Marcel Costa

Marcel Ferreira da Costa, 45 anos, é advogado por vocação e atleticano por convicção. Freqüenta estádios, não só em Curitiba, quase sempre acompanhado de seu pai, outro fanático rubro-negro. Foi colunista da Furacao.com entre 2005 e 2008.

 

 

Tragédia anunciada

26/11/2007


O futebol brasileiro está de luto. A tragédia ocorrida ontem na Fonte Nova é um assunto preocupante, pois revela as precárias condições dos estádios brasileiros, colocando em risco torcedores em todo o país. Recentemente o SINAENCO, Sindicato da Arquitetura e Engenharia realizou um "Estudo sobre o Estado de Manutenção e Condição dos Estádios Brasileiros". De acordo com informações do site do sindicato, “o levantamento apresenta o estado atual de 29 estádios de 18 cidades brasileiras, mostrando a condição de diversos itens, como gramado, segurança, acessibilidade, arquibancada, sanitário, vestiário e estacionamento, dentre outros. O trabalho, desenvolvido por uma comissão de arquitetos e engenheiros, busca servir de alerta às autoridades e à sociedade sobre a necessidade de manutenção e reforma desses importantes equipamentos.”

O resultado deste estudo foi algo que todos já sabiam, mas a maioria prefere fingir que está tudo bem nos arcaicos e obsoletos estádios brasileiros. Nem mesmo a nossa Kyocera Arena foi aprovada sem ressalvas, tendo problemas como os pontos cegos criados pelas torres, a perigosa divisão de vidro entre os setores, a existência de fossos que podem tornar-se focos de transmissão de dengue e a disposição do gramado que atrapalha os atletas em jogos vespertinos por causa do sol. Nada preocupante, fácil de ser resolvido pelo Atlético.

A Fonte Nova, palco da tragédia deste domingo foi considerado um dos cinco piores estádios brasileiros. Nenhuma novidade quanto a isto, já que o periódico esportivo Lance! tinha feito outro estudo recente e apontou a Fonte Nova como o segundo pior estádio do Brasil, na frente apenas do Aflitos do Náutico.

Na análise do SINAENCO o estado da Fonte Nova foi considerado lastimável, sem nenhum conforto e segurança para os usuários. Arquibancadas em ruína, falta de higiene, banheiros sem manutenção, piso podre nos vestiários, estruturas das arquibancadas com vigas e pilares comprometidos foram algumas das informações sobre as condições deste estádio. Independente disso, nada foi feito, jogos continuaram sendo realizados naquele local, com grande presença de público, superlotação e o resultado disso, infelizmente, foi o episódio de ontem. Quase dez pessoas perderam suas vidas por irresponsabilidade de dirigentes, governantes (o estádio é do governo do Estado da Bahia) e administradores do local.

Aqui em Curitiba, a situação do Couto Pereira, estádio do Coritiba é certamente melhor que o da Fonte Nova, mas também preocupa. No estudo do sindicato, foram apontadas infiltrações na arquibancada superior que podem provocar danos estruturais, além de armaduras expostas e corroídas nas vigas e lajes das arquibancadas. Sem contar os mictórios dos sanitários masculino com layout inadequado, a presença de apenas um lavatório para os usuários e forte odor, além do mesmo problema do sol encontrado na Baixada. As fotos do estádio no estudo do SINAENCO são assustadoras e um jogo com superlotação como o de sexta-feira retrasada pode terminar em tragédia, repetindo o ocorrido em Salvador. Isto não pode acontecer, os dirigentes do clube são responsáveis pela segurança dos torcedores no estádio e se não estiverem preocupados com sua própria torcida, merecem punição severa. Antes prevenir do que lamentar, como certamente farão os baianos depois da morte de inocentes em um jogo de futebol que deveria ser festivo, motivo de alegria para a torcida do Bahia.

Os responsáveis pela tragédia de ontem poderão, em tese, ser punidos criminalmente por homicídio doloso. Na justiça desportiva certamente o Bahia perderá dez mandos de campo, limite estabelecido pela lei e a Fonte Nova será interditada. Não conheço este estádio, mas a interdição deveria ser permanente, até que derrubem e façam um novo estádio no local. Pelos relatos da imprensa nacional e da Bahia, a Fonte Nova não tem a mínima condição de ser aberta para um jogo de futebol, mas mesmo assim as únicas reformas lá feitas eram pinturas externas. Coincidência ou não, pintura foi uma das únicas coisas que fizeram recentemente no Couto Pereira.

Torço para o Atlético, vou ao Couto Pereira raramente, somente em Atletibas, mas preocupo-me com as precárias condições do estádio do rival, já que antes da paixão futebolística zelo pelos amigos, parentes e qualquer torcedor, afinal a vida vale mais do que a ignorância de achar que um estádio é bom e seguro por ser do seu time do coração.


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