1970 - Final feliz para o Rubro Negro

O início dos anos 70 foi muito difícil para o futebol paranaense. Em dificuldades financeiras, praticamente todos os clubes tiveram de cortar gastos. No Atlético, a situação estava bem difícil. A equipe retornava ao panorama de crises que, desde então, caracterizavam o clube, com dívidas que ultrapassavam 800 mil cruzeiros novos. Naquela época, a imprensa culpava a ineficiência administrativa, que teve início após a euforia de 1968 e foi se apagando aos poucos.

Foram doze anos de angústia, com direito à última colocação em 1967. No dia 1º de fevereiro de 1970 dava-se início o Campeonato Paranaense, que era realizado em quatro turnos. Dois de classificação, com a participação de quatro clubes e dois para a decisão do título, com os três primeiros classificados de cada chave. Também havia a queda de classificação do último classificado de cada zona. Violência, suborno e doping foram os costumeiros ingredientes da competição.

E a má notícia para os torcedores do futebol paranaense foi o aumento do preço dos ingressos, na época, passou para 4 cruzeiros novos. Segundo o jornal O Estado do Paraná, “ muitas das modificações não passaram de um golpe baixo dos cartolas, como a majoração do preço dos ingressos, a cobrança de ingresso à torcida feminina e a concessão de autonomia ao Departamento de Árbitros que causou prejuízos irremediáveis ao futebol do Paraná ”.

O grande favorito da competição era o Coritiba. Na primeira rodada, o Atlético já começou mal, perdendo para o União, por 2 a 0. Foi a Londrina e perdeu para o time da casa. Contra o Paranaguá, idem. “ O Atlético carrega uma lanterna só de crises ”, dizia os jornais da época. E não era pra menos. A crise financeira era estrondosa e o time persistia nos resultados inexpressivos, sem bons atacantes e com uma defesa falha. Assim, muitos torcedores atleticanos começaram a temer a mesma trajetória de 1967, quando o clube entrou na maior crise em seus quase 50 anos de existência, terminando o Campeonato Paranaense em último lugar. A sobrevivência do clube era importante não apenas para a sua torcida, mas também para o próprio futebol paranaense. Conscientes de que o clube não poderia morrer, os atleticanos foram à luta. Foram instalados três pequenas bancas em locais de grande circulação do público, para que o torcedor depositasse qualquer quantia, por menor que fosse. Os postos foram instalados na Avenida Luiz Xavier, bem no coração da “Boca”, no “Senadinho” e na Praça Tiradentes. Tal medida exteriorizava o desespero do clube, mas perfeitamente compatível com a situação.

Porém, toda a imprensa paranaense enaltecia a única torcida que ia em massa ao campo: a do Atlético. E afirmavam que, se com toda aquela crise que se instalou no rubro negro, a equipe não conseguisse chegar à fase de classificação, o campeonato perderia muito de sua motivação financeira, opinião que também era compartilhada pelo então presidente da Federação Paranaense de Futebol , José Milani. “O campeonato sem o Atlético é o mesmo que carnaval na quarta-feira de cinzas ”, diziam os jornais da época. Aos poucos, o Atlético foi se acertando no campeonato. Conseguiu arrumar 11 jogadores, contratou o zagueiro Wilmar e acertou a situação do ponta-esquerda Nilson. Além do mais, o rubro negro tinha no elenco um maiores goleadores da história do futebol paranaense: Sicupira.

Em 1970, o Atlético voltou a dar alegrias ao povão Rubro-negro

Na segunda rodada da competição, o Atlético conseguiu a primeira vitória, diante do Cianorte, por 6 a 2. A quinta partida foi o sempre tumultuado Atletiba. De um lado, o favoritismo total do Coritiba, que estava muito bem no campeonato. De outro, o Atlético, que conservava muito dos velhos tempos de amadorismo, onde só a cor das camisas e o incentivo da torcida fazem os jogadores virarem feras, como se estivessem disputando um campeonato em cada clássico. O presidente Rubens Passerino Moura determinou que a partida fosse realizada no Estádio Joaquim Américo, gerando ira da imprensa esportiva. O motivo da indignação era o fato da Baixada apresentar pouco espaço nas acomodações oferecidas a grandes públicos. Porém, na opinião do presidente, o que estava em jogo era o campeonato, e não o conforto dos repórteres de rádio e televisão.

E ninguém tirou da cabeça de Passerino que o clássico deveria ser realizado no “Caldeirão do Diabo”. Não só acabou sendo lá como o rubro-negro acabou levando a melhor, ganhando o primeiro Atletiba em quatro anos, em partidas válidas pelo campeonato, o que deu mais ânimo para a equipe continuar na competição. Estádio lotado e linda festa da nação rubro-negra, o placar ficou no 1 a 0, com gol de Zé Leite, o suficiente para calar os que não entendiam as verdadeiras razões do presidente.

O time melhorou visivelmente de produção, mesmo terminando em último colocado do 1º turno. Fez parte do grupo de classificação, contendo o rival Coritiba (que caminhava em busca do tri campeonato), o Grêmio Oeste, União, Maringá e o Seleto, que disputariam, a partir do dia 2 de agosto, em 60 jogos, o título de Campeão Paranaense. No segundo turno, das doze partidas realizadas, o Atlético perdeu somente a última, para o Maringá. No final do mês, o que muitos não esperavam: Atlético líder isolado da competição, após vencer por 1 a 0 o União, com gol de Sicupira, sendo um dos acontecimentos mais festejados no cenário esportivo local, principalmente pela vibrante torcida atleticana.

Euforia à parte, veio outro Atletiba. E desta vez, não deu para o Atlético, que acabou sendo derrotado em casa para o rival Coritiba, por 1 a 0, perdendo também a liderança da competição, cuja diferença era de apenas um ponto. Mas o time alviverde não teve tempo de comemorar a liderança. O Atlético reconquistou a primeira posição ao ganhar do Grêmio Oeste, por 2 a 0.

O jogo da consagração

Após tantos altos e baixos, no dia 13 de setembro Atlético e Seleto realizavam a última partida do Campeonato Paranaense, em Paranaguá. A equipe jogou tudo o que sabia e deu certo. O Estádio Orlando Mattos foi invadido quatro minutos antes do término da partida, pela nação atleticana que agora podia gritar sem medo: “É Campeão! É Campeão!” .

Antes de o jogo começar, por volta das 14 horas, o estádio já estava lotado pela nação atleticana. Esta, composta na sua maioria por jovens, extravasava uma alegria incomum, ensaiando para a festa final. Para o Atlético, só a vitória lhe daria o título. Porém, foi o Seleto que começou atacando, logo aos dois minutos, com Macaé. O jogador recebeu a bola na entrada da área e chutou forte, passando à esquerda do gol de Vanderlei. A resposta do Atlético veio aos quatro minutos com o jogador Toninho, que aproveitou um rebote e chutou para o goleiro Expedito fazer boa defesa. Foi o suficiente para despertar a nação atleticana, que estava silenciosa até então. Enquanto isso, o Seleto demonstrava-se melhor no meio-campo, com Macaé e Lori ganhando as ações de Reinando e Toninho, que tinham suas tarefas dificultadas pela intervenção no setor de Juquinha.

O bloco defensivo do Atlético começou instável. Zico e Alfredo permitiam o avanço de Luis Antônio, que despontava com grande atuação. Com o decorrer dos minutos, o miolo da área rubro-negra melhorou, tranqüilizando o restante do time. Finalmente aos seis minutos o torcedor do Atlético experimentou a primeira grande emoção no campo do Orlando Mattos. Nelsinho fez tabela com Sicupira e a defesa seletense falhou, permitindo a Liminha um toque rápido para Nilson, que estava em excelente posicionamento. Era a euforia para a nação atleticana, que começava a ver a equipe desenhar o sucesso final do Atlético.

Mas o Seleto não se impressionou muito com o placar aberto pelo rubro-negro. Continuou forçando a linha da zaga adversária e aos 10 minutos, Reinaldo derrubou Juquinha na entrada da área. Luis Antônio fez a cobrança da falta perigosa, mas não teve sucesso. Em seguida, o Atlético começou a mostrar ainda mais autoridade em campo. Nilson auxiliava o meio-campo, Sicupira pegava as sobras e lançava de primeira para Nelsinho, que mostrava sua extrema velocidade. Aos 13 minutos do segundo tempo, Nelsinho recebeu um lançamento forte, matou no peito e buscou a área seletense. O goleiro Expedito saiu da meta e levou o segundo gol, fazendo a torcida atleticana vibrar. O Seleto tentou correr atrás do prejuízo. Juquinha chutou forte com o pé esquerdo na entrada da área, fazendo com que o goleiro Vanderlei realizasse uma grande defesa. E não demorou para a equipe diminuir. O zagueiro Zico devolveu mal um lançamento vindo da direita e Juquinha aproveitou, aos 24 minutos, chutando a bola no ângulo direito do goleiro atleticano, que nada pôde fazer.

Mas o gol seletense não intimidou os comandados do técnico Alfredo Ramos, que pedia a todo momento muita calma, principalmente para o jogador Reinaldo, que estava errando muitos lançamentos. A partida atingiu os 30 minutos e era notado um equilíbrio entre as equipes na partida, que revezavam-se nas jogadas de área. Zico despontava com grande segurança ao lado de Alfredo, com a zaga rubro-negra completada pela presença de Djalma Santos e Julio, nas laterais. Mesmo com vantagem o Atlético não mostrava superioridade, com seu ataque contido pela zaga seletense. E aos 35 minutos que aconteceu o terceiro sucesso do rubro-negro da Baixada. Nilson cobrou uma falta pelo lado esquerdo do campo e a bola passou por todos da zaga do Seleto, inclusive por Nelsinho e Sicupira. Liminha, trabalhando em silêncio, pegou a sobra e chutou rasteiro, para os fundos da rede do goleiro Expedito.

Para a segunda etapa, os times voltaram iguais e o Seleto mostrou nas primeiras movimentações que não iria desanimar tão cedo, mesmo com o placar desfavorável. Aos 2 minutos, Lori recebeu um rebote na entrada da área e com um chute longo, quase anotou o segundo gol para o Seleto. Já o Atlético respondeu com Sicupira, que proporcionou um lance de perigo para Expedito. O artilheiro rubro-negro viu Liminha em alta velocidade e fez um lançamento longo, que na hora de finalizar, acabou sendo cortado por Pardal. Passados cinco minutos de jogo, a experiência de Zico se fez valer. O zagueiro simulou uma contusão a fim de esfriar o ânimo dos comandados pelo técnico Hélio Alves. Além disso, Sicupira aterrorizava com seus lançamentos em profundidade buscando a velocidade de Nelsinho pelo comando, e Liminha pela direita.

Aos 13 minutos, Pardal cobrou uma infração da intermediária do Atlético e a bola foi ao encontro do peito de Vanderlei. Luis Antônio subiu para tentar de cabeça, mas chegou tarde demais, atingindo o goleiro atleticano. Em seguida, o técnico do Seleto substituiu Moacir por Bonin, que pouco produziu. Aproveitando o bom momento, o Atlético quase marcou o quarto gol. Sicupira ganhou uma bola na intermediária, evoluiu na saída do goleiro seletense e acabou na marcação de Dinei. Sentindo que Nelsinho estava cansado, o técnico Alfredo Ramos resolveu substituí-lo por Zezé, que entrou com muita vontade, mas não foi feliz logo após seus primeiros toques na bola, sentindo uma contusão no joelho esquerdo. Enquanto isso, a torcida aguardava com entusiasmo os minutos finais da partida para então explodir.

Nos minutos finais, a torcida já não agüentava mais a espera e começou a cantar: “ Está chegando a hora...” Dentro de campo, os jogadores eram tomados por uma expectativa fora do comum, à espera do apito final. Aos 41 minutos, Toninho foi o autor do gol mais vibrante da partida. Após tabelar com Sicupira, Zezé lançou Toninho, que entrou na pequena párea e chutou forte para vencer o goleiro Expedito mais uma vez. E foi nessa hora, que a torcida invadiu o gramado para abraçar os jogadores, que foi provocada a queda de uma arquibancada improvisada, ferindo algumas pessoas, mas sem gravidade. Após o trabalho da Polícia Militar na retirada do público, o árbitro Eraldo Palmerine finalmente levantou os braços e encerrou um grande espetáculo. A torcida, ordenadamente, sem estragar o patrimônio alheio, tomou conta do campo e foi festejar mais uma conquista para a história do Atlético. Curiosamente, o placar, de 4 a 1, foi o mesmo da conquista do Tri Campeonato do Brasil, na Copa do Mundo de 1970, ao enfrentar a Itália no México.

Muitos não sabem, mas a conquista do Atlético chegou a ser ameaçada pelo rival Coritiba, que havia apresentado um recurso no Tribunal de Justiça Desportiva, alegando que o rubro-negro tinha colocado em campo o jogador Nilson, sem condições (ele teria sido expulso na partida anterior, que teve o Atlético como vencedor, em cima do União Bandeirante). Nem a chuva atrapalhou a festa atleticana, na volta a Curitiba. Do alto da serra, a festa era ouvida de longe pelo toque estridente das buzinas enfatizavam a comemoração de uma multidão que parecia não ter mais fim. Em Curitiba, uma enorme festa aconteceu nas principais avenidas da cidade, nas ruas, bares e carros, mesmo com a chuva forte que caía naquele dia. E então os jornais puderam noticiar a grande conquista do rubro negro, após tantas crises e desencontros: “Era o Furacão, que voltava mais vibrante do que nunca, após vencer o Seleto e liquidar o Coritiba”.

Final - Paranaense - (13/09/1970) - Seleto 1 x 4 Atlético
L:
Orlando Mattos; A: Eraldo Palmerini; R: 35.929,00 ; G: Nilson, aos 6 do 1°; Nelsinho, aos 13, Juquinha, aos 24, Liminha, aos 35, e Toninho, aos 41 do 2°.

SELETO: Expedito; Calé, Diney, Vivi e Pardal; Macaé e Lori (Fábio); Josemar, Juquinha, Luis Antônio e Moacir (Bonin). T: Hélio Alves.

ATLÉTICO: Vanderlei; Djalma Santos, Zico, Alfredo e Júlio; Reinaldo e Toninho; Liminha (Gildo), Sicupira, Nelsinho (Zezé) e Nilson Borges. T: Alfredo Ramos.

A Campanha

36 jogos: 18 vitórias / 8 derrotas / 10 empates / 61 GP / 37 GC

1º turno
Atlético 0 x 2 União Bandeirante
Londrina 2 x 1 Atlético
Seleto 2 x 1 Atlético
Atlético 6 x 2 Cianorte
Atlético 1 x 0 Coritiba
Grêmio Oeste 0 x 0 Atlético
Água Verde 3 x 3 Atlético
Atlético 6 x 0 Jandaia
Apucarana 1 x 2 Atlético
Atlético 0 x 0 Operário
Ferroviário 2 x 0 Atlético
Paranavaí 1 x 0 Atlético
Atlético 1 x 4 Grêmio Maringá

2° turno
União Bandeirante 1 x 1 Atlético
Atlético 2 x 1 Londrina
Atlético 1 x 0 Seleto
Cianorte 1 x 4 Atlético
Coriitba 2 x 2 Atlético
Atlético 1 x 1 Grêmio Oeste
Atlético 3 x 1 Água Verde
Jandaia 1 x 2 Atlético
Atlético 3 x 0 Apucarana
Atlético 1 x 1 Ferroviário
Operário 1 x 3 Atlético
Atlético 3 x 1 Paranavaí
Grêmio Maringá 3 x 1 Atlético

Fase decisiva

1º turno
Grêmio Oeste 0 x 0 Atlético
Atlético 1 x 0 Grêmio Maringá
União Bandeirante 0 x 1 Atlético
Atlético 0 x 1 Coritiba
Atlético 2 x 0 Seleto

2º turno
Atlético 2 x 0 Grêmio Oeste
Grêmio Maringá 1 x 1 Atlético
Coritiba 0 x 0 Atlético
Atlético 2 x 1 União Bandeirante
Seleto 1 x 4 Atlético

Personagens

Presidente Passerino Moura: com sua determinação, ele foi o grande responsável pelo título de 70. Depois de muitas crises, o Atlético finalmente pôde comemorar um título, após 12 anos de angústia. Atleticano histórico, Passerino não se preocupou com as críticas e colocou urnas nas principais avenidas da cidade para que o torcedor depositasse qualquer quantia, por menor que fosse. Dificuldades contornadas, Passerino prometeu o que cumpriu e fez com que a torcida finalmente pudesse comemorar a conquista mais que emocionante, que enalteceram a certeza de que a camisa rubro-negra só se veste com amor. Fez amigos e inimigos, gritou, protestou. Foi eleito o presidente do ano, através do seu trabalho com paixão e honestidade. Um homem de fibra e com um amor incomum às causas atleticanas,

Sicupira: artilheiro do campeonato, o atacante vestiu a camisa do Atlético por sete anos. Sendo o maior artilheiro do Atlético com 131 gols, o atacante era famoso por suas bicicletas, voleios, sem-pulos, passes de calcanhar e peixinhos, tamanha sua habilidade.