Sergio Surugi

Sergio Surugi de Siqueira, 66 anos, é Atleticano desde que nasceu. Neto de um dos fundadores, filho de um ex-presidente do Atlético, pai e avô de Atleticanos apaixonados, é doutor em Fisiologia e professor. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2009.

 

 

Relaxa e goza

04/02/2009


A frase que já era notória, ganhou fama quando proferida pela então Ministra do Turismo, Marta Suplicy, que com a intenção de minimizar a crise e reconhecendo a incapacidade do Governo, recomendava resignação aos turistas que estavam enfrentando horas e horas de esperas por voos, no auge do apagão aéreo.

No futebol paranaense parece que estamos vivendo algo similar. Foi só uma pesquisa apontar que o time com mais simpatizantes no Estado é na verdade um time paulista, para que os donos de um time da Capital iniciassem um processo de mudança do nome e das cores de sua equipe, criando assim um simulacro do time preferido pelos torcedores locais.

Além da história de sucesso e da boa reputação da família que administra o time ora mutante, chama a atenção de que esta mesma família é proprietária de uma instituição financeira sólida que leva exatamente o nome do nosso Estado e que o seu presidente de honra também preside a associação de clubes que pretende fortalecer o futebol paranaense.

Como explicar então que um time nascido e mantido por gente de fortes raízes nativas, se obrigue a levar em seu distintivo a bandeira de outro estado?

Para que se entenda isso, primeiro temos que retornar no tempo, recordando que no passado existiu um time na cidade de Londrina que se chamava São Paulo e que tinha a camisa e o escudo praticamente idênticos à matriz paulista. Este clone dinossáurico chegou a disputar a primeira divisão do Campeonato Paranaense e depois, por pressão da mídia, mudou as cores e o nome, transformando-se no Paraná Esporte Clube. “By the way”, foi exatamente durante um jogo contra este time, o Paraná, que veio a falecer o Presidente do Atlético, Joffre Cabral e Silva, no final dos anos 60.

O São Paulo pé-vermelho, refletia uma realidade que pouco mudou nestes quarenta e tantos anos. O Paraná sofria e ainda sofre uma fortíssima influência cultural de outros estados e no futebol, apesar de termos tido tanto tempo para perceber e tentar reverter o quadro, a influência continua presente e forte.

No passado até era mais fácil de se explicar e aceitar a conjuntura, pois não havia campeonatos importantes em nível nacional e sendo assim, nossos times raramente rivalizavam com os times de outras praças. Era comum que um torcedor local fosse fanático pelo Atlético no Paraná, Santos em São Paulo e Flamengo no Rio. Não havia conflito interior, pois quase nunca estes times jogavam ente si. Nesta época já era fácil acompanhar através da mídia o futebol de fora, principalmente o do eixo Rio-São Paulo.

Passadas algumas décadas, dois títulos nacionais, um vice-campeonato Brasileiro, outro da Libertadores e a construção de dois grandes estádios na Cidade, sendo um deles –disparado- o melhor do País, percebemos que jugo futebolístico é o mesmo da época do São Paulo Londrinense. Nossos dirigentes, sem contar com a ajuda de uma mídia fraca e sem personalidade, não souberam tirar proveito das conquistas e agora, percebendo que a curra é inevitável, entregam de vez o atestado de submissão com a criação do tal clone corintiano.

Mais do que aceitar a imposição de uma bandeira alienígena no seu escudo, os empresários que trilham o caminho inverso do São Paulo de Londrina, seguem literalmente a recomendação da Ministra Marta e estão gozando com a possibilidade de pela primeira vez em sua história, ter um punhado de torcedores para então adquirir alguma projeção além do Rio Atuba.

Pensando bem, talvez hoje não seja menos fácil entender a criação do time da bandeira paulista. A paixão no futebol perdeu o espaço e atualmente, apesar de persistir firme e forte no coração da galera, está a serviço do dinheiro, tornando secundária qualquer atitude que denote fidelidade a quem ou o que quer que seja.

Nós torcedores dos times paranaenses por enquanto estamos livres das gozações provocadas pelo retorno futebolístico da Quinta Comarca, porém preparem-se para serem ridicularizados quando a criação da quimera, do cavalo de Tróia lugopédico obtiver a publicidade desejada por seus criadores.

Cabe a todos nós, torcedores, dirigentes e mídia, finalmente aceitar e cumprir com a obrigação nunca cumprida, ou seja, valorizar mais as coisas do Paraná e esquecer do egoísmo autofágico e burro que historicamente criaram o espaço para a ocupação cultural.

A luta será árdua, mas a criação do tal Corinthians do Parque Bariguí pode ser o estímulo que faltava para acordar os Paranaenses e fazer com que ocorra uma mudança radical de mentalidade.

Se esta mudança acontecer, estaremos uma vez mais em dívida com a família de empreendedores paranaenses que dirigem o novo time. Se não conseguirmos não nos restará alternativa senão relaxar e gozar.


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