Daniel Machado

Daniel Lopes Machado, 46 anos, é empresário e consultor em sistemas de informação. Considera os versos da sexta estrofe do hino atleticano, escritos por um ex-jogador, imortalizado em uma espontânea demonstração de amor ao clube, a mais bela poesia de todos os tempos: "A tradição, vigor sem jaça... Nos legou o sangue forte... Rubro-negro é quem tem raça... E não teme a própria morte!" Foi colunista da Furacao.com entre 2008 e 2010.

 

 

O centenário de Leonildo

15/05/2009


Hoje vou contar uma estória. É um pouco longa, mas vale a pena, eu acho. Vale a pena porque é real, porque aconteceu exatamente assim, como vou contar.

Eu e Nilton vamos contar esta estória, na verdade. Várias frases são inteirinhas do Nilton. Então lhes o apresento.

Nilton é um jovem senhor, 75 anos, simpático, que de alguma forma mágica transmite paz de espírito. Um cara que, mesmo se não fosse parte da família, eu gostaria de tê-lo como exemplo. Começou a torcer pelo Atlético em 1948, quando Jackson e Cireno formavam a dupla de ataque. Depois, viu Sicupira e Nilson Borges, Washington e Assis, Kléber e Alex Mineiro. Enfim, mesmo lá de Foz do Iguaçu, acompanha os sopros do Furacão há muito mais tempo do que eu. Só por isso já mereceria meu respeito.

Porém todos os respeitos não expressam a gratidão pela iniciativa de Nilton: uma homenagem ao Levoratto. Tanto eu quanto ele não levamos o sobrenome, mas ao menos garantimos a propagação deste sangue italiano, vermelho e preto, através de nossos descendentes.

Toni, Orlando, Leonildo e Pedro Luiz nasceram no Água Verde e jogaram pelo Savóia (naquele tempo tinha acento). Os três últimos foram convidados a treinar no Atlético e tornaram-se atleticanos. Pedro Luiz, o mais jovem, ficou conhecido como Levoratinho. O irmão Leonildo, ou simplesmente Levoratto, o craque da família, ostentou distintamente as camisas do Atlético e da Seleção Paranaense.

Levoratto conheceu Zinder Lins, outro excelente atacante. Alegre e inteligente, Zinder escrevia versos e os cantava em ritmo de tango para animar as concentrações. Mais tarde, marcaria para sempre seu nome na história ao se tornar autor do hino do Atlético. Construíram os dois uma forte amizade, e Zinder passou a frequentar a casa dos Levoratto, onde conheceu Matilde, irmã de Leonildo, com quem se casou, passando a fazer parte daquela família. Zinder também foi responsável pela conservação de um vasto material histórico relacionado ao clube.

Aos 18 anos, Levoratto já era titular. Participou do campeonato de 1928, quando o Atlético foi vice-campeão.

Em 1929, o Atlético tinha um elenco muito superior aos demais participantes. Contava com os goleiros Alberto e Tércio, os zagueiros Borba e Anjolilo, os meio-campistas Guaxupe, Rosa, Falcini, Mercer, Lourival, Nano e Altino, e os atacantes Marreco, Urbino, Ary, Denizar, Zinder Lins e Levoratto. Após uma virada de 2 a 1 sobre o Coritiba, gols de Marreco e Levoratto, garantiu o campeonato de forma invicta.

Praticamente com o mesmo time de 1929, o Atlético conquistou o bicampeonato em 1930, com mais um triunfo sobre os alviverdes. Apesar da chuva pesada que caía na Baixada e de uma grande confusão entre os jogadores, o placar de 3 a 2, com gols marcados por Zinder Lins, Marreco e Levoratto, sacramentaram definitivamente a superioridade rubro-negra. O título por antecipação fez com que o Atlético nem jogasse a última partida.

Em 1931, ainda com a participação de Levoratto e Zinder Lins, o Atlético terminou o campeonato na terceira colocação.

O ano de 1932 foi um ano de mudanças para Levoratto. Os atletas eram amadores. Tinham que trabalhar durante o dia e treinar no final da tarde. Levoratto trabalhava na Impressora Paranaense. Lá viveu seu primeiro e único emprego, desde a infância até a aposentadoria. É possível que tenha sido influenciado por seus patrões coxas-brancas, e passou a treinar no Coritiba. Ganhou uma bicicleta nova do clube alviverde, provavelmente para compensar a distância entre sua casa e o campo, muito distante, próximo ao Juvevê. A família Levoratto estava dividida: Levoratinho e Zinder Lins defendendo o Atlético; e Levoratto, o Coritiba. Lá permaneceu por algumas temporadas e foi artilheiro de dois campeonatos.

A essa altura, já se firmava o profissionalismo nos principais centros esportivos do Brasil. Antevendo bons rendimentos, os melhores atletas do futebol paranaense passaram a aceitar convites de clubes de outros estados. O Palestra Itália, hoje Palmeiras, foi o destino de Levoratto, onde permaneceu por pouco tempo.

Atleta de baixa estatura, mas muito habilidoso e veloz, Levoratto era caçado pelos defensores. Levou tanta pancada que acabou por sofrer uma grave lesão. Submeteu-se a uma cirurgia no joelho. Os tempos eram outros, e aquela operação o deixou um bom tempo longe dos gramados.

Voltou a treinar no Atlético e foi um dos responsáveis pela conquista do campeonato de 1940. Em 1929 e 1930, Levoratto foi bicampeão jogando no time que tinha Alberto Gottardi como goleiro. Em 1940, a posição era do irmão de Alberto: Alfredo, a “Majestade do Arco”, Caju.

Estava já no final da carreira, mas Levoratto permaneceu defendendo o Furacão ainda na temporada de 1941.

Pelo que fez pelo Atlético, eu e Nilton temos certeza de que Levoratto merece um espaço entre os grandes nomes do passado.

O Coritiba está preparando um trabalho para comemorar o seu centenário e já solicitou informações à família. Provavelmente, irão colocá-lo entre os grandes jogadores que passaram por aquelas bandas.

Mas em 2009 também comemoramos o centenário do nascimento de Leonildo Levoratto. Sabemos que, de onde quer que ele nos ouça ou nos veja, homenagem por homenagem, ele prefere esta, rubro-negra de coração, como ele.


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