Rodrigo Abud

Rodrigo Abud, 45 anos, é jornalista. Já correu dos quero-queros na Baixada, justamente quando fez um lindo gol do meio de campo. Tarado por esportes, principalmente o bretão, é também alucinado por rádio esportiva.

 

 

Debutando

28/07/2007


A primeira vez é sempre inesquecível. O primeiro beijo, a primeira noite de amor, para as meninas o primeiro sutiã e para a criançada o primeiro jogo Pensando nisso tinha, no cargo registrado em carteira de tio, e de torcedor do Atlético o dever de levar a minha sobrinha, Isabella, no jogo do Furacão. Seria o seu primeiro contato direto "in campo" com a magia que é torcer pelo rubro-negro. Primeira vez que tenho certeza todo torcedor têm gravado na memória, por isso é algo que ela também irá lembrar para sempre.

O entorno para que isso pudesse acontecer não ajudava. No período da sua estadia aqui, ela mora em Foz do Iguaçu, o Atlético somente jogaria na Baixada, contra o Cruzeiro, no meio da semana, fato que por motivos profissionais me impossibilitaria de fazê-la viver a emoção de vibrar no jogo, com muito custo contornei esse obstáculo.

Na quarta -feira, dia da partida, me deparei com o segundo entrave. Comprar meia-entrada para ela, em razão da sua menoridade (11 anos). A visão que insistia em martelar no meu cerebelo, era a enorme fila para o cadastro do estudante. Para tentar evitar esse transtorno fui logo após o almoço, para comprar o ingresso. Como a campanha do time não é nada boa, não tive problemas para efetuar a compra, ela foi rápida e simples. Não enfrentei fila o que agilizou o processo.

Ingresso na mão restava somente esperar o horário do jogo. A impaciência tomava conta da sobrinha do Tio Digo, que é como ela me chama, mas não dá para adiantar o horário. Dupla preparada com as camisetas do time, agasalhada até o último fio do cabelo, o destino já estava definido: Baixada!

Primeira parada na sede da Torcida Organizada Os Fanáticos, para ascender ainda mais à paixão rubro-negra. Entre torcedores do Atlético, também se faziam presentes torcedores do Cruzeiro, que em um animado batuque cantavam músicas que celebram a união entre as duas torcidas.

O entusiasmo dela aumentou e era chegada a hora, o grande momento. Entrar no santuário rubro-negro, local que presenciou o desfile de Sicupira, Ziquita, Djalma Santos, Kelly, Alex Mineiro e outros tantos craques que por ali passaram.

Nos direcionamos para a entrada da Buenos Aires, pela escadaria do lado direito, portões fechados! Meia volta, sobrou o outro lado. Geral policial no escriba, ato copiado pela sobrinha, que foi poupada. Ingresso na catraca, luz verde liberando a entrada, e nesse momento o Clube ATLÉTICO Paranaense aumenta o seu já grande número de torcedores.

"Tio bate uma foto minha aqui" diz a nova torcedora atleticana. Preparar, apontar clique e o instante estava registrado, em frente ao símbolo do clube, em uma das propagandas de uma marca de automóvel.

"Quero pipoca", nesse momento fiz minha primeira restrição. "Tudo bem, escolha bem o que você quer, pois não estou com muito dinheiro". Pipoca e refrigerante na mão fomos para o local da onde assistiríamos a partida. Madre Maria Inferior era a nossa sala de estar para as próximas duas horas e meia.

Para mim público de boate, para minha sobrinha o medo de ficar sem lugar. Torcida chegando e as perguntas começaram. "Para que aquele vidro (que separa os setores)?". "Aquele pessoal que estava batucando, lá fora, vai assistir o jogo?". "O que é aquele lugar ali (o pombal)?".

Cada pergunta, por mais simples que fosse, no atual momento do Atlético era de resposta complexa, para uma menina de 11 anos. Sobrava-me a tática de desviar o assunto.

"Para que aquele vidro?", foi respondida com "Me dá um pouco de pipoca". "Aquele pessoal que estava batucando, lá fora, vai assistir o jogo?", foi respondida com "Alguns sim, outros não", quando veio a réplica "Porque?", aí tive que apelar para a revista distribuída na entrada.

E nesse embalo fomos até o a entrada do time em campo, novamente o entusiasmo tomava conta da atleticana Isabella. Começo de jogo e as perguntas da minha sobrinha mudavam para afirmações. "O outro time é ruim!". "Tá demorando para sair o gol do Atlético!".

Jogo que segue, Atlético jogando uma bolinha pequena, menor que de gude, mas a sorte encontrou a cabeça do zagueiro atleticano e bola na rede do time mineiro. Pronto, serviço completo. Foi no jogo, comeu pipoca e viu o Atlético abrir o marcador para, no pensamento dela, uma fácil vitória.

Bola aérea rolando novamente e empate do Cruzeiro. Então nesse momento, minha sobrinha desfere o primeiro palavrão do dia. "Merda!". Ela ouviria muitos outros no decorrer do jogo.

Mudança de lado e partida reiniciada, com o Atlético tomando um chulé de bola. Se perguntassem para os jogadores rubro-negros, qual a cor da bola, muitos não saberiam dizer. Porém a sorte estava do nosso lado e depois de assistir o time azul jogar, o Furacão marcou o segundo gol e a recém atleticana Isabella não se conteve, queria ver o jogo mais de perto, colou na corda, próximo a grade.

Sufoco e no fim do jogo, gol de empate do time mineiro. Ânimos da torcida exaltados (com razão) e mais um dicionário de palavrões, digo a ela que temos que ir. Volta sofrida. De ônibus, no frio e com um empate no seu debut, mas fiz a ela a última pergunta sobre o que ela acabara de vivenciar.

"Então, gostou?". "Gostei, pena que não ganhou. Quando eu voltar para Curitiba, você me leva de novo no jogo?". "Claro!", finalizei.

Não sei se ela saiu com as perguntas sem resposta, mesmo que sem sentido, mas eu saí. Fiquei me perguntando qual seria o impacto de na sua estréia, em um jogo do Atlético, a minha sobrinha encontra-se o estádio cheio, com um time bom e com a torcida jogando junto.

Até quando terei que aguardar a resposta?


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