Rafael Lemos

Rafael Fonseca Lemos, 49 anos, é atleticano. Quando bebê, a primeira palavra que pronunciou foi Atlético, para desapontamento de sua mãe, que, talvez por isso, tenha virado coxa-branca. Advogado e amante da Língua Portuguesa, fez do Atlético sua lei e do atleticanismo sua cartilha. Foi colunista da Furacao.com de 2007 a 2009.

 

 

Com que roupa?

12/03/2009


Ontem, por força de um Alvará obtido junto ao Juízo da 1ª Vara Cível dos Direitos do Homem Oprimido da Comarca de Curitiba, tirei a noite para me dedicar ao futebol (sim, a Edith se negou a me conceder amigavelmente o Alvará e eu tive de ir à Justiça).

Liberado, assisti pela tevê, em companhia dos bons amigos, à rodada dupla composta pelo clássico Paratiba, na preliminar, e pelo confronto Cianorte X Atlético, como partida de fundo.

Paraná e Coritiba jogaram na Vila Capanema - este, sim, o verdadeiro Estádio dos Aflitos – e proporcionaram uma partida apenas movimentada diante dos 6.000 abnegados que por lá estiveram.

O clássico de ontem nem de longe lembrou os grandes confrontos da dupla ocorridos em meados dos anos 90. O Paraná venceu, porque não tinha outra escolha (era vencer ou vencer); e o Coritiba perdeu, porque não teve o mínimo de organização tática em campo e, no fim das contas, não merecia nem sequer o empate.

Cianorte e Atlético fizeram um jogo bom. O Cianorte venceu porque teve dois atletas que desequilibraram a partida (o meia Felipe e o atacante Elton), isso sem falar no goleiro que estava pegando até pensamentos. De nossa parte, criatividade em baixa, esqueminha tático meia-boca (o Atlético é um time sem repertório tático e sem jogadas ensaiadas) e inspiração próxima a zero.

A arbitragem nos meteu o garfo – grande novidade! – e isso é inquestionável. Ocorre que time grande, quando está bem e quando tem bala, passa por cima do adversário, da arbitragem e do que mais houver como obstáculo. Mas, ontem, não foi o caso!

Essa foi a rodada de ontem para os times da capital e resumindo logo a ópera: o campeão paranaense de 2009 será o Atlético ou o Coritiba, por absoluta falta de adversários que possam oferecer resistência à dupla, mas um e outro, ao erguer a taça, será um campeão de araque, pois nenhum dos times tem elenco que possa receber o adjetivo “Campeão”. Será campeão paranaense 2009 o time “menos pior”, uma vez que “o melhor” não existe!

Feitas essas considerações bem superficiais - e propositadamente superficiais, pois campeonato paranaense não merece muito aprofundamento em face de sua patente insignificância – passo ao que realmente interessa: a vida do nosso Trio-de-Ferro nas grandes competições de 2009.

Por ordem de importância, começo pelo Atlético.

O Atlético, se continuar jogando sem lateral-direita, botando o Lima em campo aos 42 do segundo tempo, fazendo rodízio de goleiros e acreditando que o Zé Antônio vai se converter num novo Alan Bahia - que aos chutões salvou a pátria muitas vezes – poderá até levantar a taça do estadual, mas não passará das oitavas de final da Copa do Brasil e da Sul-Americana. Senhores, vou além: se o elenco que aí está for disputar o Nacional, não tenham dúvidas, iremos para a Série B com quatro rodadas de antecedência.

Em fria análise destes primeiros meses de 2009, temos que: i. De reforço mesmo só o Marcinho; ii. De alegria só os juniores que encararam de igual pra igual, na final da Copa São Paulo, o poderoso Corinthians num Pacaembu abarrotado e só não foram campeões porque o juiz nos meteu o garfo; iii. Inexplicavelmente, nenhum dos nossos garotos foi promovido, embora uns já estejam prontos, a exemplo do Raul (aliás, fica a sugestão para nossas organizadas: estendam uma faixa na Arena com os dizeres “Bota Raul” e vamos ver se alguém promove o menino); iv. Não temos roupa para ir ao brasileirão ou à sul-americana.

O Paraná Clube, por seu turno, tem experimentado uma queda vertiginosa. Depois de conquistar o pentacampeonato estadual entre 93 e 97, ficou nove anos sem vencer o paranaense e a partir de 2007, por trapalhadas de sua diretoria, vem colecionando insucessos que se não forem interrompidos imediatamente vão levar o clube a um estado irreversível de atrofia.

Há tempos, o Paraná vem lutando contra o rebaixamento em todos os campeonatos que disputa e a situação se torna mais grave à medida em que o rebaixamento ronda o time da vila até mesmo no campeonato estadual marcado por ter um nível técnico dos mais baixos e disputado por equipes sem estrutura e sem recursos (financeiros e humanos).

A torcida paranista pode até não gostar de ouvir, mas se o Paraná Clube não se mobilizar atrás de reforços, patrocínio e da profissionalização de seu futebol, a Série C do nacional será o fim inevitável, fruto de tantas e seguidas inconsequências praticadas pelas diretorias do tricolor. O Paraná Clube, atualmente, não tem roupa para freqüentar a Série B do brasileirão. Ainda que não gostem, fica o aviso.

Por fim o Coritiba. O time verde, sob o pretexto de comemorar o Centenário, trouxe o Marcelinho Paraíba com o custo mensal de 155 mil reais, muito além das possibilidades financeiras do clube.

A torcida, eufórica, foi recepcionar o jogador no aeroporto, mas não teve a curiosidade de analisar os fatos com mais cuidado.

Marcelinho ganhará 155 mil por mês num elenco que é remunerado com salários bem mais modestos. Os inocentes - ou patos novos, como diria Antônio Lopes – consomem o "produto" futebol, mas não sabem do que o futebol é feito. Pois bem. O futebol, dentre outras coisas, é feito de vaidade, inveja, fofoca, especulação, traição, política e jogo de interesses. É um meio hostil, é uma selva por que só deveriam se embrenhar os iniciados. Porém os inocentes, mesmo sem nenhuma experiência, resolvem empreender suas jornadas, suas aventuras, suas invencionices e aí é um "Deus nos acuda", aí é um "Seja o que Deus quiser"!

A diretoria coxa é composta de gente pouco vivida nas coisas da bola: patos novos na lagoa de areia movediça. Trouxeram um jogador caro – bem acima dos cofres do clube e eles sabem disso - e não perceberam que isso nunca cai bem no meio da boleirada. Não demorará muito e as resenhas vão ser mais ou menos assim: “O cara ganha 155 mil e eu ganho 15! Ele que resolva!”.

O mundo da bola é complicado e quem é pato velho já percebeu nesses últimos dias que tem carne de alemão fritando no Alto da Glória, tchê. Não demora muito e o Renê Simões desembarca pelas bandas da Ubaldino, pois até hoje tem gente que não engoliu a ida do Ivo para o Cruzeiro isso lá por 2001.

O clima anda pesado no Alto da Glória e os patos velhos da cidade sabem bem que o time verde não tem elenco para voos mais ousados do que o sempre repetido campeonato paranaense, feito sob medida para encher a prateleira da centenária agremiação germânica. O time verde quer ir ao baile do centenário, mas está nu e o Marcelinho Paraíba está cheirando a reedição do famigerado Aristizábal que veio precedido de muita fama, que custou os olhos da cara, mas que pouco fez em prol dos verdes.

Não quero ser o Profeta do Desastre, tampouco um dos Cavaleiros do Apocalipse, mas nossos clubes não estão vivendo dias ensolarados. O Trio-de-Ferro está nu e foi convidado para os grandes sambas. E agora?

É hora de mudar condutas e ir pra luta, enquanto há tempo (ainda estamos em março), porque do contrário o próximo dezembro será desastroso, como têm sido os últimos dezembros, aliás.

E pra servir de inspiração para as mudanças, segue um trecho do belo samba de Noel Rosa intitulado "Com que roupa?": "Agora vou mudar minha conduta, eu vou pra luta pois eu quero me aprumar. Vou tratar você com a força bruta, pra poder me reabilitar. Pois esta vida não está sopa e eu pergunto: "com que roupa?", "com que roupa eu vou pro samba que você me convidou?"

P.S.: Hoje, mando daqui meu fraternal abraço aos amigos Marcelo Osti e Jorge Andrade e Silva, gente boa e cordial!


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