Juarez Villela Filho

Juarez Lorena Villela Filho, 46 anos, é advogado, funcionário público estadual, dirigente de rugby e arruma tempo para acompanhar jogos do Atlético, isso desde 1987. Conhece 49 estádios Brasil afora onde foi ver de perto o Furacão. Sócio desde os tempos do Atlético Total em 1998 e na nova modalidade Sócio Furacão desde 2007.

 

 

Atletiba

02/02/2009


Lela e Tobi, campeões brasileiros

Minha primeira idéia era escrever aqui sobre Atletibas no Couto. A gente queira ou não, Atletiba é lá. Podem fazer Fla X Flu no Engenhão, Corinthians X Palmeiras no interior de São Paulo e levar o BA-VI pro Barradão, mas esses jogos foram feitos para Maracanã, Morumbi e Fonte Nova. Atletiba na Baixada ainda é algo bastante recente, não tem a tradição que um Atletiba no Couto tem. Ainda vi jogos em que um torcedor atleticano ficava dentro de campo para acender a “fogueteira”, esperando o sinal do Bolinha que o time vinha subindo a escada dos vestiários para começar a festa de papel higiênico e fumaça vermelha no meio da galera. Tomávamos conta de toda aquela curva da Igreja do Perpétuo Socorro o que facilitava muito o escoamento e segurança de todos.

Hoje, devido a uma babaquice que infelizmente começou com o Atlético, temos a torcida rival reduzida a 10% da capacidade, gerando um clima de guerra a medo já que a desproporção leva invariavelmente a atos de covardia nas confusões. Muito atleticano deixa de ir ao Couto assim como muitos coxas não vão à Baixada porque sabem que os estádios em dias de clássico são verdadeiras bombas relógio.

Mas infelizmente não poderei tratar desse assunto como gostaria.

Jairo dos vários títulos, Reginaldo Nascimento de centenas de partidas

Também me veio a cabeça a partida bisonha do Atlético ontem. Um time acuado, medroso e que não pensou, dentro da mais de uma hora e meia de partida sequer um minuto em vencer. Me lembrei do raçudo Cocito que disse uma vez que “o medo de perder nos tira a gana de ganhar”. Pura verdade! O Atlético teve uma postura vergonhosa em campo ontem e até mesmo Geninho, ídolo maior da nação rubro negra pisou feio no tomate ontem ao colocar um time extremamente recuado em campo, com medo de ir pra cima do Coritiba, que vamos e venhamos, é tão pobre tecnicamente como o Atlético.

Os primeiros 20 minutos da segunda etapa me lembraram os Atletibas em que Tostão, Chicão, Carlos Alberto Dias e Serginho faziam o diabo conosco. Era um totó de bola, com ao menos o time atleticano tendo brios e raça em tentar se igualar a um time tecnicamente muito superior. Ontem nem isso! Além do banho de bola, em especial o que Netinho levou, nosso time não mostrou a valentia que caracteriza nossa história, se acovardou e mostrou que nas partidas finais do ano passado tivemos ingredientes extras para conseguirmos os resultados.

Esse time aí sem a pressão a que foi submetido, o discurso muito mais motivador do que propriamente técnico de Geninho e principalmente sem os gordos bichos que estavam sendo pagos para escaparmos do rebaixamento, é fraco demais, um arremedo de time e que necessita o quanto antes do reforço de dois ou três que cheguem como Marcinho, para resolver. A insistência em quem não produz ou com jogadores que há anos atrás não engraxariam as chuteiras de Alex Mineiro, Washington, Kléber ou Paulo Rink como Julio Cesar é que não dá mais. Lima e Marcinho precisam ser titulares e Chico e Rhodolfo são a prova de que talento não tem idade, por isso Raul e Fransérgio tem que ser testados o quanto antes e vestirem a camisa do time principal, já que o Atlético vende que é uma beleza, mas reclama para comprar dizendo que o “mercado está inflacionado”.

Poderia me alongar mais nisso, mas infelizmente tenho que tratar de outro assunto.

Tuta do gol do título, Aladim um símbolo

Pouco antes do intervalo da partida, na divisa das torcidas no anel inferior, entre as sociais do Couto Pereira e a massa atleticana uma cena bizarra aconteceu. Pior de tudo, mais uma vez com vistas grossas e conivência da Polícia Militar do Paraná. Um torcedor do Coritiba, bem aquele estereótipo de torcedor alviverde, gordo rosado, tipo o Presuntinho do Tiny Toon, ofendeu atleticanos com provocações racistas. Não satisfeito apontava para a sua pele alva e chamou claramente para quem quisesse ouvir, em especial os policiais que estavam na divisa de torcida que nós atleticanos éramos “uma torcida de merda, de crioulos, macacada que tinha que voltar pra jaula, negrada FDP”. Claro e cristalino. Havia três atleticanos negros por ali e um deles pelo jeito já deve ter sofrido alguma discriminação com relação a sua cor da pele e saiu indignado, quase chorando principalmente em perceber que logo após os rubro-NEGROS que estavam por perto se revoltaram, exigiam a pronta prisão do infrator que ainda ficou um bom tempo fazendo ofensas gratuitas até que um policial chegou para conversar com ele.

Semi satisfeitos achamos que no mínimo o boçal torcedor iria para a triagem. Que nada! Sorridente e ainda ofendendo a raça negra foi levado pelo policial para o mesmo setor do estádio, mas longe da divisa. A Lei 7.716 de 1989 é clara em seu artigo 20, copiado integralmente abaixo:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)
Pena: reclusão de um a três anos e multa.


Havia o flagrante, havia testemunhas e o imbecil ficou vendo o jogo e hoje está livre, talvez se vangloriando para as amigos do feito de ontem. Uma pena. Assim como é uma pena que nossa imprensa se cale com coisas assim, como se calou ano passado quando o jogador vascaíno Carlos Alberto, então no Botafogo foi vítima de preconceito racial também nas sociais do Couto ao ser substituído e chegou a prestar queixa em delegacia de nossa capital. Curioso que menos de 20 dias depois houve um problema semelhante com jogadores negros do Corinthians em Caxias do Sul contra o Juventude e os maiores veículos de comunicação do Paraná deram destaque.

O que aconteceu ontem foge da esfera desportiva, está relacionado à esfera criminal. Assim como torcedores, quer sejam atleticanos ou coxas que brigam e depredam o patrimônio público a quilômetros de distancia dos estádios sendo que muitos deles sequer vão aos jogos não podem ser considerados infratores na esfera desportiva e sim na criminal.

Odiosa a ação do racista torcedor ontem dentro do estádio e reprovável a omissão da polícia militar. Em dias em que a humanidade festeja e torce pelo sucesso de um negro que se tornou o homem mais poderoso do planeta e que sabe que suas decisões podem mudar o rumo do mundo moderno, vermos dentro de nosso quintal tamanha baixaria, tamanha falta de noção, tamanho preconceito explícito e que não foi devidamente combatido é demais.

Um clube centenário e que teve alguns de seus ídolos e jogadores importantes negros como os que citei neste texto merece torcedores um pouco mais civilizados e que saibam que as diferenças existem sim, mas devem no mínimo ser respeitadas. Me orgulho mais ainda em pertencer a uma torcida livre desse tipo de gente, a verdadeira torcida do povão, a torcida de um clube que nasceu aristocrata, mas forjou sua história de lutas, dificuldades e glórias com o sangue e o suor de negros, brancos, índios, orientais, polacos e tudo mais. O Atlético e seu povo mostram sua grandeza mesmo em pequenos atos.

ARREMATE

“Viva Zapata!
Viva Sandino!
Viva Zumbi!
Antônio Conselheiro!
Todos os panteras negras”
MONÓLOGO AO PÉ DO OUVIDO, Chico Sciense


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