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Rafael Lemos
Rafael Fonseca Lemos, 49 anos, é atleticano. Quando bebê, a primeira palavra que pronunciou foi Atlético, para desapontamento de sua mãe, que, talvez por isso, tenha virado coxa-branca. Advogado e amante da Língua Portuguesa, fez do Atlético sua lei e do atleticanismo sua cartilha. Foi colunista da Furacao.com de 2007 a 2009.
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Faltam-me palavras
25/08/2007
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“Esse árbitro Luís Antônio Silva Santos é um tremendo de um filho da ... !” - com essa frase - nada literária, é verdade - eu pensei em começar a minha coluna. Mas, de repente, refleti melhor e percebi a injustiça que eu iria cometer. Poxa, as prostitutas merecem todo o meu respeito. As prostitutas são pessoas boas – pelo menos as que eu conheci – e muitas delas eu conheci no sentido bíblico da palavra conhecer. Certa vez, eu devia ter uns quinze anos, fui com meus amigos do Colégio Paranaense Marista a um estabelecimento que ficava no Edifício Asa e lá passamos uma tarde fantástica na companhia delas. Lembro-me bem: fui eu, o Harlen, o Renato e o Ferlim. Na manhã seguinte, tornamo-nos o centro das atenções no Colégio.
“Eles foram na zona, eles foram na zona!” – e a gente lá, fazendo pose. Bons tempos! A minha menina se chamava Regina, uma morena de pele clara, cabelos pretos, vinda de Salvador, Bahia. Regina, onde você estiver receba o meu beijo agradecido (aprendi naquela tarde com você coisas que me seriam muito mais úteis do que a baboseira das lições de “entalpia e entropia” que até hoje, felizmente, nem sei o que significam). Chamar o árbitro Luís Antônio Silva Santos de “tremendo filho da ... !” seria maltratar tantas meninas que transformaram piás em homens, que ensinaram-nos coisas que só a escola da vida pode mesmo ensinar (grandes besteiras o “Seno de A e Cosseno de B”. Regina, morena, que saudade de você!).
Precisando iniciar minha coluna de protesto, e não podendo usar a tal frase já citada, reformulei a introdução: “Esse árbitro Luís Antônio Silva Santos é um tremendo de um ladrão!” Mas, de repente, refleti melhor e percebi a injustiça que eu iria cometer. Poxa, há ladrões que merecem todo o meu respeito. Certa vez, eu devia ter uns doze anos, fiquei chocado ao saber que um homem, no interior de São Paulo, tinha sido preso por furtar uma galinha que seria o almoço de seus filhos. Não conseguia entender por que se prendia um homem faminto, enquanto tantos roubavam quantias vultosas e continuavam impunes.
Na minha indignação, peguei uma caneta, arranquei uma folha do caderno e escrevi uma carta de fôlego, endereçada ao Congresso Nacional. Isso foi em 1987, eu estava na sexta série, e o Brasil vivia o clima de mudança por conta da Assembléia Nacional Constituinte e por conta da recém-nascida Nova República. Respirava-se cidadania, encorajei-me e mandei a carta, e nunca obtive resposta.
O homem, cuja prisão me estarreceu, hoje, deve estar morto de fome! E aqueles que nem me deram resposta – afinal eu era só um garoto metido a escrever coisas e mudar o mundo - hoje, devem ainda estar vivendo da fome (fome de um povo miserável e sofrido a quem chamam “brasileiros”). Chamar o árbitro Luís Antônio Silva Santos de “tremendo ladrão!” seria maltratar tantos inocentes famintos que nasceram marginalizados e que o sistema podre instalado no País acabou por transformar em marginais. Ladrão não é quem rouba o pão, ladrão é quem rouba a esperança.
Por fim, resolvi começar a minha coluna assim: “Esse árbitro Luís Antônio Silva Santos é um porco, um veado e um burro!” - mas, outra vez, refleti melhor e percebi a injustiça que eu iria cometer contra os animaizinhos.
Os porcos são mais limpos que o citado apitador. Os veados (estou falando dos bichos) enxergam muito bem: marcariam falta, pois o lance que definiu a partida aconteceu fora da área, não restaram dúvidas, e os burros, por sua vez, ao redigirem uma súmula, escreveriam cerveja – com “cê” – jamais com “esse”, como fez o apitador carioca quando esteve na Arena da Baixada, em 2006.
Para quem não sabe “No dia 08/11/2006, na partida realizada na Kyocera Arena, o árbitro Luís Antônio Silva Santos expulsou o lateral-esquerdo Michel, não aplicou cartão para o adversário e ainda carregou a súmula por causa de um suposto "copo de serveja" (fonte: Furacao.com). O cara escreveu SERVEJA, mas não especificou se era CAIZER, ISCOL, ORIJINAL, RAINIQUEM ou ISQUINCARIOL (e nem disse se era PILSE ou MAUTADA). Mesmo assim, fomos punidos com a perda de um mando de jogo (“Após julgamento, o Atlético teve de realizar a última partida do Campeonato Brasileiro em Curitiba no Estádio Durival Britto e Silva” – Furacao.com).
Assim, não podendo dizer que o árbitro Luís Antônio Silva Santos é um filho da p..., um ladrão, um porco, um veado e um burro, digo, somente, que o árbitro Luís Antônio Silva Santos é um grande merda, mesmo sabendo que, ao afirmar isso, ofenderei muitos cocozinhos que levam uma vida bem mais digna nas profundezas do esgoto aqui de Curitiba.
Até para quem escreve com certa regularidade chega um dia em que faltam as palavras...
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