brasileiros transferidos para o exterior. Até os clubes do rico futebol inglês estão com déficits astronômicos. Além disso, há a crise mundial, que abateu a todos os investidores do planeta. Mas o déficit impediu o Manchester United, que tem uma alta dívida e viu suas ações despencarem no mercado, de ganhar quase tudo esse ano?

A nossa realidade é bem mais modesta e mais dura que a de um Manchester, mas ao invés de lamúrias, que tal buscar caminhos? Mas trabalhando, focado no clube, não nas cabines de imprensa. Que tal fazer um marketing que olha pra frente, não um que se baseia em fazer camisas do passado ou festas regadas a polenta que cutucam ex-dirigentes? Que tal continuar vendendo o Atlético Paranaense como um clube moderno, profissional e inovador, não como um outro qualquer, administrado de improviso por meia-dúzia de pessoas que se dizem apaixonados pelo clube?

A tendência é esse déficit ficar maior, gente. O mundo está em crise e a única saída é a sustentabilidade, em todos os níveis. A saída é criatividade, inovação, investimento em marca. Pensar menos no varejo, menos em pormenores e buscar saídas em nível macro, não só no mini. Senão transformaremos o nosso Atlético em um mini-clube.

Precisamos recuperar as parcerias, aumentar o Sócio Furacão para no mínimo 100 reais num futuro bem próximo, conseguir um patrocínio à nossa altura (que não é a das nossas nádegas), ter coragem e tamanho, voz grossa e peito inflado para brigar por mais cotas de TV, em que o nosso rendimento chega a 1/5 de alguns clubes e pensar mais, buscar mais alternativas.

O Atlético Paranaense ainda não tem condições de fazer times muito diferentes desse que está aí hoje. O meio pra baixo da tabela do Brasileiro é o que sempre nos espera, o que acontecer além disso é lucro. Essa é nossa realidade. Bem-vindo a ela, Dr. Marcos Malucelli. Durante os últimos anos buscou-se alternativas a ela e tínhamos um ideal grandioso. Hoje não temos mais projeto de crescimento, temos as calças na mão. Ou melhor, as muletas.

Largue as muletas, solte os microfones, arregace as mangas. Não existe mágica, mas como diz o ditado popularesco e politicamente incorreto, desculpa de aleijado é muleta.

Não há milagre, mas levanta e anda, Dr. Malucelli!


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