Sergio Surugi

Sergio Surugi de Siqueira, 66 anos, é Atleticano desde que nasceu. Neto de um dos fundadores, filho de um ex-presidente do Atlético, pai e avô de Atleticanos apaixonados, é doutor em Fisiologia e professor. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2009.

 

 

Coisas que só acontecem com os outros

01/09/2008


Assalto, ataque cardíaco, câncer e ver o time do coração ser rebaixado são coisas que só acontecem com os outros. O ser humano deve ter algum tipo de arcabouço psicológico que o faz comportar-se como imune a todas as desgraças da vida. Infelizmente e de vez em quando a razão nos mostra que esta sensação é falsa.

Ontem, após o jogo e após a entrevista de nosso treinador, acabei também eu caindo na real. Estamos a caminho da série B. O clima era de resignação, de consciência de que nada mais existe a ser feito. Até um suposto suplício a que os jogadores teriam sido submetidos até agora, foi citado como justificativa para a demora na reação dentro de campo.

Enfim, há que se conformar. Alguns acham que mais um fracasso afetará as eleições previstas para o fim do ano e que mudanças radicais virão. Outra bobagem. Não aparecerá nenhum candidato disposto a tocar o Atlético segundona afora e se aparecer perderá as eleições para os atuais diretores. Não existe oposição a esta diretoria, aliás, não existe oposição no Atlético desde 2001. Ouso adaptar o pensamento de Francis Fukuyama ao reconhecer a supremacia dos Estados Unidos após o fim da guerra fria e afirmo que no Atlético a História acabou.

E neste ponto do texto, o leitor já irritado com o meu realismo, perguntará: e você? O que fez ou pretende fazer para ajudar?

Não fiz muito, mas talvez o que podia. Associei-me ao clube e hoje, além de duas cadeiras em meu nome, financio outras duas, para os meus filhos. Logo após a perda do título para os coxas, fui à Assembléia Geral dos Sócios e incentivado pelos discursos dos diretores, acabei auto-propondo meu nome para integrar o Conselho do Atlético. Outra inutilidade, pois em primeiro lugar não estou certo de que atualmente o Conselho do Atlético sirva para alguma coisa, já que não o vejo atuar nos momentos críticos; em segundo lugar porque se ele atua, mais desqualificado estaria eu para o cargo, já que teria que admitir não conhecer o funcionamento do Nobre Colegiado. Por fim, em terceiro lugar porque que eu saiba, após vários meses, nenhum dos vários sócios que como eu também propuseram os seus nomes, foi chamado a integrar o Conselho. Segui escrevendo minhas modestas colunas, com também modestos palpites para tentar evitar o pior. Numa delas, logo após o Atletiba do primeiro turno, pedi a saída do treinador, pois já havia percebido a sua inadequação aos propósitos de grandeza apregoados. Infelizmente só fui ouvido dezoito pontos e sabe lá quantos suplícios mais adiante.

Para mim chegou o momento da resignação. Setembro já chegou e o aroma doce da primavera chama à renovação. Tenho meus filhos Ana Bia, Serginho e Ana Helena, meus netos Ana Luiza, Cadú e Gabriel, e agora também a Giovanna, minha quarta e já Atleticana filha que deve chegar em Dezembro. Tenho meus alunos, minha profissão e minha Universidade, mistura de lugar de trabalho e de prazer. Para que mais?

A fisiologia e a patologia humana nos ensinam que o estresse joga no nosso corpo um monte de substâncias que provocam grandes danos à saúde. Já a filosofia nos aconselha a aceitar aquilo que não podemos mudar. Podem me chamar de pessimista, mas acredito que já fiz o que podia fazer e deste ponto não pretendo passar. O Atlético não vai me estressar.

Afinal, não quero que aconteça comigo aquilo que só acontece com os outros.



Dedico este texto aos meu antigos e grandes amigos, Edmond e Daniel Fatuch, Jô Formighieri, Julinho "Bala" Araújo, Migue Meister e Henriquinho Lens César, companheiros e vizinhos de cadeiras na Baixada.
Ver o Atlético jogar não tem me dado prazer, mas ir ao estádio tem sido e continuará sendo uma ótima oportunidade de dar boas risadas e de curtir o convívio com gente de quem eu gosto.



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