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José Henrique de Faria
José Henrique de Faria, 74 anos, é economista, com Doutorado em Administração e Pós-Doutorado em Labor Relations nos EUA. Compareceu ao primeiro jogo do Clube Atlético Paranaense em 1950, no colo de seu pai. Seu orgulho é pertencer a uma família de atleticanos e ter mantido a tradição. Foi colunista da Furacao.com entre 2007 e 2009.
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Um planetário de equívocos
13/03/2007
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Foi, sem dúvida, uma semana de muitas diferenças. Na quarta-feira o Atlético Paranaense, com seu time considerado não titular, venceu o Cianorte por 3 x 0, apresentando um futebol de bom nível e garantiu a classificação à próxima fase do Estadual. Em seguida, quando parecia que teríamos uma festa, assistimos uma demonstração de deselegância, desrespeito e agressão que lamentavelmente lembra grupos de estilo neonazista, contra jogadores de um Clube de Futebol de um país que estava sendo “julgado” pelos atos de seu governo. Os jogadores de um clube que veio em busca de parceria foram obrigados a ouvir o hino de seu país ser vaiado e o nome de um conhecido terrorista e de um ditador ser saudado.
Fico imaginando o que sentiríamos nós e o que sentimos nós quando somos julgados por atos de nossos governantes, de representantes políticos, de empresas, de empresários e proprietários de terra que promovem desmatamentos, matam freiras e pacifistas. Como nos sentimos quando pensam que aqui somos traficantes, assassinos de crianças, que nos envolvemos diariamente em tiroteios em avenidas movimentadas, que somos todos corruptos. Ainda bem que prevaleceu o bom senso e foram pedidas desculpas públicas pela torcida, sem muita ênfase e convicção, é certo, mas houve pedido de desculpas e isto já é um bom sinal. Não há como deixar de dizer que o que ocorreu na quarta-feira, dia 07 de março, é o tipo de exemplo que a nossa torcida não precisa dar, é o tipo de comportamento que não se recomenda ter. Existem formas inteligentes e eficazes de fazer transformações e todas passam muito longe daquela de quarta-feira.
O jogo comemorativo, vencido por 3 x 1, ficou um tanto sem graça. Não pelo fato de uma parte da torcida ter se retirado, nem tampouco por ter havido, durante um tempo, uma atenção maior às desavenças do que ao jogo propriamente dito, mas pela explicitação de uma divisão que interessa aos adversários, não ao Atlético. A torcida cometeu um equívoco que não pode cometer: unidos, os atleticanos constituem uma força, mas se nos deixarmos levar pela discórdia, cairemos nas mãos dos adversários. Se havia e se há insatisfação acumulada, não é no estádio, durante o jogo, que se resolve. Uma torcida, nacionalmente conhecida pelo papel que desempenha de ser o 13º. jogador desde antes do jogo começar até após o jogo acabar, não pode cair nesta armadilha.
Domingo, foi um verdadeiro alívio. Como é bom ver um jogo em que o Atlético joga bem, com desenvoltura, competência, vibração. Mesmo depois que a goleada já estava anunciada, a equipe continuou jogando com seriedade como se o jogo estivesse ainda em um 0 x 0. O Vadão estará descortinando um novo quadrado mágico? Que diferença faz em uma equipe um Alex Mineiro! Um jogador completo, segundo Vadão: faz gols, cobra pênaltis, desloca-se com rapidez, arma jogada, faz lançamentos, marca e, acreditem, cobra lateral. Com ele, Denis Marques voltou a ser o que era, Ferreira tem com quem jogar, Evandro se encaixa no quadrado, Alan Bahia se solta. Se ainda há deficiências no sistema de marcação, como de fato há, parece que as coisas caminham para uma melhora. Mas, a lateral esquerda continua sendo um sofrimento.
Domingo, uma diminuta torcida animava o jogo. Lá onde deveria haver mais torcedores. Tem-se a impressão de que ainda há mágoas. Em minha modesta análise, o Atlético Paranaense não é um clube de uma só pessoa, por melhor que ela seja. Somos o resultado de uma longa história de muitas pessoas. Somos torcedores, profissionais, jogadores, funcionários e dirigentes. Ninguém duvida da importância de alguns dirigentes, de sua iniciativa, da diferença que fizeram e fazem para que o Atlético seja o que é. Mas, o sucesso não é de uma só pessoa e não pode ser, porque tudo que diz respeito a uma organização é necessariamente coletivo. Sei que muitos dirigentes têm consciência disto.
Porém, é justamente aqui que parece haver um planetário de equívocos. Cada um precisa reconhecer o papel do outro no seu sucesso, para que não seja, depois, acusado de ser o único responsável pelo fracasso. Todos nós temos que merecer reconhecimento da parte que fazemos no sucesso, para não amargarmos uma responsabilização em um eventual fracasso. Diretoria, Comissão Técnica, Jogadores, Funcionários, Sócios, Torcedores e Torcida, todos têm sua parcela de contribuição. Cada um oferecendo o que pode, o que tem. Se um pode torcer, disputar e ganhar títulos que sequer imaginava, deve creditar ao outro sua importância. Este, por sua vez, só pôde conduzir uma equipe às conquistas, porque aqueles o apoiaram em momentos, inclusive, delicados e difíceis. Esta é a unidade necessária e vitoriosa.
O legendário Esopo, personagem do Século VI a.C., citado por Heródoto em sua História, é bastante conhecido por suas fábulas. Uma delas ilustra bem o que se argumenta aqui. É a fábula “Os viajantes e o machado”.
Dois viajantes iam pela mesma estrada. Como um deles encontrou um machado, o outro disse:
- Fizemos um achado.
- Não diga “fizemos”, diga “fizeste” um achado – corrigiu o primeiro (o que havia encontrado o machado).
Pouco depois, apareceram os que tinham perdido o machado. O que o carregava, ao se ver perseguido, disse ao amigo:
- Estamos perdidos.
- Não diga “estamos”, mas “estou” perdido – replicou o outro –, pois quando encontraste o machado, não me incluíste.
Se nossos amigos não partilham de nosso sucesso, nos abandonarão quando cairmos em desgraça.
O Atlético Paranaense trilha o caminho do sucesso, mas a cada fraquejada real ou imaginária volta à tona o mesmo problema. Nós sabemos que é comum a prática de se encontrarem culpados antes de olhar os próprios erros. É mais fácil achar alguém ou um grupo em quem colocar a culpa. Mas, o que acontece? Esgotaram-se os diálogos? As parcerias internas? O comprometimento com a instituição maior? Não creio. Mas, há algo que não está bem harmonizado. Em um mesmo momento se tem alegria e apupos e isto pode se tornar uma forma de paralisia e de desmobilização, o que não é bom para ninguém. Como diz Esopo, “querer ao mesmo tempo fazer uma coisa e o seu contrário é a melhor maneira de não conseguir fazer coisa nenhuma”.
Vamos continuar com nossas divergências, nossas convicções, pois é saudável que existam posições diferentes, que existam debates de idéias. O consenso é o caminho mais curto e rápido para o autoritarismo. Mas, a existência de divergências não significa que não possamos ter grandes objetivos iguais. Este grande objetivo é o Atlético Paranaense, suas conquistas, seu sucesso, seus títulos nacionais e internacionais, seu exemplo como organização administrativa e esportiva, sua concepção moderna e as alegrias que somente nós, atleticanos, sabemos como são.
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