Rafael Lemos

Rafael Fonseca Lemos, 49 anos, é atleticano. Quando bebê, a primeira palavra que pronunciou foi Atlético, para desapontamento de sua mãe, que, talvez por isso, tenha virado coxa-branca. Advogado e amante da Língua Portuguesa, fez do Atlético sua lei e do atleticanismo sua cartilha. Foi colunista da Furacao.com de 2007 a 2009.

 

 

O complexo do Onaireves

08/04/2007


Reza a lenda que o menino nasceu em Santa Catarina, no ano de 1946. Em homenagem a seu pai - que se chamava Severiano - resolveram chamá-lo de Onaireves que é Severiano de trás para frente.

Com justo motivo, o menino foi crescendo invocado e vendo o mundo sempre de trás pra diante, sempre ao contrário. Foi na escola que surgiu a primeira encrenca - encrenca, aliás, que marcaria a vida do nosso Onaireves, como veremos.

O fato se deu no recreio. A piazada foi até o campinho, que ficava nos fundos do estabelecimento, para bater lá uma bolinha. A criançada lá, agrupada num bolo, de onde saíram dois capitães a escolher este ou aquele menino. Aos poucos, os times iam se formando.

Escolhas daqui e dali, todo mundo escalado pra jogar, e eis que o menino Onaireves acabou preterido. Invocado, foi ter com os capitães acerca de sua não escalação. Um dos meninos não disse nada, mas o outro abriu o jogo:

- Onaireves? Onde já se viu um nome desses? No meu time você não joga! - e disse isso já com a mão espalmada no peito do Onaireves, num claro gesto de rejeição.

O Onaireves, vermelho de raiva, resolveu que jogaria por bem ou por mal. Como não conseguiu jogar por bem, partiu pra pancada ali mesmo e levou a pior, pois a molecada caiu matando em cima do menino revoltado.

Após três minutos de pancadaria, nos quais Onaireves foi o cover do Judas de Sábado de Aleluia, ele encarou a piazada e sentenciou:

- Eu não preciso jogar nessa porcaria de campinho! Eu vou construir um estádio só pra mim, lá eu vou mandar e quero ver se algum de vocês vai me impedir de jogar bola. Quero ver, quero ver!

E sob as vaias dos meninos, Onaireves se retirou do campinho pisando duro, como se marchasse resoluto atrás da realização dessa sua promessa.

O tempo foi passando e o menino Onaireves só pensava em sua vingança. Emagreceu, não queria estudar e a coisa ficou tão feia que sua mãe resolveu levá-lo ao Psicólogo. Lá, depois de alguns exames e perguntas, o doutor deixou bem claro:

- O menino Onaireves tem um complexo. Um complexo esportivo. A Psicologia chama esse quadro de Complexo Esportivo Pinheirão!

- E é grave, doutor? - quis saber a dedicada mãe do menino.

- Olha, grave não é, mas esse Complexo Esportivo Pinheirão precisa ser trabalhado, senão o menino pode ficar louco, louco de pedra!

Ocorre que, muito tempo se passou, e o menino virou adulto, pelo menos aparentemente, mas - para sua infelicidade - o Complexo Esportivo Pinheirão não foi trabalhado como deveria e se transformou numa coisa tão esquisita que até a Psiquiatria, hoje, não sabe como lidar com ele.

O Complexo Esportivo Pinheirão virou um verdadeiro transtorno obsessivo e o Onaireves, ainda sob os efeitos do estresse traumático da infância, continua a repetir:

- Eu vou construir um estádio só pra mim, lá eu vou mandar e quero ver se algum de vocês vai me impedir de jogar bola. Quero ver, quero ver! Vai ter até Copa do Mundo! Vocês vão ver, vão ver...

E é por isso que hoje o Onaireves, Presidente da Federação Paranaense de Futebol, em vez de dedicar-se de corpo e alma em prol da candidatura do Estado do Paraná como uma das sedes da Copa de 2014, com jogos a serem realizados na Arena da Baixada, palco perfeito para o Mundial, continua a defender a idéia absurda de fazer do seu Complexo praça esportiva para a Copa do Mundo do Brasil.

Onaireves, quando é que você vai crescer, guri? Quando é que você vai se curar desse Complexo Esportivo Pinheirão que lhe é obsessivo há tanto tempo? Onaireves, quando você vai parar de ver o mundo sempre de trás pra diante, sempre ao contrário?

Copa do Mundo não se joga em campinho e você sabe muito bem que não se constrói um estádio -que atenda às normas rígidas da FIFA - em seis, sete anos. É hora de você deixar a birra de lado e concentrar esforços em prol da conclusão da Arena da Baixada, único estádio paranaense com potencial efetivo de ser concluído a tempo de ser sede do Mundial do Brasil, em 2014.

Esqueça o passado, Onaireves! Os meninos da sua infância cresceram, os fantasmas não existem mais, você pode entrar no time, desde que seja para jogar junto. É seu dever apoiar a conclusão da Arena e lutar pela sua inclusão como um dos estádios a receber jogos do Mundial 2014. Você, como ilustre catarinense, deve isso ao Estado que o acolheu!


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