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Rafael Lemos
Rafael Fonseca Lemos, 49 anos, é atleticano. Quando bebê, a primeira palavra que pronunciou foi Atlético, para desapontamento de sua mãe, que, talvez por isso, tenha virado coxa-branca. Advogado e amante da Língua Portuguesa, fez do Atlético sua lei e do atleticanismo sua cartilha. Foi colunista da Furacao.com de 2007 a 2009.
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Viva Betraglia!
11/01/2008
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Em atitude pioneira, meu querido Chefe, Rafael Lemos - advogado, poeta, ex-professor, ex-modelo de fama quase intermunicipal e pessoa especial - designou-me para fazer a cobertura, lance a lance, da estréia do time verde, no Campeonato Paranaense 2008.
Atitude pioneira e corajosa, mesmo porque Jornalismo é isso: isenção e independência (ou deveria ser isso). A gente é atleticano, mas cobre o time verde, em nome do profissionalismo, da boa informação e do deboche, no mais das vezes. E como ordens é ordens, eu, Walter Ego, fui até lá para cumprir a minha missão e assim o fiz, conforme segue no relato abaixo.
Momento zero: Anunciaram a execução do hino do Brasil e do hino do Paraná. Um senhor, que estava na minha frente, protestou: “Vão tocar o Hino do Paraná? Mas e o Hino do Verdão? Eles não vão tocar?” – mas logo foi contido pelo sorveteiro que esclareceu ser o hino do Estado do Paraná, e não do time do Paraná, até porque o Paraná, até onde se sabe, não tem mais time.
Desfeito o equívoco, a bola se preparou para rolar no Alto da Glória, conhecido também como Pinga-Mijo, Gionédis Arena, Tremendão e Tomara que Caia. O Iraty adentrou o gramado sendo saudado pela correria frenética de dois quero-queros.
Depois, entrou o time verde e foi ovacionado pela torcida “Sai do chão, sai do chão, é a torcida do verdão” e foi aquela salva de beijos e foram aqueles estalidos. Coisa horrorosa!
Daí começou o jogo (jogo é o modo de dizer. Já que não posso escrever “começou o concerto”, escrevo “começou o jogo”).
1.º Tempo:
4 min: Hugo tentou cruzar pelo time verde, e Paulo Miranda tirou como deu, de cabeça;
5 min: Muita correria e vários passes errados foram a tônica no início de partida;
6 min: Ricardinho alçou bola na área e Élder ficou com a pelota sem dificuldades;
9 min: Na sua primeira descida ao ataque, o Iraty chegou com Ricardinho, mas o assistente marcou impedimento (assistente malandrão!!! Olho vivo nos homens do apito, povão!!!);
11 min: Ridículo! Ricardinho passou pela marcação e cruzou, porém a batida na bola foi muito ruim e saiu pela linha de fundo;
17 min: O jogo seguiu sem grandes emoções, apesar da vontade demonstrada dos dois lados. Começou a garoar no Couto Pereira (Ai, que medo. Se isso vira chuva, tô lascado!);
19 min: Seu Ataliba, o turco mais safado da Rua Pedro Ivo e que convidara a Cris para ir com ele ao jogo, começou a se atirar para cima da moça. A Cris – coxa-branca doente e muito da gostosinha – sacando a intenção do Ataliba, fez que não era com ela, mas tava louca pra cair nos braços – e nos bolsos - do canalha. “Pára, Ataliba!” – dizia a moça quase que num sussurro. O turcão, mais excitado do que filho de viúva em loja de brinquedos, falava perto do ouvidinho dela, com aquele sotaquezinho das arábias “Nóis bromete que vai vazer só o que Cris quiser. Nóis resbeitador. Nóis direito”;
24 min: A iniciativa em busca do gol era do time do Gionédis – O Eterno - mas o Iraty apostava na marcação e na velocidade dos contra-ataques para chegar ao gol;
25 min: Seu Ataliba tirou cincão da carteira, chamou o sorveteiro, comprou um dolé de limão e – olhando fixamente para dentro dos olhos da Cris – emendou “Uma chubadinha você dá, né?”. “Pára, Ataliba! Eu sou moça direita” – disse a moça quase que num convite (dizer não é dizer sim; como ensinou Paula Toller);
32 min: Disperso no setor ofensivo, o coxa tirou o pé do acelerador e não levou mais perigo. Do outro lado, Édson Bastos não era exigido. Um jogo ruim de se ver. Um guri ao meu lado começou a se queixar de ardência nos olhos. O pai do guri – não sei se consolando ou constatando – exclamou “Jogo do coxa é assim mesmo!”;
33 min: Seu Ataliba tirou cincão da carteira, comprou um pãozão com lingüiça e - olhando fixamente para dentro dos olhos da Cris – emendou “O ponta do lingüição você morde, né?”. “Pára, Ataliba! Eu sou moça direita. Olha que eu vou embora” – censurou a moça como se dissesse “Me leva, me leva que eu te quero, me leva”;
36 min: Seu Ataliba olhou pro céu, abriu um sorriso e pensou “É hoje! Hoje nóis vai botar o giripoca pra biar!”;
43 min: Gol do time verde! Em um contra-golpe mortal, Felipe lançou para Dinei, livre, dominar e bater na saída do goleiro Élder. A Cris se jogou nos braços do seu Ataliba. Seu Ataliba deu um grito tão efusivo que todo mundo acreditou que ele era o coxa-branca mais fanático da face da Terra. A Cris se encantou. Metade do caminho estava andado;
46 min: Dinei foi expulso da partida! Na comemoração do gol, Dinei levou cartão amarelo, e ao fazer uma falta, tomou o segundo amarelo e acabou expulso de campo;
47 min: Fim do 1.º tempo (Graças a Deus)!
Intervalo de tortura em forma de futebol: Walter Ego – este que hoje vos escreve – aproveitou o intervalo para ir ao banheiro que, no estádio Tremendão, corresponde a dar uma boa xixizada em alguma das colunas que, bravamente, resiste ao tempo e ao descaso da diretoria esmeraldina, mas nada esmerada.
Na saída de campo, Dorival Júnior teve de acalmar os jogadores do Coxa, revoltados com a expulsão de Dinei e com a fome que se abateu, há tempos, sobre a equipe verde. A torcida também não escondeu a revolta nas arquibancadas e exigiu sanduíches de mortadela para o elenco aos gritos de “Ei, Cirino, enfia a mortandela nos menino!”.
Veio a metade que faltava.
2.º Tempo:
2 min: Quase a casa cai. Diogo entrou na área e rolou para Ricardinho que chutou forte, mas Édson Bastos fez boa intervenção;
3 min: Airton levantou bola na área coxa-branca e Gilson subiu livre, mandando para fora, e quase que a casa caiu, uma vez mais;
4 min: Nos camarotes, Cirino se ajoelhou, olhou pro Céu e pediu para Deus ao menos um empate;
5 min: O Azulão mudou a postura para a etapa final de jogo e começou a fazer o camisa 1 do time verde trabalhar. No banco de reservas, o técnico dos verdes mandou os atletas para o aquecimento. Dois deles desmaiaram de fome. A torcida voltou à carga, aos gritos de “Ei, Cirino, enfia a mortandela nos menino!”;
10 min: Édson Bastos salvou a lavoura! Ricardinho mandou uma bomba, o goleiro fez boa defesa, e na continuação do lance Gilson não aproveitou o cruzamento de Ceará. O time verde escapou por milagre! Porém não é todo dia que tem milagre;
16 min: Substituição no Iraty. Machucado, Paulo Miranda deu lugar a Júnior. Fato curioso e patético: ao sair de campo, Paulo Miranda acabou substituído por Júnior. Contudo, em uma verdadeira várzea, Júnior entrou em campo sem assinar a súmula ou avisar o árbitro reserva. Acabou saindo do gramado e na volta foi amarelado. Este Campeonato Paranaense promete!!! Valha-nos Deus!!!
20 min: Alteração no Coritiba. Marlos saiu, com câimbras; Guilherme entrou, com fome. “Ei, Cirino, enfia a mortandela nos menino!”;
29 min: Seu Ataliba tirou cincão da carteira, comprou um pãozão com bife e - olhando fixamente para dentro dos olhos da Cris – emendou “Pão com bife nóis gosta, mas tem que bater bem o bife. Bater você bate, né?”. “Pára, Ataliba! Eu sou moça direita, mas este jogo tá ruim demais. Vamos embora que eu não sou de ferro!” – concedeu a moça como se dissesse “Hoje, a giripoca vai piar!”;
30 min: Seu Ataliba e a Cris saíram do Couto direto para o apê do precedentemente citado Turco.
Daí até o fim não aconteceu mais nada no Tremendão Arena: time verde 1 X 0 Iraty, vitória com as calças na mão, como diriam os antigos. Placar e futebol magrinhos, magrinhos.
Pois bem. Não aconteceu nada mais no Tremendão, todavia, no apê do seu Ataliba, a coisa “begou forte”, como diria o próprio seu Ataliba!
Eram 23h34 quando o Ataliba partiu pra cima da Cris e – pra encurtar a história – só largou a moça às 5h23 da manhã, já no dia 11 de janeiro de 2008. A Cris, esbodegada, desgrudou-se do turco e dormiu.
Às seis da manhã, pontualmente, tocou alto o despertador. Imediatamente, seu Ataliba ordenou “Sai do meu cama, vai faz meu café, traz torrada, bedação de queijo, zucrilhos e iogurte. Depois lava o louça, limpa o cozinha e vai correndo pro lojinha que tem montão de freguês esberando e nóis brecisa de dim-dim!”.
A Cris – horrorizada – quis argumentar “Mas, Atalibinha, e aquela história de meu amor, meu bem, vou te cobrir de ouro, te dar vida de princesa, como é que fica? Como é que eu fico, Atalibinha?”.
E o seu Ataliba, suave como coice de camelo, não teve dó “Como é que você fica eu não sei, mas eu vou ficar numa boa, deitadão aqui, legalzão, só fazendo o digestão do meu café, da minha torrada, do bedação de queijo, do zucrilhos e do iogurte que você vai me trazer, pois eu tô mandando! Esqueceu que eu sou o seu batrão? E depois lava o louça, limpa o cozinha e vai correndo pro lojinha que tem montão de freguês esberando e nóis brecisa de dim-dim!”.
E ainda mandou ver o golpe final “Ah, e tem outra, Cris, eu não sou coxa-branca borra nenhuma. Eu sou do Caveira. Eu sou Atleticano. Nóis não gosta do Cirino, nóis gosta mesmo é do Betraglia! E dito isso, seu Ataliba foi pro chuveiro cantando “Coxarada, filho do buta...” e, de vez em quando, ele gritava “Viva Betraglia, viva Betraglia, olê, olê, olá!”.
Resumo da História: Na última quinta, no Couto Pereira, muitos coxas-brancas foram iludidos, dentre eles, a ingênua Cris. Mas, também, tem gente que acredita em cada coisa, em cada lorota...
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