Rafael Lemos

Rafael Fonseca Lemos, 49 anos, é atleticano. Quando bebê, a primeira palavra que pronunciou foi Atlético, para desapontamento de sua mãe, que, talvez por isso, tenha virado coxa-branca. Advogado e amante da Língua Portuguesa, fez do Atlético sua lei e do atleticanismo sua cartilha. Foi colunista da Furacao.com de 2007 a 2009.

 

 

Copa na Baixada: será mesmo a melhor opção?

08/12/2007


Nos próximos dias, o Atlético definirá os nomes daqueles que conduzirão os destinos do Clube no próximo mandato. A escolha me parece óbvia: o comandante do Estado Maior Atleticano será o eterno Presidente Mário Celso Petraglia cuja biografia à frente do Rubro-Negro fala por si o que me dispensa de tecer maiores comentários. Petraglia Presidente e até aqui surpresa alguma.

O que surpreendeu a todos foi a forma com que Petraglia se posicionou diante do pleito. Quando se esperava que ele fosse inscrever sua chapa num gesto automático - e tantas vezes repetido nesses 12 anos da recente história do Atlético – Petraglia nos convocou a tomar parte – ombro a ombro – na difícil missão que é conduzir a vida de um Clube de elite como o nosso Atlético Paranaense. E em sua convocação, Petraglia foi mais uma vez genial: pôs-se como líder, todavia requisitou a atenção – e a ação – de todos nós, atleticanos. E fez bem, muito bem!

Senti-me convocado e cá estou, disposto a fazer do Atlético uma potência futebolística – pois os deuses da bola assim o querem, desde sempre - eis que nosso Furacão nasceu com a vocação da grandeza e predestinado às glórias. Senti-me convocado e cá estou, na minha humilde função de colunista, para discorrer sobre assuntos delicados, dos quais depende nossa sorte no presente, num futuro próximo e para as futuras gerações.

Antes de qualquer análise, peço serenidade, reflexão e espírito crítico ao leitor. Mais do que isso: peço que tudo seja considerado à luz dos fatos como eles são, e não dos fatos como eles deveriam ser. Feitas as preliminares de mérito, adentro ao cerne da questão, ou das questões, pois um time grande como o Atlético nunca tem diante de si um só foco ou um objetivo simples e singular.

Pois bem. Os homens que assumirão o Atlético a partir do início de 2008 terão à sua frente um caminho bifurcado e terão de optar por apenas um caminho, entendo eu. Diante da futura equipe de comandantes haverá duas possibilidades:

Dedicar-se à conclusão da Arena da Baixada com vistas ao Mundial de 2014, no Brasil, empregando para esse mister todos os recursos humanos e financeiros do Clube Atlético Paranaense – e, mais do que isso, aplicando, inclusive e principalmente, recursos tomados por empréstimo e que custarão caro demais ao Atlético, pois toda captação financeira é caríssima (no caso específico da conclusão da Arena da Baixada, a captação de recursos girará em torno de 55 milhões de reais);

Ou se dedicar a fazer futebol, com todas as forças e recursos – humanos e financeiros - aplicados, exclusivamente, para o futebol, tornando o Atlético competitivo no mercado da bola a ponto de poder repatriar jogadores que aqui fizeram a História e que hoje estão ao alcance de rivais bem menos estruturados como o Fluminense (que, especula-se, estaria trazendo Washington - o Coração Valente - e Jádson) e o Palmeiras que nos levou o Alex Mineiro.

Eis aqui apresentadas as duas estradas e eis que se apresenta o tempo de optar por uma dela já que ambas não poderão coexistir (e, repito, que tudo seja considerado à luz dos fatos como eles são, e não dos fatos como eles deveriam ser).

Analisemos a primeira hipótese. Se o Atlético optar pela conclusão da Arena da Baixada com vistas ao Mundial 2014, terá de sacrificar o futebol, montando e mantendo elencos do nível deste de 2007 ou até mesmo elencos mais fracos. Assim, enquanto as obras da Arena avançarem, o time lutará por posições intermediárias em todas as competições e nenhum grande vôo poderá ser alçado e a gente sabe que o povão não irá reagir com paciência a esse estado de coisas. Os resultados minguados dentro de campo farão com que a massa se rebele contra os dirigentes que por sua vez se defenderão causando um atrito e um distanciamento que já provamos no início do brasileirão de 2004 e que nos foi tão prejudicial.

Aí, alguém pode pensar “Mas haverá aporte de dinheiro público para a construção e reforma dos estádios da Copa 2014” e pensará bem, mas pensará pela metade. Os financiamentos públicos obedecerão a critérios políticos quando de sua distribuição, ou seja: quem tiver maior representatividade política (leia-se: SP-RJ-RS-MG-BA) ficará com a maior fatia do bolo, sobrando aos demais fatias menores ou farelos.

Dessa distribuição decorrerá o seguinte quadro: o Morumbi – palco bandeirante para a Copa (eu disse bandeirante, e não bambirante) – precisará, imaginemos, de 200 milhões de reais para as reformas e adequações exigidas pela FIFA. Por conta da força política do Estado de São Paulo, o Governo deverá liberar uns 150 milhões, trocando em miúdos, 75% da obra, o que garantirá ao SPFC, dono do estádio, onerar-se minimamente.

O Maracanã – palco fluminense para a Copa 2014 – precisará, imaginemos, dos mesmos 200 milhões de reais para reformas e adequações exigidas. É claro que, em face do peso político que o Rio tem, o Governo deverá liberar, também, uns 75% do valor orçado, ou até mais, por conta dos cariocas Havelange e Ricardo Teixeira, o que garantirá ao Rio onerar-se minimamente, vôo em céu de brigadeiro sobre o mar azul por onde deslizava o barquinho nos tempos da Bossa Nova.

Antes que a torcida do Flamengo – notadamente formada por engenheiros, advogados, poetas e intelectuais – revolte-se comigo; e para que a torcida lusitana do Vasco possa entender; eu disse fluminense, pois toda pessoa que nasce no Estado do Rio de Janeiro é fluminense, mesmo que torça pelo Voltaço, ou pelo Bangu, ou pelo América, dono de um hino que é quase um poema “Hei de torcer, torcer, torcer, hei de torcer até morrer, morrer, morrer, pois a torcida americana é toda assim, a começar por mim, a cor do pavilhão é a cor do nosso coração”.

E a mesma coisa acontecerá para os palcos que receberão os jogos no Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Bahia. Força política eles têm e, por isso, serão beneficiados (todos são iguais perante a Lei, mas uns são mais iguais do que os outros). E nesse cenário, aparecerá o Atlético, inserido num contexto politicamente mais frágil, eis que as causas paranistas – desde 1853 – nunca foram prioritárias aos olhos do grande comando Federal.

Assim, a Arena da Baixada, cujo valor orçado para conclusão está na casa dos 55 milhões de reais, deverá receber os farelos da verba pública, fazendo com que o Atlético tenha de se valer de recursos tomados em nome próprio junto a instituições de crédito privado, sejam elas nacionais ou internacionais. Trocando em miúdos, o Atlético estará – por conta da Copa 2014 – onerado até os ossos, enquanto os outros clubes terão aumentado o seu patrimônio com endividamento mínimo, valendo-se das benesses políticas oficiais.

E da mesma forma que a distribuição das verbas oficiais respeitará a critérios políticos (a maior parte ficará no eixão SP-RJ-RS-MG-BA), a distribuição dos jogos da Copa obedecerá a critérios políticos (os melhores jogos terão como palcos os estádios do eixão SP-RJ-RS-MG-BA, sobrando para nós seleções de menor porte, como: Japão, Trinidad e Tobago, Samoa, Vaticano e Mônaco). Antes que me acusem de xenófobo, afirmo que não tenho nada contra país algum – sou bisneto de portugueses, espanhóis e sírios e sempre defendi a idéia de que todo preconceito é burro!

Antes que me chamem de analfa, eu sei que o Vaticano não tem seleção - se bem que os padres sempre foram fãs do futebol – e eu sei que Mônaco também não tem seleção, se bem que a Stéphanie de Mônaco (Stéphanie Marie Elisabeth; nascida no dia 1º de fevereiro de 1965, no Palácio do Príncipe de Mônaco, uma baita de uma gostosa) sempre bateu um bolão!

E aqui vem a pergunta: valerá a pena o Atlético se dedicar – em detrimento do futebol, seu maior escopo – a concluir a Arena com vistas à Copa de 2014 para ser anfitrião de jogos de pouca importância? Valerá a pena lutar sozinho, consumir-se – sem apoio político e ainda lutando contra a autofagia local – para edificar um palco perfeito, com todas as exigências rigorosas da FIFA, para honrar o nome do país como sede da Copa 2014? Valerá a pena? Seis anos de sacrifícios, elencos modestos, escassez de conquistas, tudo para ser anfitrião de um Mundial que terá como grandes palcos os estádios do eixão?

Agora a segunda hipótese. Se o Atlético fizer opção – imediata e integral – pelo seu futebol, poderá entregar-se todo – de corpo e alma – às coisas da bola, investir pesado em contratações, competir com os rivais de outros Estados na aquisição de jogadores, repatriando – quem sabe - os grandes ídolos de nossa história recente, casos de Washington, Jádson e Fernandinho. Dono de um time forte e competitivo, não demorariam a aparecer no campo os resultados positivos do Atlético e, num círculo virtuoso, mais resultados positivos gerando maiores públicos e maiores públicos gerando sócios, gerando Receita e gerando força.

E, na esteira de tudo isso, a construção da segunda fase da Arena da Baixada podendo acontecer naturalmente, sem a preocupação dos prazos estipulados para o cronograma de obras e reformas do Mundial 2014 e, mais do que isso, a construção da segunda fase da Arena da Baixada com recursos próprios, sem o endividamento assustador junto a instituições financeiras privadas, nacionais e/ou internacionais. Atlético com crescimento auto-sustentado, sinônimo de grandeza, de verdadeira independência, prova maior de soberania e de autodeterminação.

Passamos a construir nosso patrimônio, efetivamente, quando já tínhamos 75 anos de História, em 1999. Concluir a Arena é fundamental, mas não sei se devemos concluí-la a toque de caixa, sob a sombra do endividamento e sob o desamparo oficial. Concluir a Arena é fundamental, mas penso que devemos concluí-la dentro de nossa realidade (e a realidade é como ela é, e não como gostaríamos que ela fosse).

Filio-me à segunda hipótese de pensamento, ao segundo caminho; mas, sobretudo, filio-me a todo atleticano que se dedique ao crescimento do Atlético e ao fortalecimento dessa paixão impossível de explicar e que faz com que homens tão diferentes – Petraglia, Fleury e esse humilde Rafael – estejam lutando, ombro a ombro, todo dia, por toda a vida, em nome do Clube Atlético Paranaense!

Hoje o Atlético precisa de todos nós, com idéias, com propostas e com ações. Eu - humildemente - estou aqui, presente; e você, amigo atleticano, o que pensa, o que faz, onde está? O Atlético, hoje, precisa de você; como você precisa do Atlético! Nosso futuro é agora!


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