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Jones Rossi
Jones Rossi, 46 anos, é repórter do Jornal da Tarde, em São Paulo, e um dos fundadores do blog De Primeira. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2008.
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Tudo que é sólido desmancha no ar
26/02/2008
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A iminente saída do volante Claiton do Atlético, um dos poucos ídolos do time em uma época de absoluta escassez da espécie, representa mais um passo da inexorável caminhada rumo ao fim do futebol.
O Atlético Paranaense, um dos principais clubes de uma das maiores economias do mundo, deve perder Claiton para um time japonês que ninguém conhece. Inútil recapitular a ladainha sobre a organização do futebol brasileiro, o que não se aplica no caso. Mesmo quando formos mais organizados e mais ricos deveremos continuar perdendo jogadores.
Talvez o Atlético perca mais dinheiro com essa transferência do que se fizesse um sacrifício para mantê-lo. Há uma sensação de descontentamento e desânimo por parte da torcida em relação à saída de Claiton. É como se, depois uma noite perfeita, acordássemos de ressaca, tivéssemos que vestir o terno e ir trabalhar com dor de cabeça. E isto certamente significará menos sócios-torcedores, conseqüentemente menos dinheiro.
O que também não vem ao caso, já que especulo e é difícil medir este tipo de impacto financeiro. Mas já passou da hora de repensarmos que tipo de futebol queremos, o tipo de clube que desejamos para o futuro. Se em 1995 o Atlético deu um grande passo que o colocou na frente de todos os rivais locais e solidificou sua posição entre os maiores do Brasil chegou a hora de descobrir qual será o próximo passo.
Não discuto aqui métodos organizacionais, clube-empresa, parcerias, dinheiro. O próximo passo no futebol será filosófico. Tem a ver com a essência de um time de futebol, coisa que ultimamente só vislumbramos em fotos em preto e branco amareladas. Tivemos uma overdose nos primeiros meses de 2008. O Furacão voltou, como um anacrônico renascimento daquele time de 1949, um sopro de autenticidade e verdade futebolística em meio a clubes-empresa montados de última hora, ou times formados por mercenários que vivem com a cabeça no próximo contrato, frankensteins futebolísticos sem alma. Mas este Furacão já se foi.
E aos poucos perdemos a fé no futebol. O beijo no escudo foi maculado, o discurso do jogador não diz nada, na era do “créu”, ingênuo é aquele que joga por amor. Até o choro agora é ensaiado, a dor tão fingida que o fingidor nem dor deveras sente, anti-parafraseando Fernando Pessoa. A poesia foi negada, e quando digo poesia não falo de futebol-arte. Falo de um Atletiba da Gripe, falo de um jogador igual a Cireno, igual a Nilo.
A grande modernização do futebol será voltar às origens. Não agüentaremos muito mais tempo sendo apunhalados pelos nossos ídolos, muitas vezes criados artificialmente simplesmente porque não nos resta mais ninguém. Projetamos nos jogadores o amor que temos pelo clube, e aí falo de qualquer clube, não só do Atlético. Vemos qualidades imaginárias onde elas não existem, damos dimensão maior a frases feitas, declarações vazias de lealdade ao clube e à torcida.
Nelson Rodrigues já escreveu que um dia ao Flamengo não seriam necessários jogadores, comissão técnica, nem mesmo torcida. Apenas a camisa hasteada sobre a trave bastaria por si só. Tudo o que um clube tem é sua camisa. Um clube de futebol pode abdicar de tudo, menos de sua camisa. O Atlético já viveu sem estádio, ficou sem títulos, jogou sem torcida, mas sempre teve em sua camisa rubro-negra o registro de sua alma. É ela que dá sentido à existência do clube por representar nossa história, nossos jogos, as vitórias, derrotas, alegrias e tristezas. Mas é preciso quem a honre. E estamos perdendo isso.
Precisamos de mais Nilos, Cirenos, Gotardis, Júlios. A idéia não é voltar para o amadorismo. A idéia é fazer um time formado apenas por atleticanos. Gente que saiba a importância de cada folha de grama do Joaquim Américo. Gente que não se conforme em ver o Atlético perder, que troque 30 milhões de euros do Real Madri pelo prazer de vencer o Coritiba, que troque Milão por um jogo em União da Vitória, que comece, viva e termine sua carreira no Atlético. Gente como você e eu.
Não é uma escolha fácil, mas é necessária. É uma escolha que implica não termos os maiores craques do Brasil todo ano (os temos por acaso atualmente?), mas, quando os tivermos, saberemos que não nos deixarão. E estaremos no estádio, celebrando não só o Atlético, mas a essência do futebol. Tudo então valerá a pena.
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