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José Henrique de Faria
José Henrique de Faria, 74 anos, é economista, com Doutorado em Administração e Pós-Doutorado em Labor Relations nos EUA. Compareceu ao primeiro jogo do Clube Atlético Paranaense em 1950, no colo de seu pai. Seu orgulho é pertencer a uma família de atleticanos e ter mantido a tradição. Foi colunista da Furacao.com entre 2007 e 2009.
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Nada é perfeito
05/02/2008
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Nada é perfeito na vida, mas 2008 começou muito bem. Pessoalmente, entrei para aquele seleto clube dos avós. Filha de meu filho Alexandre e de minha nora Josiane, chegou no dia 25 de janeiro, em Florianópolis, minha neta Estela, a mais nova torcedora do Atletico Paranaense da familia. Da boutique da Arena vieram muitos presentes. Camisetas, sapatinhos e outras lembranças. Da tradição, uma camisa tricotada que já foi usada pelos meus quatro filhos. E Estela chegou com uma boa estrela. Furacão 100%.
Retornando de férias, muitas boas surpresas. Como sabíamos, manutenção do Ney Franco, do Walter, do Maculan, da equipe de 2007, da promoção cuidadosa da base. Algumas contratações interessantes, como a do meia Irênio e de outras que ainda não estrearam. Mas, e sempre existe um “mas”, a promessa de uma solução para as laterais ficou na promessa. Foram cogitados, na mídia, dois atletas, que não foram contratados. Todos sabemos que não se pode contratar por contratar, mas sabemos também que estas posições estão carentes. Para a surpresa de todos, o Jancarlos voltou a ser o que era. Melhorou nos fundamentos. Torço para que este desempenho não seja devido à fragilidade dos adversários e que este jogador tenha mesmo evoluído, pois ele merece este espaço.
Na ala esquerda, após frustradas experiências, Ney Franco preparou Netinho para ocupar a posição. Li, dia destes, a seguinte manchete: “Netinho jogará improvisado na lateral”. Não foi o que aconteceu. Ney Franco foi claro a este respeito. O jogador foi preparado, para não ser “queimado”. Confesso que no jogo contra o ADAP Galo gostei de vê-lo jogar por ali muito mais do que pelo meio. Pela forma como jogou, pelos deslocamentos, senso de cobertura e ocupação de espaço, não me parece que tenha ocorrido um improviso. Mas, não há um substituto ou um jogador de ofício na lateral.
No conjunto, apesar da boa fase, dos excelentes resultados, das alegrias, não posso deixar de dizer que tenho minhas dúvidas sobre o time para um campeonato brasileiro ou uma Copa do Brasil. Espero estar equivocado, todavia não sei se os reservas podem substituir os titulares com a mesma qualidade. Pode ser, mas de fato não sei. Exceto um ou outro, não os vi jogar.
Mudando de sardinha para batata frita, era bom demais para ser verdade. O que era um boato virou uma realidade. Business is business. Quando o boato é a contratação de um grande jogador, pode-se ter a certeza de que é um boato. Mas, quando o boato é sobre a venda de um bom jogador, pode-se ter a certeza de que não é um boato. “Tomara que fosse verdade” disse o Presidente do Conselho Deliberativo. Era verdade, só não estava “formalizado”. É uma questão de interpretação ou de detalhe legalista. Tomara que não fosse verdade, mas Ferreira foi emprestado por 120 dias com opção de compra. Poderá voltar para o brasileirão, porém alguém acredita na volta? Só se der zebra! Ferreira, ao se tornar peça chave no time do Atlético Paranaense, tornou-se, ao mesmo tempo, uma mercadoria. No mundo dos negócios do futebol, money is the goal. Tudo em nome do profissionalismo. Alega-se que seu contrato vence em dezembro de 2008 e que agora é a hora de negociar. Se este fosse o motivo Ferreira não teria sido emprestado. Emprestaram para ver jogar? Mas, Ferreira sequer foi observado pelos “investidores” do Al-Shabab? Os árabes, que há tempos vêm contratando jogadores de expressão, fizeram um empréstimo de risco em um jogador de seleção, para ver se o mesmo serve para o futebol dos Emirados Árabes Unidos? Quem consegue acreditar nesta história? Falta transparência nas atitudes no Atlético Paranaense e não é de hoje. Tudo corre em segredo de estado. Sábado, na Arena, entrevistado pelo repórter Osmar Antonio, da Banda B, Maculan disse que não sabia do negócio com Ferreira e que se houvesse algo era uma decisão da direção e que ela a comunicaria. Inacreditável.
O Brasil era fornecedor de matéria prima para a Europa exploradora na era dos descobrimentos, em pleno mercantilismo. O pau brasil foi o símbolo desta exploração. Depois, foram o ouro, a prata e as pedras preciosas, com o que Portugal pagava suas dívidas externas especialmente com a Inglaterra. A mudança de colônia para país mudou o status do Brasil, mas as relações internacionais continuaram a ser perversas conosco. Recursos naturais abundantes, força de trabalho barata, energia de baixo custo, grande área para a agricultura e a pecuária (de baixo valor agregado), entre outros, foram fatores importantes para conter o desenvolvimento do país. Atualmente, o Brasil exporta produtos industriais competitivos, desenvolve tecnologias e ciência, mas ainda continua no mercado de commodities (grãos, etc.), e está firme no mercado de novos “profissionais” do sexo (“dançarinas” e “dançarinos” de “clubes” e profissionais da noite ao ar livre) e de atletas de várias modalidades para serem exibidos nos novos “circos romanos”. Sim, exportamos pessoas como mercadorias. Sei que o que eu digo incomoda a muita gente que acredita que a “venda” (vejam só como se chama o negócio) de um jogador é “bom para todo mundo”. Para o clube que “compra”, para o que “vende” e para o jogador (a mercadoria). Mas, a “venda” tornou-se um negócio que exclui totalmente os torcedores brasileiros, que ficam com as sobras, enquanto o centro do sistema de capital fica com o recheio. O nosso recheio. O Brasil fica sem os seus artistas, seus atletas, pois estes são coisificados para exportação. Certo, vão dizer que Ferreira também foi importado da Colômbia. Mas, não há termos de comparação. O fluxo de jogadores não é o mesmo que sai daqui do Brasil e da América Latina em geral e da África para a Europa, Ásia e para o Oriente.
Vejamos, por exemplo, o caso do Milan. Somente o jogador Kaká, pelo que se noticia, recebe cerca de US$ 20 milhões por ano. Quanto custa manter o time todo? Certamente, não é apenas com a renda dos jogos e nem com a dos sócios. É também com patrocício, com as cotas de TV, etc. Aqui, os patrocínios são pífios e as cotas de TV ridículas. No campeonato paranaense, por exemplo, a RPC ofereceu muito menos que a RBS pelo Gauchão. Por que? Certo está o Atlético Paranaense em não aceitar migalhas, por mais que seja difícil para os torcedores. Daí, ao final, sobra o que? Venda de jogador. Ninguém gostou do negócio realizado com Ferreira. Perdemos um dos melhores jogadores que já passaram pelo Atlético Paranaense. Não vem ao caso se ele não seria necessário no Campeonato Paranaense devido à fragilidade dos adversários. Este não é um bom argumento. O fato é que, independente do campeonato que fosse, Ferreira iria ser transferido para outra equipe, pois, afinal, bussines is bussiness.
Finalmente, depois de marchas e contra-marchas, erros e acertos, teimosias e flexibilidades, eis que a diretoria do Atlético Paranaense apresenta uma proposta bastante avançada em termos de formação do quadro associativo. Pode até ser que a mesma venha a ser aperfeiçoada no futuro, especialmente com a conclusão da Arena, pois nada é tão bom que não mereça ser melhor. Mas, convenhamos, foi um grande avanço e não há motivos para que um grande número de torcedores deixe de se associar. Compreendo que com o valor do Salário Mínimo tão insignificante e com a renda média do brasileiro tão baixa, muita gente não possa contribuir. Mas, ao mesmo tempo, não acredito que não haja, em Curitiba, 10.000 a 15.000 pessoas que não possam adquirir pelo menos 20.000 cadeiras. Se não houver empenho em ajudar, depois não haverá legitimidade para reclamar. Todas as cadeiras vendidas não impedirá a diretoria de “vender” um outro bom jogador que represente um bom negócio, pois negócios são mais importantes que o desempenho do time, mas, pelo menos, dará à torcida, agora composta por sócios, direito e legitimidade para cobrar posições.
Perdoem-me a volta ao parágrafo inicial, mas não posso encerrar esta primeira coluna de 2008 sem um beijo carinhoso em minha neta Estela, uma estrelinha que um dia vai ler o que escrevi, vestida com as cores sagradas do Clube Atlético Paranaense, herança de muitas gerações da família, que ela terá a missão de continuar a preservar.
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