Jones Rossi

Jones Rossi, 46 anos, é repórter do Jornal da Tarde, em São Paulo, e um dos fundadores do blog De Primeira. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2008.

 

 

A imprensa a serviço da ignorância

14/02/2008


Talvez seja a explosão dos estagiários nas redações, a má formação escolar e universitária ou simplesmente burrice, preguiça e falta de informação, mas o jornalismo esportivo brasileiro nunca foi tão indigente. Para tirar a prova basta comprar o Lance!, assistir qualquer programa esportivo ou abrir os grandes portais da internet: o jornalismo esportivo acabou.

A tônica agora são matérias engraçadinhas ou simplesmente bobas, como esta. A opinião idiota de um jogador do Flamengo vira notícia com chamada na capa. Se não bastasse por isso, a notícia é totalmente irrelevante, não se sustenta. O GloboEsporte.com, que tem iniciativas legais como o blog Bola nas Costas e o Futebol 2.0, que analisa as principais jogadas da rodada, é cheio dessas notas inúteis. Entrem lá agora e comprovem. Outros portais não ficam atrás. O IG está entre eles, principalmente por usar material de terceiros.

O Lance! é um caso emblemático pela postura adotada em favor da moralização do futebol. Mas se o Lance! servisse de exemplo pro futebol brasileiro, todos os clubes teriam jogadores dos juvenis na equipe principal, e não receberiam o dinheiro devido a não ser que fossem na justiça. A ótima proposta de um jornal de esportes caiu por terra na feitura do diário. Não se vêem reportagens no jornal. É tão mal escrito que chega a ser hilário. Outro dia li que "coincidentemente" Perea estreou no mesmo jogo que Roger, no Grêmio. Fico imaginando como alguém pode estrear "por coincidência". Só no Lance!...

O Lance! não tem o monopólio do fim do investimento em reportagens. Não se vê mais, com exceção da Folha de S. Paulo, tão criticada pelo excesso de números em suas páginas esportivas mas sem dúvida o melhor caderno de esportes do País, grandes reportagens sobre futebol. Foi preciso o inglês Alex Bellos vir ao Brasil para desencavar boas histórias sobre o futebol brasileiro.

Impera também o jornalismo declaratório. Técnico Fulano diz qualquer merda e lá vão os repórteres repercutir com o técnico Beltrano, criando uma crise artificial e retro-alimentando manchetes vazias. Esta prática se espalhou de forma rápida. Agora qualquer frase de qualquer jogador vira notícia. Jornalismo também significa não dar notícias, principalmente quando elas não se encaixam nos requisitos básicos do que se pressupõe ser uma notícia: novidade, relevância, ineditismo e interesse público.

As críticas que fiz acima servem também para os leitores, que estão cada vez mais passivos em relação ao que é noticiado. Só reclamam quando acham que seu time foi ofendido ou algo que o valha. Virou moda leitor exigir que seu time seja adulado o tempo todo e ficar nervosinho quando isso não acontece. Jornalista, tirando a banda podre, não deveria adular ninguém, nem aceitar tudo que jogadores, técnicos e dirigentes dizem.

Por causa do mau jornalismo que hoje domina portais, TVs e jornais (é só ver como o Corinthians e Flamengo são tratados sempre com base nos critérios de vendagem e audiência, quase nunca jornalísticos) criou-se uma falsa idéia de como a imprensa deve se portar em relação aos clubes: condescendentemente. E também pela péssima qualidade dos jornalistas, que criticam clubes e técnicos (Leão é realmente perseguido pela imprensa por ser turrão) baseados em rixas pessoais e geralmente o fazem baseados em fatos vazios, que não se sustentariam em outras editorias como Economia, Política ou Cidades.

Em breve iniciarei no meu blog De Primeira uma série de entrevistas com os principais jornalistas esportivos do País e com os diretores de redação dos principais veículos. Vocês podem dar sugestões de entrevistados pelo formulário aqui da página.


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