Daniel Machado

Daniel Lopes Machado, 46 anos, é empresário e consultor em sistemas de informação. Considera os versos da sexta estrofe do hino atleticano, escritos por um ex-jogador, imortalizado em uma espontânea demonstração de amor ao clube, a mais bela poesia de todos os tempos: "A tradição, vigor sem jaça... Nos legou o sangue forte... Rubro-negro é quem tem raça... E não teme a própria morte!" Foi colunista da Furacao.com entre 2008 e 2010.

 

 

Beijo na boca é coisa do passado

20/02/2009


É bem provável que a palavra "carnaval" venha de "carnelevale", que significa "adeus à carne" no dialeto milanês. A maior festa popular do Brasil representava uma última chance aos prazeres da vida, pois em seguida viria a punição, o jejum e o sacrifício de quarenta dias.

Só que não precisavam exagerar. Transformaram o carnaval em um "viva a carne". Uma grande orgia devassa. Libidinagem explícita rolando solta. Para usar uma conotação mais corriqueira, trata-se de um grande festival de putaria.

Antigamente, nem tudo eram bundas. Durante os fevereiros de Adoniran Barbosa, até mesmo as relações fugazes carnavalescas tinham o seu requinte. Maria Rosa retratava o primeiro amor em "Vila Esperança", pinçada com certo romance do meio da multidão, entre confetes e serpentinas, ao som das eternas marchinhas.

Mas beijo na boca é coisa do passado. Hoje é um passa-a-mão-aqui-que-eu-passo-aí generalizado. A nova moda é namorar pelado. Funks depravados animam o povão. A piazada desde os quinze, dezesseis anos já bebe lança-perfume (porque cheirar já perdeu a graça) e cai estatelada no chão vomitado.

E assim como o carnaval, os clássicos de futebol também não são mais os mesmos, nem nunca mais serão. Perderam o charme.

Capacidade dos estádios dividida ao meio entre as torcidas, sem separação ou escoltas policiais; um espetáculo esportivo, e não uma batalha da Terceira Guerra Mundial; um evento verdadeiramente democrático, e não de incitações racistas; onde o respeito subjugava a rivalidade, onde a civilidade se sobrepunha à intolerância pelo azul, verde, amarelo ou roxo de uma camisa, onde cada um podia consumir tranquilamente a sua cervejinha. Tudo isso também é coisa do passado.

A nova moda são proibições casuísticas sem causa nem efeito, insensatez, discriminação, pancadarias no terminal, tiros no bairro e os gritos: "ôôôôôôôôôô! A violência voltôôôôôôôôôô! A violência voltôôôôôôôôôô! A violência voltôôôôôôôôôô-ôôôôôôôôôô!"

Então, para celebrar os novos tempos, apesar dos perigos, nada como mais uma incrível patetada da Federação Paranaense de Futebol e um clássico agendado para o domingo de folia.


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